AVIAÇÃO NAVAL BRASILEIRA |
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O Decreto 55.627
Tramandaí - um triste episódio No início de dezembro de 1964, dois helicópteros do esquadrão HU-1 estavam operando no estado do Rio Grande do Sul. A partir da pequena localidade de Tapes, o Widgeon N-7001 prestava apoio ao NHi Argus em missão de levantamento hidrográfico da Lagoa dos Patos. Um pouco mais ao sul, utilizando as antigas instalações da Aviação Naval na Ilha do Terrapleno de Leste, o S-55 N-7009 executava missões de apoio ao Exército Brasileiro ("Operação Pintassilgo") patrulhando a fronteira com o Uruguai entre as cidades de Rio Grande e Jacaré (1). Na época suspeitava-se da entrada de armamento contrabandeado pela fronteira, possivelmente acobertada pelo então governador Leonel Brizola (2). No dia 4 de dezembro as duas aeronaves foram solicitadas para prestar apoio à regata Rio-Santos na Semana da Marinha, que se iniciaria no dia 9. Por estarem em localidades distintas, os helicópteros iniciaram a viagem de retorno de forma independente até a cidade de Santos, onde deveriam pernoitar. Naquela época os vôos entre o Sul do Brasil e o Rio de Janeiro eram realizados ao longo da costa tendo como escalas de reabastecimento as localidades de Tramandaí, Florianópolis, Paranaguá e Santos. Tramandaí, a primeira delas, era uma antiga estação de rádio da companhia Cruzeiro do Sul e, através de um convênio firmado em meados de 1963 com a Marinha, representava um importante ponto de reabastecimento. Na manhã do dia 5, o N-7009 pousou em Tramandaí que, estranhamente, estava tomado por tropas da FAB. Um oficial daquela Força dirigiu-se ao comandante da aeronave, que também era o comandante do esquadrão HU-1, e informou-o de que a aeronave estaria apreendia. Após uma conversa entre os dois, o vôo foi liberado e seguiu para Florianópolis após o reabastecimento (2). Pouco depois, por volta das 9:30h, o N-7001 pousou na localidade também para reabastecimento. Após deixar a aeronave, o comandante da mesma foi abordado por três oficiais da FAB (Força Aérea Brasileira) que ali se encontravam. Foi comunicado então que o helicóptero da Marinha estava apreendido e impedido de continuar viagem. Não aceitando tal arbitrariedade, o comandante de aeronave se dirigiu à mesma e deu partida no motor. Nesse momento, militares da FAB dispararam contra o rotor de cauda do helicóptero que ficou seriamente avariado, impedindo a decolagem. O incidente gerou um Inquérito Policial Militar, apresentado em 11 de dezembro. A crise entre as Forças atingiu o primeiro escalão do Governo e quatro dias depois o Ministro da Aeronáutica, Brigadeiro Nelson Lavanére-Wanderley, demitiu-se do cargo, sendo substituído pelo Major-Brigadeiro Márcio de Souza Melo. Uma solução presidencial era necessária e os estudos sobre o status da Aviação Naval deveriam ser concluídos em pouco tempo. Crise Política no MinistérioLogo após o incidente de Tramandaí, o NAeL Minas Gerais entrou na Baía de Guanabara com os aviões T-28 expostos no convés de vôo. Pela primeira vez as aeronaves eram exibidas em público. Esta manobra era parte da política de fato consumado, empregada pela Marinha para consolidar a Aviação Naval. Mas neste caso acabou tomando outro rumo. Indignado com tal afronta, o Ministro do Aeronáutica queixou-se à Marinha, que decidiu não retirar as aeronaves do navio-aeródromo (3). Como resultado, o ministro Souza Melo pediu demissão após menos de um mês no cargo.
Em consideração ao presidente da República, no dia 9 de janeiro (4) assumiu o Ministério o brigadeiro Eduardo Gomes. Orientado pelo brigadeiro, o presidente retoma a idéia de um comando misto nas operações conjuntas Marinha e Aeronáutica (3). A minuta do decreto presidencial previa a transferência de todas as aeronaves de asas fixas para a FAB e a imposição de severas restrições à utilização de helicópteros pela MB (1). Tomado de surpresa pela decisão presidencial, o Ministro da Marinha (Vice-Almirante Melo Batista), demonstrando todo o seu descontentamento com o desfecho, apresentou o seu pedido de exoneração do cargo no dia 14. A reação do Ministro expressava a própria indignação da Marinha e nenhum de seus Almirantes da Ativa assumiu o cargo. Para restaurar a paz entre as duas Forças e colocar um fim na crise política, o Presidente convidou o Almirante Paulo Bosísio (então já na reserva) para assumir o cargo. No dia 26 de janeiro de 1965 foi finalmente assinado o Decreto 55.627, extinguindo a aviação de asas fixas da Marinha. Pelo texto deste, o comando do porta-aviões Minas Gerais, incluindo os helicópteros, ficava sob a responsabilidade Marinha. Os aviões, sob o comando do Ministério da Aeronáutica, seriam operados pela FAB em sintonia com a Marinha. O entendimento entre as duas forças também previa a troca de equipamentos. Todos os aviões da Marinha foram repassados a FAB e os helicópteros H-34 do 2º/1º GAE foram encaminhados à Marinha. O Minas Gerais, que se encontrava no litoral do Nordeste no início de janeiro realizando operações de adestramento e instrução, foi chamado de volta ao Rio de Janeiro. No dia 28 do mesmo mês, o Presidente, o Ministro da Marinha e o Ministro da Aeronáutica compareceram ao convés de vôo do navio-aeródromo para formalizar o decreto. Foram realizadas demonstrações de toque e arremetida com aeronaves T-28 seguidas de pouso enganchado. Após a cerimônia, os aviões decolaram do Minas Gerais e realizaram uma última passagem em "V" sobre o navio antes de se dirigirem para a cidade de São Pedro da Aldeia (1). Bibliografia(1) LYNCH, P. O vôo do Falcão Cinza. Ed. Grafitto: Rio de Janeiro, 2003. 391 p. (2) SEBASTIANY, P. T. Aviação Naval - Reminiscências Parte III. Revista Marítima Brasileira, jul./set. 2006, vol. 126 n.07/09, p.147-178 (3) VICTORINO, P. O poder político-militar: O presidente estadista. Terras Brasileiras. Disponível em: <http://www.cinderela.com.br/republica/republ403x.htm>. Acesso em 02 mar. 2003. (4) NOSSO SÉCULO, Ministério Castelo. Abril Cultural: São Paulo, 1980. vol. 5, p.86 |