O governo federal publicou ontem, depois de inúmeros adiamentos, o decreto que pode mudar a forma de exploração portuária no país. A novidade do decreto é a licitação para investimentos privados na construção e gestão de portos organizados (equivalentes a portos como Paranaguá ou Santos). Hoje, a administração de portos organizados é prerrogativa exclusiva do Estado.

De acordo com expectativa do governo, o novo modelo destravará R$ 19 bilhões em investimentos nos próximos cinco a seis anos, o que pode elevar a capacidade de movimentação de carga no complexo portuário brasileiro dos atuais 750 milhões para 1 bilhão de toneladas por ano. Mas, antes de isso virar realidade, os investidores terão de esperar mais seis meses.

Esse é o prazo para a Antaq (Agência Nacional de Transportes Aquaviários) apresentar o plano geral de outorga, uma lista de todos os portos e terminais considerados viáveis pelo governo e que serão objeto de licitação pública. A concessão de área para a construção de novos portos é uma novidade instituída pelo decreto e que divide opiniões de especialistas.

“Acho que essa medida vai burocratizar os investimentos em novas estruturas portuárias”, afirmou Wilen Manteli, diretor-presidente da ABTP (Associação Brasileira dos Terminais Portuários). Segundo ele, a escolha pelo governo dos locais para a construção de novos portos deixa de seguir a lógica da empresa privada e passa a ser orientada pelo Estado.

O regime de autorização do poder concedente continuará a existir, mas o governo determinou que apenas empresas que tenham carga própria receberão aval para a montagem de terminais.

O decreto não dirimiu a dúvida que existia antes: qual o percentual de carga própria que esse terminal privativo pode operar? “No decreto, o governo determina que a carga de terceiros seja “subsidiária e eventual” na operação. Permaneceu a dúvida”, disse Eduardo Lima, responsável por projetos de infra-estrutura e sócio do escritório Lefosse, associado ao Linklaters.

Lima representa grupos de investidores interessados em explorar a atividade portuária brasileira e obteve ontem, em conversas preliminares sobre o decreto, duas avaliações distintas sobre o efeito que terá o novo decreto.

Sem dar nomes, ele explicou que um grupo investidor, proprietário de um terreno à beira-mar na Baixada Santista, considerou a licitação para novos portos um fator de risco.

Com o novo modelo, esse projeto só será viabilizado depois de incluído no plano geral de outorga. O grupo interessado poderá participar da licitação, mas poderá perder a concorrência para outro interessado, que ficaria obrigado a pagar a desapropriação da área. “Ele não quer a indenização para desapropriação do terreno, ele quer explorar o projeto no longo prazo”, afirma Lima.
Por outro lado, diz, operadores portuários internacionais acham que agora têm condições de entrar no Brasil, não para operar terminais.

“O modelo pode funcionar, mas tudo ainda vai depender do plano de outorga, que sai apenas em 180 dias. Só quando isso ocorrer e soubermos a modelagem dessas concessões é que será possível determinar se teremos investimentos“, afirmou Juliano Barbosa Araújo, advogado especialista em regulação na área de infra-estrutura e integrante do comitê de portos da Abdib.

Fonte: Folha de São Paulo

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