Força para os nacionais
Marinha quer se aproximar de fornecedores nacionais de navipeças para superar gargalos e garantir aumento de conteúdo nacional de suas próximas embarcações
Se depender do Programa de Reaparelhamento da Marinha, tanto os estaleiros brasileiros como os fornecedores nacionais de navipeças têm bons motivos para se animar. Depois de amargar alguns anos em banho-maria devido à escassez de recursos em seu orçamento, a Marinha do Brasil está agilizando o processo de renovação de sua frota. A intenção da instituição é contratar 27 navios-patrulha de 500 toneladas até 2016 e 12 navios-patrulha oceanográficos, de 1.800 toneladas em prazo ainda não definido. Além disso, segundo o coordenador do Programa de Reaparelhamento da Marinha, contra-almirante Antonio Carlos Frade Carneiro, a intenção é utilizar cada vez mais equipamentos produzidos por fabricantes nacionais. “Temos o desafio de trazer as micro, mini, pequenas e médias empresas para participar de licitações da Marinha”, afirmou ele em recente evento na Associação Brasileira da Indústria de Máquinas e Equipamentos (Abimaq), no Rio de Janeiro.
Sem dúvida que a meta de contratar tamanha quantidade de embarcações é ambiciosa principalmente se for levado em conta a atual dificuldade na obtenção de crédito tanto no Brasil quanto no exterior. Mas como o próprio governo Federal já manifestou sua vontade de modernizar os sistemas de defesa do país e de incentivar a indústria nacional de defesa, são maiores as chances de que dessa vez as propostas se concretizem. Em 2009 as Forças Armadas tiveram um aumento no orçamento de R$ 6 bilhões para R$ 9 bilhões, além de uma otimização de mais R$ 1 bilhão de execução orçamentária.
Outra boa notícia é que, segundo a Lei nº 11.768/2008, os royalties do petróleo que passarem a constituir receita do orçamento da Marinha não poderão ser contingenciados, o que proporcionou maior segurança ao planejamento financeiro da Marinha.
Atualmente os dois primeiros navios-patrulha de 500 toneladas estão em construção no estaleiro cearense Inace. As propostas comerciais para outros quatro estão em análise pela Marinha desde o final do ano passado. Três estaleiros apresentaram propostas: Mauá, Eisa e o próprio Inace. Somente os dois últimos seguem na disputa e o resultado final deve ser divulgado ainda neste semestre. A previsão da Marinha é de que os quatro entrem em operação até 2012. Os recursos para eles estão garantidos no orçamento da Marinha.
O contra-almirante Frade Carneiro explica que como mais uma medida para combate à crise econômica atual, o governo pretende selecionar projetos que têm possibilidades de execução imediata e outros seis dos 27 navios-patrulha poderão estar entre eles. “A antecipação da construção pode ser vista como mais uma medida do governo brasileiro para minimizar os efeitos da crise econômica, fomentando a indústria naval brasileira”, avalia, acrescentando que a Marinha aguarda decisão, para breve, sobre a autorização governamental para início de mais este processo licitatório. A meta é de que as obras sejam concluídas até 2016.
Em todos estes casos a construção será feita em estaleiro nacional e de preferência em unidades industriais distintas, para facilitar a difusão do conhecimento. “A intenção é ter diversos estaleiros capacitados para tocar as obras, para que o know-how não fique concentrado em um só estaleiro e a Marinha tenha condições de encomendar em diversos parques industriais ao mesmo tempo”.
O coordenador do PRM explica que a Marinha comprou o projeto francês utilizado nos dois navios em construção no Inace e está promovendo uma espécie de customização. Com isso será possível inserir mais itens nacionais, além de facilitar a aquisição de sobressalentes, a assistência técnica e a cotação de preços dos materiais. “Queremos que as empresas que fornecem para os navios-patrulha venham para o Brasil. Ou para fabricar aqui ou para fazer parcerias”, explica o coordenador do projeto. Cada navio-patrulha custa cerca de R$ 75 milhões.
Segundo ele, ainda não é possível ter números exatos sobre o índice de nacionalização dos navios-patrulha em construção no Inace porque, dentre outros motivos, muitos sistemas e equipamentos ainda estão em fase de seleção. Para os próximos, a Marinha pretende, com o aumento da escala de construção, atingir um índice de nacionalização cada vez maior. “A meta para o segundo lote é iniciar com no mínimo 50% de conteúdo nacional”, afirma o coordenador do PRM.
Frade Carneiro sugere que seja formado um pool de micro e pequenas indústrias para viabilizar a participação delas em projetos grandes. “Queremos que o major contractor se responsabilize por alguns procedimentos que seriam dos fornecedores. As empresas menores em geral não têm condições de produzir a documentação necessária, seja por dificuldades de entendimento das especificações técnicas fornecidas pela Marinha, seja por contar com departamentos comerciais frágeis. Mas o contato com a Marinha não é a única dificuldade. Exigências ambientais, fiscais, exigências de ensaios e certificações também inviabilizam ou inibem a participação do pequeno fornecedor.” Ele apontou ainda a falta de comunicação entre a Marinha e os fornecedores como outro entrave. Às vezes, a Marinha abre uma licitação e não tem a participação que esperava. “Até para o pequeno fornecedor fazer chegar até nós a sua dúvida é difícil”, afirma o contra-almirante, que pretende buscar uma aproximação maior entre a Marinha e os fornecedores nacionais.
Mais encomendas
A Marinha também planeja encomendar 12 navios-patrulha oceânicos de 1,8 mil toneladas. A licitação dos três primeiros, com opção de mais dois, é estimada para junho de 2010. A confirmação, no entanto, só virá após a aprovação do novo Plano de Equipamento e Articulação da Marinha (Peamb) pelo governo federal. Os recursos financeiros deverão ser provenientes do orçamento da Marinha. Cada um deles custa cerca de R$ 230 milhões e a intenção é de que as obras, a serem executadas em estaleiros nacionais, tenham 60% de conteúdo nacional.
Construir no Brasil um navio com tal nível de sofisticação não será tarefa simples. Questionários multidisciplinares elaborados por especialistas de diversos setores da Marinha serão enviados para projetistas tradicionais interessados em fornecer o projeto. Estes projetistas devem ter condições de atender aos requisitos da Marinha e dispor de projetos executados, já em uso em outras marinhas do mundo. “De posse das respostas, três deles serão escolhidos para compor uma short list para negociarmos e escolhermos os que nos derem as melhores condições. “Diremos o que queremos e escolheremos o que se dispuser não só a fazer aqui como a ter parceria com estaleiros nacionais para prepará-los para as construções. Pretendemos, por exemplo, estabelecer uma pontuação conforme o índice de nacionalização apresentado na proposta de licitação”, detalha o contra-almirante, acrescentando ainda que a Engeprom está se capacitando para que a construção dos canhões também possa ser feita no Brasil. Cada um dos navios-patrulha oceanográficos será equipado com um canhão de 76 milímetros e duas metralhadoras de 20 milímetros.O sistema de armas destes navios representa cerca de 50% de seu custo.
Entre os poucos estaleiros que têm know how para tocar essa encomenda estão o italiano Fincantieri, o alemão Thyssen e o espanhol Navantia.
Em sua apresentação na Abimaq, o coordenador do Programa afirmou que outras embarcações previstas no PRM somam cerca de R$ 400 milhões para encomenda até 2017. São chatas de água e óleo, rebocadores de portos, agências-escolas, lanchas, botes, etc
O PRM prevê ainda a construção de cinco navios-patrulha logísticos até 2028 com previsão de início em 2010. Eles também terão projeto estrangeiro e construção no Brasil. O custo total do PRM é estimado em cerca de R$ 2,7 bilhões.
Novo estaleiro para submarinos
Em dezembro, durante visita do presidente da França, Nicolas Sarkozy, o consórcio Odebrecht e DCNS (estatal francesa com administração privada) firmaram acordo que prevê a construção de uma base naval na Ilha da Madeira, em Itaguaí (RJ). A área tem 95 mil metros quadrados e pertence à Companhia Docas do Rio de Janeiro, com quem a Marinha está negociando a cessão do terreno. A cargo desta base estará a construção de quatro submarinos de propulsão diesel-elétrica. O primeiro deve começar a ser construído no próximo ano e fica pronto até 2014, o segundo até 2016, o terceiro até 2018. A intenção da Marinha é que o último submarino convencional fique pronto em 2021.
As seções dos submarinos deverão ser construídas na Nuclep e o transporte delas até a base será feito por outra estrada a ser construída especialmente para que não seja utilizada a estrada do porto de Itaguaí.
Para possibilitar a construção da base da Marinha foram feitas modificações no projeto do porto da EBX, vizinho ao da Marinha. O projeto de ampliação do porto de Itaguaí também foi preservado.
É um projeto de € 7 bilhões e o maior empreendimento da Marinha em toda a sua existência.
O contrato com a francesa DCNS prevê que ela deverá qualificar indústrias nacionais para produção de itens menores do empreendimento. No momento está sendo montado um cadastro de empresas brasileiras que possam participar da obra.
A intenção da Marinha é que enquanto a base e os submarinos convencionais estejam em construção, seja alicerçada a base para o primeiro submarino nuclear construído no Brasil.
FONTE: Portos e Navios