‘Reinventando a roda’
Desde que a Marinha do Brasil decidiu dar continuidade ao Programa de Construção de submarinos, uma grande luta foi travada nos bastidores para ver quem é que conseguiria fechar o novo contrato bilionário.
Os alemães, que nos últimos 25 anos ajudaram o Brasil a construir localmente quatro submarinos IKL-209/1400 no AMRJ, eram os favoritos. Além de contar com a base já instalada, que precisaria de modificações mínimas para construir seus submarinos U-214, os alemães possuem experiência na transferência de tecnologias para vários países e escala para garantir um produto mais barato.
Mas os franceses, aproveitando-se da troca de comando da Marinha e de uma aproximação do Governo Francês com o Brasileiro, acenaram com a venda de seus submarinos Scorpène e a transferência de tecnologia para o casco de um submarino nuclear.
Enquanto os estaleiros alemães não contavam com apoio de seu Governo no negócio, os franceses contaram com total apoio do seu para a sua proposta.
A tranferência de tecnologia alemã ao Brasil
Tudo o que a Marinha diz que será novo com os franceses, na verdade é uma repetição do que já ocorreu no passado com os alemães.
Quando o Ministro da Defesa diz que não houve transferência de tecnologia ao Brasil para a construção de submarinos ele contradiz tudo o que a Marinha disse até hoje sobre o assunto.
Sobre a construção dos submarinos Tupi segue um texto da Marinha:
“Durante o período de construção do submarino Tupi no estaleiro HDW, um grupo de Engenheiros, Técnicos e Operários, perfazendo um total de 70 funcionários, foi enviado àquele estaleiro para a realização de estágios, de acordo com as suas especializações técnicas. A duração média destes estágios foi de aproximadamente 5 meses. Nesta oportunidade foi possível acompanhar as principais etapas da construção e adquirir os conhecimentos técnicos necessários à realização e construção no Brasil. Todas as informações obtidas no decorrer dos períodos de treinamento dos estagiários foram registrados em inúmeros relatórios, para que pudessem posteriormente, já no Brasil, servirem de fonte de consulta e banco de dados para a preparação das equipes de construção”.
Sobre a transferência da tecnologia do casco resistente:
“A tecnologia de construção do casco resistente, absorvida pela Marinha no estaleiro HDW, foi então implantada na NUCLEP. Isto só pode ser viabilizado através da participação conjunta do pessoal técnico daquela empresa com o pessoal técnico da Marinha que havia sido treinado na Alemanha.”
Sobre a transferência de tecnologia ao pessoal brasileiro para o projeto do submarino brasileiro (SNAC-I), que seria o precursor do submarino nuclear:
O então Ministério da Marinha contratou a HDW / IKL para fornecer um programa de treinamento para a elaboração de um projeto próprio de submarino no Brasil. Para esta finalidade, cerca de 30 engenheiros foram destacados para participar do treinamento durante os anos 1985 e 1986, seguido de uma fase de concepção de projeto entre os anos 1986 e 1990.
Houve treinamento de projeto de submarino no Rio de Janeiro, na forma de palestras, de 1º de abril a 7 de maio de 1985. Foram abordados os assuntos hidrodinâmica, resistência de materiais, termodinâmica, arquitetura naval de submarinos, física e química relacionada a submarinos.
Também foi feito o treinamento de projeto de submarinos na IKL em Lübeck, Alemanha, na forma de palestras, de 20 de maio a 19 de julho de 1985. Foram abordados os assuntos de projeto de casco de submarinos, propulsão, “lay-out” e eletricidade de submarinos.
Entre 5 de agosto a 6 de dezembro de 1985, foram abordados temas sobre mecânica, elétrica, automação e eletrônica, comunicações e sensores/sistemas de combate de submarinos.
Entre janeiro de 1986 e junho de 1990 (54 meses), o treinamento consistiu da Fase de Projeto de Concepção de um projeto próprio, baseado nos requisitos da Marinha do Brasil para um submarino convencional de grande porte, compreendendo as seguintes partes:
1.Estudo de Viabilidade (janeiro de 1986 a março de 1986)
2.Projeto de Concepção (abril de 1986 a dezembro de 1986)
3.Fase Preliminar do Projeto (janeiro de 1987 a maio de 1987)
4.Fase de Projeto de Contrato (julho de 1988 a junho de 1990).
Em 1º de outubro de 1990, todas as atividades foram interrompidas por parte da Marinha do Brasil.
Então, quando o Ministro da Defesa diz que não houve transferência de tecnologia alemã para projetos de submarinos, ele deve estar no mínimo mal informado.
‘Jogando fora a água da banheira junto com o bebê’
A impressão que fica é que para justificar a compra dos submarinos franceses, a Marinha resolveu desqualificar seus atuais submarinos e todo o trabalho que já foi feito até agora.
Esquecem-se de que até 2015, os únicos submarinos que farão parte da Força de Submarinos do Brasil serão os 5 classe “Tupi” que foram construídos aqui com transferência de tecnologia alemã.
Uma falácia que está sendo usada é dizer que os alemães não sabem construir um submarino nuclear, pois nunca construíram um. Não mencionam que a Alemanha já construiu um navio de propulsão nuclear e que qualquer casco de submarino convencional com diâmetro suficiente, pode receber uma planta de propulsão nuclear, com pequenas adaptações como blindagem anti-radiação e outros detalhes. Coisas que o Brasil também deverá fazer sozinho, pois a França só vai ajudar no projeto do casco e não na parte nuclear.
Agora que o contrato com a França está prestes a ser assinado, resta-nos torcer para que os atrasos na construção dos submarinos não sejam grandes como estão ocorrendo na Índia e que o projeto do casco do submarino nuclear brasileiro possa fluir de acordo com o cronograma.
E, finalizando, que os futuros governos não interrompam novamente este novo ciclo de construção naval militar, para que não tenhamos novamente que reinventar a roda no futuro.
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