Classe O: óleo nos olhos do inimigo
De boas intenções, o fundo do mar está cheio – Parte 4
A Classe O foi a primeira nova série de submarinos britânicos construída após a Primeira Guerra Mundial, como resultado de um novo programa iniciado em 1923. Mas dessa vez, ao invés de buscar a inovação sem se importar com os custos (como a Classe K da matéria inaugural desta nossa série) o Almirantado buscou um projeto mais conservador, o que foi bom, e econômico, o que não foi tão bom.
Conservador porque baseou o projeto num modelo já consagrado do conflito anterior, a classe L52, porém ampliada com vistas a uma maior autonomia. Decisão inteligente. Econômico porque buscou dar a essa classe um alcance ainda maior que a ampliação do casco (ainda relativamente modesto) permitia, com a instalação de tanques de combustível externos ao casco de pressão. Decisão econômica menos inteligente, dadas as limitações dos métodos de construção da época.
A maioria dos submarinos ainda era construída com casco rebitado. Os ingleses prosseguiram nesse método de construção por bastante tempo, até o início da Segunda Guerra, enquanto outros países, como os EUA, já os construíam com chapas soldadas desde o início dos anos 30. E qual o maior problema de um casco rebitado? Ele pode vazar óleo.
Até aí, outros modelos contemporâneos de casco rebitado também vazavam. Há registros de que o Narwal norte-americano, contemporâneo dos Classe O, chegou a vazar 20.000 galões de óleo em uma saída de treinamento de 30 dias, em 1941 (era uma embarcação já um tanto gasta e problemática, em todo caso). Mas nos “O” ingleses, o problema era que o porte da classe, com 86,2 metros de comprimento, 8,4 metros de boca e 1.349 toneladas de deslocamento na superfície, ainda era relativamente modesto para o uso “word-wide” pretendido.
Como já citado, a solução econômica foi instalar grandes tanques de combustível externos no costado. Uma inovação que não era um problema em si: os famosos Tipo VII alemães, desenvolvidos nos anos 30, tinham tanques externos cada vez maiores instalados a cada novo subtipo, para compensar o curto alcance original. Mas eram tanques soldados. Os tanques externos rebitados dos Classe O ganharam certa fama por deixarem um nada discreto rastro de óleo na superfície, denunciando facilmente sua presença. E como uma das maiores vantagens de um submarino é a discrição, pode-se dizer que a Classe O já começava a batalha com uma desvantagem nada discreta. Talvez tivesse sido melhor, dadas as limitações da época, construir unidades maiores porém mais caras, sem os tanques externos.
Não obstante, lutaram bravamente, aproveitando suas características de bom poder de fogo, com seis tubos de torpedo na proa e dois na popa (todos de 21 polegadas). Levavam também um canhão de 4 polegadas em uma plataforma elevada à vante da extensa vela. Eram um tanto submotorizados para os deslocamentos em superfície, atingindo apenas 15 nós, o que era compensado pelo bom alcance – mas este não fez exatamente grande diferença no teatro onde acabaram operando, preferencialmente, as 9 unidades da classe: o Mediterrâneo, área em que submarinos menores eram mais indicados (tanto que, nos programas de rearmamento da segunda metade dos anos 30, os britânicos encomendaram grandes quantidades de vasos de pequeno porte).
No Mediterrâneo foram perdidas 5 unidades da classe (Odin, Olympus, Orpheus, Oswald e Oxley, este último torpedeado por outro submarino britânico, o Triton), destino compartilhado pela maioria dos seus sucessores das classes P e R, bastante semelhantes em seus pontos positivos e negativos.
Os Classe O que sobreviviam em 1942 (Osiris, Otus, Otway e Oberon, o líder da classe, que apresentava um desenho de proa diferente e sofria de constantes problemas mecânicos, que foram solucionados no resto da classe) passaram para funções de treinamento e de transporte de suprimentos para Malta – finalmente uma missão onde seu alcance maior fazia diferença. Apesar de não se poder afirmar, categoricamente, que parte das perdas deveu-se a detecções dos rastros de óleo pelo inimigo, fica a ironia da escolha do nome da classe: “O”, de óleo…
Esta série do Blog do Poder Naval é dedicada a projetos de submarinos que tiveram a intenção de inovar, quebrar tradições, testar novos limites, ou simplesmente resolver desafios táticos e estratégicos com a melhor das intenções. Mas que no fim deram com os burros n´água, literalmente.
Veja os artigos anteriores da série: