‘Homens de ferro em navios de madeira’ – Parte 1
Alexandre Galante
Entre os dias 10 e 12 de maio de 2010, o Poder Naval visitou a Força de Minagem e Varredura (ForMinVar) da Marinha do Brasil, sediada na Base Naval de Aratu, Salvador-BA.
Nossa visita teve como objetivo conhecer de perto o trabalho desta unidade de elite da Marinha, responsável por manter os portos e vias marítimas brasileiras livres da ameaça de minas submarinas.
As minas, consideradas o meio mais barato de negação do uso do mar, podem ser adquiridas praticamente por qualquer nação ou grupo armado, podendo ser lançadas por embarcações e aeronaves. Por isso é mister que o Brasil, como nação marítima, que depende do mar para sua sobrevivência, tenha capacidade de se contrapor a esse tipo de ameaça.
A mina naval pode ser classificada como arma de emprego estratégico, primordialmente. Porém, pode também ser empregada com objetivos táticos.
Como exemplos estratégicos, temos os campos de proteção de Defesa de Porto, os campos ofensivos da Operação Starvation contra o Japão na Segunda Guerra e as barragens no Mar do Norte, nas duas Guerras Mundiais.
Na 1a. Guerra Mundial, os alemães tentaram limitar a liberdade de ação da Grand Fleet britânica, através do plantio de campos minados no Mar do Norte, com o lançamento de 43.000 minas. Apesar do estrago causados pelas minas, os ingleses conseguiram evitar o bloqueio, com o emprego de 700 navios varredores.
Como exemplos táticos, temos as minas derivantes na Guerra do Paraguai, o lançamento de minas derivantes para cobrir a retirada de forças ou o lançamento de minas para evitar um desembarque, como em Wonsan, na Coreia.
Na Guerra da Coreia, 3.000 minas de modelo soviético do princípio do século XX, em sua maioria lançadas por juncos norte-coreanos e chineses em Wonsan, barraram o desembarque de uma divisão de Marines.
Foi feito um esforço formidável para a abertura de canais varridos, sendo varridas 228 minas em 15 dias, com grande impacto moral e prejuízos táticos. Na foto abaixo, o navio varredor sul-coreano YMS-516 sendo atingido pela explosão de uma mina magnética, em outubro de 1950.
Como exemplos mais recentes de vítimas de minas, temos a fragata da classe “Oliver Hazard Perry”, USS Samuel B. Roberts, e o USS Tripoli (LPH-10).
A Samuel B. Roberts foi atingida por uma mina M-08 iraniana, em 14 de abril de 1988. A explosão do artefato quebrou a quilha do navio e abriu um buraco no casco, não causando seu afundamento por pouco, graças ao competente trabalho de controle de avarias da tripulação.
Na foto abaixo, o USS Tripoli (LPH-10), atingido por uma mina iraquiana, em 1991, durante a Operação Desert Storm.
‘NAVALEX’ com os navios-varredores da classe “Aratu”
No dia 10, suspendemos às 8h30 da manhã para uma operação de varredura na Baía de Todos os Santos, navegando cerca de 50 milhas, indo até a Ilha de Itaparica e retornando para a Base Naval de Aratu por volta das 16h30.
Embarcamos em dois navios-varredores da classe “Aratu”, de projeto e construção alemã, o NV Albardão (M20) e o NV Araçatuba (M18).
Os navios-varredores navegaram até o local denominado pré-ponto, onde foi realizada a preparação (estrimagem) de todo o equipamento de varredura.
Abaixo as fases que precedem a varredura:
- Fase 1 – Formatura preliminar
- Fase 2 – Velocidade reduzida para lançamento dos equipamentos n’água
- Fase 3 – Velocidade de varredura
- Fase 4 – Energização do equipamento
A velocidade de varredura é feita entre 9 a 12 nós, quando é do tipo combinada. Na varredura mecânica, a velocidade é de 9 nós.
Na primeira etapa do exercício, foi realizada a varredura combinada de influência, que tem por objetivo provocar a explosão de minas que funcionam por assinatura acústica e/ou magnética dos navios.
Para isso, a guarnição do navio lança ao mar uma série de flutuantes (pintados de amarelo), que sustentam um martelo acústico mecânico GBT-3 (pintado de branco).
Esse martelo gera ruído semelhante aos hélices de um navio bem maior. Entre os equipamentos existem mais dois tipos de martelos acústicos, o MT (Médio Tom) e o BT (Baixo Tom), que têm assinaturas acústicas diferentes e são acionados eletricamente.
Os diferentes tipos de martelos são usados conforme o tipo de mina se espera encontrar em determinado local, por isso os navios operam conforme dados da Inteligência Naval.
Depois que o equipamento acústico é lançado, um flutuante denominado “defletor” empurra os cabos e flutuantes que sustentam o martelo para uma linha à boreste do navio-varredor, para que a cauda magnética possa ser lançada pela popa.
Após a estrimagem do equipamento de varredura acústica, é hora de lançar a cauda magnética, que é composta por cabos elétricos blindados, com comprimento total de 450m. Depois de estrimado, o cabo é energizado por um gerador especial, que cria um campo magnético semelhante ao de um navio.
A preparação para a varredura de influência tomou todo o período da manhã e parte do horário do almoço. Para ajudar o pessoal que trabalha debaixo de sol forte e sem almoço, foi servido o tradicional caldinho de feijão dos navios-varredores.
Após a varredura de influência, a guarnição do navio recolheu os equipamentos, almoçou e deu início à preparação da segunda etapa, que é a varredura mecânica.
Essa modalidade tem por objetivo varrer minas de fundeio e contato, que ficam presas a uma poita no fundo por um cabo de aço. Na varredura mecânica, o navio lança cabos com tesouras que cortam os cabos das minas, fazendo com que as mesmas cheguem à superfície, para serem destruídas com o canhão do navio.
Terminada a varredura mecânica e recolhidos os equipamentos, é o momento de lançar as bóias refletoras de radar, para definir o canal varrido por onde os demais navios podem passar em segurança.
‘Onde a Esquadra for, nós estivemos’
Durante a realização das fainas de varredura, pudemos atestar o preparo das tripulações na execução das complexas tarefas, que exigem coordenação e esforço físico. As manobras com cabos tensionados e o lançamento de flutuantes são arriscadas e demandam máxima atenção.
Ficou patente a extrema importância do mestre do navio, coordenando as ações dos homens como um maestro. Desejamos sorte ao sargento Dante que está aprendendo com o mestre De Andrade a arte da estrimagem a bordo do NV Albardão.
Encerrada a operação de varredura e o recolhimento das boias refletoras, o Albardão içou sua bandeira de faina e a bandeira do ComForMinVar, vistas abaixo:
De volta à Base Naval de Aratu, o Poder Naval fez fotos com as tripulações do NV Araçatuba e o NV Albardão, para o registro desse dia especial.
Nas próximas partes desta reportagem: História da ForMinVar, entrevista com o Comandante e o futuro da Força e as minas nacionais.
AGRADECIMENTOS: Ao Centro de Comunicação Social da Marinha, ao Comandante da ForMinVar, CF Telmo, ao CF Castro Loureiro (GAAGueM), CC Velasques (CEM), pela atenção com que nos trataram e aos CTs Braslavsky, Rogério e Marcio Oliveira, pela hospitalidade e às tripulações dos navios-varredores, pelo excelente tratamento que recebemos.
APOIO: MARLOG (MARINE LOGISTIK GmbH). A especialidade da MARLOG é logística para submarinos e navios militares, fornecendo serviços para Marinhas de 25 países, tanto sobressalentes quanto equipamentos completos para projetos de modernização. A MARLOG apóia os submarinos da Marinha do Brasil e possibilitou a realização desta matéria.
Bom dia senhores editores,
Poderiam explicar qual o motivo que levou a ForMinVar está tão longe da “base principal da nossa esquadra”
Claudio, o motivo deve ter sido o mesmo dos que querem a descentralização das Forças Navais do Brasil, criando uma 2a. Esquadra: não deixar todos os navios num lugar só.
O outro motivo é a ForMInVar estar num ponto central da costa brasileira, levando o mesmo tempo para se deslocar para o sul ou para o norte, em caso de necessidade.
Bla matéria, lindas fotos e belíssima homenagem à força deminagem e varredura que nem sempre é lembrada nos artigos sobre marinhas, embora seu trabalho como apresentado é d esuam inprotância.
esperemos que o reaparelhamento da Marinha possa trazer um novo salto em qualidade dos meios envolidos nesta improtante tarefa.
Parabéns ao Poder Naval e a Marinha por esta bela homenagem.
Sds
Excelente matéria!!!!!!!!
Boa Tarde,
Alguém sabe a origem dessas embarcações da MB, onde foram fabricadas e quando?
Obrigado
Excelente reportagem. O Naval valoriza a Marinha ao divulgar suas ações. Que venham mais reportragens como essa.
Wevellyn, a informação está no texto da matéria. Projeto e construção alemã.
Clicando no link navios-varredores da classe “Aratu” da matéria, você acessa a ficha do NV Aratu no NGB, como todo o histórico do primeiro da classe.
Mais detalhes sobre a classe “Aratu” virão em próxima parte da reportagem sobre a ForMinVar.
Linda matéria!
Fiquei feliz de ver que a marinha do Brasil está preparada para uma das missões mais importantes em caso de batalha. Gostei muito dos navios também.
Espero que nossas FA continuem abrindo seus “portões” para o Blog, pois mesmo sendo entusiasta de assuntos militares, eu não sabia da existência desses navios na marinha brasileira e como disse anteriormente fiquei muito feliz de saber que nós temos esta força 😀
Caro amigo Galante
Bravo Zulu! O Site do Poder Naval sendo convidado para uma bela faina é um marco! sobre os caça minas, ao meu ver é um navio que poderia ser contruído aqui…
Assim como o colega Joaca disse, acredito que esse tipo de navio poderia ser desenvolvido e construido aqui mesmo e vendo a imensidão de nosso litoral, acho que seria interessante termos ao menos de 8 a 10 dessas embarcações.
Padrão! Parabéns ao Naval!
Parabéns pela bela matéria, um lado menos conhecido e muito importante da nossa marinha.
Abs
queria saber se estao abertas para visitas
Parabéns ao blog pela maeria muito intressante sobre os ilustres marineheiros com esta nobre função.
Parabéns pelo artigo, indico um sobre a necessidade de Draga-minas na Marinha Portuguesa no blog Barco à vista: http://barcoavista.blogspot.com/2009/09/draga-minas.html
Não foi pelo motivo dos americanos, durante a 2ª WW, instalarem os modernos meios (naquela época) para contra-minagem na cidade de Salvador (o foco era no NE)? Após a guerra a MB cotinuou utilizando as instalações de Aratu.
Para muitos tem que ficar tudo concentrado no Rio de Janeiro.Quem conhece a Base Naval de ARATU sabe das suas qualidades de possuír um Cais melhor que o AMRJ.
Caros amigos a reportagem foi show sobre todos os aspectos, eu na minha infância dei muitos mergulhos na Praia de ICARAÍ aqui em Niterói-RJ onde resido tendo como trampolim o convés do antigo Navio Varredor JURUENA.Abraços do José Henrique.
Essa matéria ficou show!!! e a parte 2?….rsrs
Lembro bem quando chegaram novos, vindos da Alemanha, lá em Recife. Já acompanhava todos os seis pelos ‘No Mar’ da ápoca. Nomes como Abecking & Rasmussen, Lewendem-Bremen(as grafias podem estar erradas, não fui no NGB), me eram familiares. Lembro do Médice visitando um deles em Salvador.
Abs
Desculpem a ignorância, mas eu entendi bem ? São barcos de madeira ? Qual a razão ?
Netuno, os navios-varredores são de madeira para ficarem imunes à detecção de minas magnéticas. Do contrário, eles poderiam ter o mesmo destino daquele navio-varredor da foto em preto e branco lá do início desta matéria.
Galante, no sentido de querer somar ao debate, me corrija se estiver errado: Existem basicamente 2 tipos de minas navais: as de “fundo” e as de “fundeio”. As de “fundo” como o nome indica possuem flutuabilidade negativa, portanto, ficam pousadas no fundo, sendo mais adequadas a locais rasos e são detonadas por “influência” (pressão, acústica, magnética ou sísmica) As de “fundeio” possuem flutuabilidade positiva e são ancoradas ao fundo por meio de um cabo preso à base, são programadas para ficarem a determinada profundidade sendo mais adequadas a locais mais profundos (até 500 m), e são detonadas por contato ou… Read more »
minas magneticas aforam casco metalicos
creio ter sido ideia inteligente os cascos de madeira, axo eu né
abs
MO
A Classe Aratu corresponde a uma classe de navios varredores de minas, que tem como origem a Schütze-Klasse da Alemanha. Os navios foram adquiridos pela Marinha do Brasil entre 1971 e 1975, e foram fabricados pelo estaleiro Abeking & Rasmussen, em Lemwerder, na ex-Alemanha Ocidental. Estes navios foram construídos com casco de madeira e materiais amagnéticos para diminuir a influência do mesmo nos seus equipamentos de detecção. Devido a seu material de construção, após trinta anos de serviços, estas embarcações começaram a apresentar elevado nível de desgaste. Diante da falta de recursos para a sua substituição ou modernização, a Marinha… Read more »
Excelente matéria, de fato. Parabéns aos editores Galante e Wiltgen pelo excelente trabalho de divulgação da MB, informativo, bem fundamentado, e sem buscar a polêmica a todo o custo, característica esta da imprensa leiga em geral. Muito bacana ver a abordagem das tripulações, que são a alma dos navios. Fala-se muito em milhões, bilhões de dólares, de euros para aquisições, mas as tripulações, estas é que importam, não têm preço, e muitas vezes ficam em segundo plano ou esquecidas. Exemplo emblemático é a diferença de história das MEKO 360 argentinas e da nigeriana. Espero que sirva de incentivo para a… Read more »
Meu caro amigo Galante, sua cobertura de nossos Varredores ficou um show, excelente como seu perfil de um grande jornalista e um autentico brasileiro apaixonado pela área militar especialmente a nossa Gloriosa Marinha.
GALANTE aqui esta meu email pra você enviar aquela foto que tiramos de frente ao NV ALBARDÃO dia 12, após a cerimonia de aniversário da FMV:
seu amigão de longas datas: SO-OR ASSUNÇÃO
olá amigos! fico agradecido em ter me citado na materia de vcs, se possível envie as fotos que tenham minha pessoa, agradeço e acredito que vcs serão bem vindos a bordo dos nossos navios varredores! até breve. sg dante
Senhores
Trabalhei por quatro anos na Base Naval de Aratú e apesar de muita pesquisa sabemos pouco do seu histórico. As informações mais interessantes que colhi foi através de um mestre antigo o Sr. Silvano que me falava das suas experiências na época em que a base pertencia aos americanos. Que tal o Poder Naval fazer uma matéria sobre essa instituição?