O afundamento do cruzador ARA ‘General Belgrano’ nas Malvinas
O almirante Woodward em seu livro “One Hundred Days” conta que a Frota Britânica, no dia 2 de maio de 1982, estava dentro da zona de exclusão de 200 milhas imposta pela Inglaterra à Argentina em torno das Malvinas, posicionada em algum ponto à nordeste das ilhas.
Às 3h20 da manhã, Woodward foi acordado por seu staff, com o aviso de que um avião Tracker tinha iluminado sua Força-Tarefa com o radar de busca e que os argentinos agora sabiam sua posição.
Um jato Sea Harrier foi enviado para a marcação do contato, a fim de investigar. O jato britânico mais tarde informou que durante o voo, seu RWR (Receptor de Alerta Radar) registrou que o caça foi iluminado por um radar de direção de tiro, Type 909, que equipava os destróieres Type 42 argentinos. Desta forma, confirmou-se a presença, a cerca de 200 milhas de distância da FT britânica, do NAe 25 de Mayo e de suas escoltas Type 42, Santissima Trinidad e Hercules.
Woodward sabia que o 25 de Mayo levava 10 jatos Skyhawk com 3 bombas de 500kg cada, o que significava um possível ataque de 30 bombas à FT britânica, logo após o amanhecer. E ainda havia o temor de que os jatos Super Étendard também pudessem decolar do 25 de Mayo, com Exocets.
Para piorar a situação, 200 milhas ao sul das Ilhas Malvinas, o cruzador General Belgrano e duas escoltas estavam à espreita e poderiam chegar em poucas horas à distância de tiro de seus Exocet contra a FT britânica.
O cruzador General Belgrano era o ex-USS Phoenix da classe “Brooklin”, de 13.500t de deslocamento, armado com 15 canhões de 6 polegadas, oito canhões de 5 polegadas, todos maiores que os canhões da FT britânica.
O navio era o sexto da classe, com construção iniciada em 1935 e lançamento em 1938. Ele escapou do ataque japonês à Pearl Harbor em 1941 e foi descomissionado em 1946, sendo transferido à Argentina em 1951.
Além dos canhões, o General Belgrano também tinha recebido lançadores de mísseis Exocet MM38, assim como suas escoltas.
O almirante britânico percebeu que o 25 de Mayo e o Belgrano estavam fazendo um movimento em pinça e que um dos dois precisava ser eliminado. Como a posição do navio-aeródromo argentino não era conhecida, o Belgrano foi o escolhido.
O submarino nuclear HMS Conqueror, comandado por Christopher Wreford-Brown, estava acompanhando o cruzador argentino de perto há dois dias, enquanto o submarino HMS Spartan ainda não tinha encontrado o navio-aeródromo argentino.
O HMS Conqueror descobriu um navio-tanque argentino e o acompanhou até o ponto de encontro com o Belgrano e assistiu à operação de reabastecimento.
As ROE (Regras de Engajamento) não permitiam ao HMS Conqueror disparar contra o Belgrano, pois o mesmo se encontrava fora da Zona de Exclusão.
O almirante Woodward precisava pedir ao Comandante-em-Chefe na Inglaterra para alterar as ROE e ordenar ao Conqueror o afundamento do Belgrano imediatamente. Mas o pedido enviado à Inglaterra por satélite iria demorar muito, o que poderia fazer com que o submarino britânico perdesse contato com seu alvo.
Sendo assim, Woodward ordenou o ataque enviando a seguinte mensagem ao submarino: From CTG (Commander Task Group) 317.8 to Conqueror, text prority flash – attack Belgrano group. Ao mesmo tempo, solicitou permissão da revisão da ROE, esperando que ele fosse atendida, pela emergência da situação.
O Grupo-Tarefa do Belgrano estava navegando a 13 nós, acompanhado pelo HMS Conqueror, que fazia perseguição padrão “sprint-and-drift”, que consiste em navegar em grande profundidade a 18 nós por 15 ou 20 minutos, depois indo para a cota periscópica, navegando a 5 nós, a fim de atualizar a posição do alvo pelo oficial de controle de tiro. Depois, a perseguição começava novamente.
O temor de Woodward e do comandante do submarino era o Belgrano rumar para o Banco Burdwood, uma elevação no fundo do mar que obrigaria o submarino a navegar numa profundidade menor e perder o contato com o cruzador e seu grupo. Por isso a pressa em tomar logo a iniciativa de afundá-lo, enquanto havia contato com ele.
Às 0810Z do dia 2 de maio, o GT do Belgrano mudou de curso, agora rumando para o continente. Às 1330Z, o Conqueror recebeu o sinal de mudança de ROE vindo da Inglaterra.
O Comandante do HMS Conqueror, Christopher Wreford-Brown, comentou mais tarde suas impressões sobre a navegação tática do Belgrano. O comandante do navio, capitão Hector Bonzo, parecia não estar nem um pouco preocupado em ser alvo naquele momento.
Navegava a 13 nós, com os escoltas mais à frente, num leve ziguezague. O comandante do navio argentino não era submarinista e parecia conhecer pouco de submarinos, principalmente de nucleares. Se conhecesse, estaria navegando em velocidade bem mais alta, com os escoltas lado a lado protegendo seu costado e fazendo um ziguezague mais agressivo, para evitar possíveis torpedos.
Para completar, os escoltas do Belgrano estavam navegando com os sonares ativos desligados.
Às1830, o HMS Conqueror aproximou-se do Belgrano em alta velocidade por bombordo, passando por baixo dele e indo para a cota periscópica por boreste, a fim de conseguir uma boa solução de tiro.
O comandante Christopher já tinha se decidido em usar velhos torpedos de tiro reto Mk.8 da Segunda Guerra Mundial, pois levavam maior carga explosiva e eram mais confiáveis que os novos Tigerfish Mk.24, guiados a fio.
Os tubos foram carregados com 3 torpedos Mk.8 e 3 Mk.24, por precaução. Os torpedos foram disparados à proa do Belgrano, para que encontrassem o navio numa posição futura.
Segundo o comandante do Conqueror, os disparos dos torpedos foram feitos à “queima-roupa”, à distância de 1.380 jardas (1.255m), com os operadores de sonar do Conqueror ouvindo bem alto o característico som dos hélices do Belgrano, algo parecido com “Chuff-chuff-chuff… chuff-chuff-chuff…”.
Após 55 segundos do primeiro disparo, o primeiro torpedo explodiu na proa do cruzador, no ponto após a âncora e antes da primeira torreta. A proa foi arrancada pela explosão. O comandante Christopher viu a explosão pelo periscópio e ficou abismado.
Logo veio a explosão do segundo torpedo, que atingiu o navio na altura da superestrutura.
O terceiro torpedo acabou errando o Belgrano e explodiu por acionamento da espoleta de proximidade, na popa do destróier argentino ARA Bouchard, sem maiores danos. Vinte minutos depois do ataque, o comandante do Belgrano ordenou à tripulação o abandono do navio, o que foi feito sem pânico, em botes salva-vidas infláveis.
Como estava escuro, as escoltas do Belgrano não sabiam ainda o que havia acontecido, pois o cruzador após o ataque ficou sem rádio. Quando as escoltas perceberam o ocorrido, tentaram inutilmente o lançamento de cargas de profundidade.
Navios argentinos e chilenos resgataram 770 tripulantes do Belgrano do mar, entre os dias 3 e 5 de maio. Um total de 323 homens pereceram no ataque, entre eles dois civis.
A foto abaixo mostra o HMS Conqueror, retornando à Inglaterra após a Guerra das Malvinas, com sua bandeira de pirata Jolly Roger hasteada, que ao invés dos tradicionais dois ossos cruzados com a caveira, tem dois torpedos.
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