Poder Naval voa com os Falcões da Marinha

Por Guilherme Wiltgen

Base Aérea Naval de São Pedro da Aldeia, 23 de agosto de 2010 as 6:30hs da manhã. Inicia-se mais uma dia a bordo e este muito especial, pois nesta data comemora-se o aniversário de 94 anos da Aviação Naval Brasileira e o dia do Aviador Naval.

Para mim, um pouco mais especial e a muito esperado, planejado e sonhado, pois dentro de poucos minutos, estaria iniciando os meus preparativos para tripular o AF-1A Falcão (TA-4KU Skyhawk II) do 1° Esquadrão de Aviões de Interceptação e Ataque (VF-1) da Marinha do Brasil, avião este que é uma verdadeira lenda na Aviação Naval mundial e que foi escolhido para fazer renascer a tão esperada aviação de asa-fixa de nossa Marinha, sonho de muitos dos “Velhas Águias” que estariam desfilando orgulhosos, durante a cerimônia militar, da qual tive o privilégio de poder participar voando no Falcão durante a apresentação aérea alusiva a data.

O Briefing de solo

Assim que chegamos ao hangar do VF-1, a equipe do Poder Naval composta por Guilherme Wiltgen, Alexandre Galante e Luiz Padilha, foi recepcionada pelo CC Rômulo Sobral, que seria o piloto da “minha” aeronave. Em seguida, fomos conduzidos para a sala de equipamentos de voo, para que eu pudesse iniciar minha preparação, vestindo o macacão de voo, o anti-G e o colete de sobrevivência.

Passada a euforia inicial, já na fase das vestimentas é possível ter uma vaga ideia do que se passa lá em cima no AF-1.

Devidamente equipado, o desconforto é algo que beira uma sensação de pânico, pois é preciso se adaptar ao espaço que sobra até para respirar, sem contar que neste momento, já com o capacete, você tem um adicional de peso de quase 15 Kg, só de equipamentos nescessários a realização do voo em uma aeronave de alta performance.

Em seguida, passamos ao briefing de cabine e de assento ejetor. Neste momento, comecei a entender os riscos envolvidos neste tipo de operação e o que deve ser feito na possibilidade de algo vir a dar errado durante o voo. Toda a instrução é feita a bordo da aeronave, treinada e repetida várias vezes pelo Comte Sobral comigo.

É importante ressaltar que na Aviação Naval, além do alto grau de profissionalismo dos militares envolvidos, a consciência de segurança de voo é  levada muito a sério e está presente no dia-a-dia de todos, desde o Comandante ao marinheiro mais novo.

Passado esta etapa, nos reunimos na Praça d’Armas do Esquadrão para aguardar a chegada dos demais tripulantes para realizarmos o briefing do voo propriamente dito.

O voo no AF-1A N-1022 (Falcão 22)

Durante este briefing é que tomamos conhecimento de todos os dados técnicos do nosso voo, a descrição das manobras que seriam executadas, frequências de rádio, teto e etc…, tendo ainda o CF Fernando Vilela (Imediato do VF-1) me deixado bem a vontade para participar com as informações com relação ao que precisávamos, para que as aeronaves permanecessem em ângulos e posições pré-determinadas e nosso ensaio fotográfico resultasse em imagens de boa qualidade.

As aeronaves destacadas para apresentação aérea no aniversário da Aviação Naval e suas respectivas tripulações foram:

AF-1 N-1011 – CF Fernando Vilela – Líder
AF-1A N-1021 – CC Medeiros e CT (FN) Lamego – 2
AF-1A N-1022 – CC Rômulo Sobral e G. Wiltgen – 3

Encerrado o briefing, a tão esperada hora de guarnecer a aeronave chegou.

Junto com o CC Sobral, caminhamos pelo pátio das aeronaves em direção ao tão esperado encontro com o Falcão 22, que se encontrava nos hangaretes do Esquadrão, onde fui recepcionado pelo CF Fonseca Júnior, Comandante do VF-1, que veio me desejar um bom voo.

Olhar para aquela máquina, que iria me proporcionar nas próximas horas um dos momentos mais incríveis da minha vida, é algo simplesmente indescritível, mas que tentarei trazer a vocês mais a frente.

Após todo o trabalho de me acomodar e prender ao meu assento ejetável SCAPAC IG-3, procedemos ao “starte” dos motores Pratt & Whitney J52-P408. Esse motor é muito comum nos últimos modelos (M/N e alguns F modificados por Israel), porém, os TA-4KU são os únicos Skyhawk biplaces equipados com eles (os TA-4J utilizam a versão Pratt & Whitney J52-P6A).

O J52 é um motor do tipo turbojato, com um compressor duplo de fluxo axial e sem dispositivos de pós-combustão. A esta altura, só conseguia visualizar o Galante e o Padilha, correndo de um lado para o outro, escolhendo a melhor e mais segura posição para registrar este momento histórico do Poder Naval e assim como eu, aquele som altíssimo, parecia música para seus ouvidos também.

Taxiamos até o ponto de espera, para nos posicionarmos na cabeceira da pista 07-25, aguardando a decolagem do Líder e do 02, em frente ao local onde se concentrava as autoridades e o público presente.

Pontualmente às 9h56 iniciamos a nossa decolagem para, em seguida, ser apresentado a tão falada força G, em uma arremetida seguida de uma curva acentuada à esquerda, já senti o que me esperava pelas próximas duas horas.

Ao fim da curva o Falcão 22 já se reunia em formação ao 11 e ao 21, demandando imediatamente para a área Arraial, a fim de aguardar o momento que a Torre Aldeia iria nos chamar para a nossa passagem durante a solenidade.

Enquanto não chegava este momento, passamos para a fase de treino da apresentação, quando em voo, realizamos todos os procedimentos e manobras que iríamos realizar perante o público, na passagem sobre a Macega.

Após a passagem sobre a pista, as três aeronaves simulariam uma perseguição típica de combates aéreos, aí se percebe imediatamente a manobrabilidade do A-4 e é impossível não lembrar do “Maverick” e do “Goose” fugindo desesperadamente com seu F-14 do “Jester”, a bordo de seu A-4 no papel de “Aggressor”.


Todo o nosso treinamento foi realizado a aproximadamente 150 milhas da costa (cerca de 270Km), onde atingimos também o teto de voo FL180 e velocidade de até 450 nós (833km/h).

Encerrada esta etapa e estando tudo na marca para a apresentação, podemos relaxar e nos dedicar a realizar a “Fotex” com o VF-1.

Antes de iniciarmos as fotos, aproveitei este momento muito especial da minha vida, que não podia deixar de compartilhar com a minha esposa Maria Angela e minha filha Thaís, de 2 aninhos, que mesmo não podendo estar na Macega desta vez, pegaram uma carona no voo com o Falcão 22.

Descemos para aproximadamente 300 pés de altitude e começamos a sobrevoar a linda costa da Região do Lagos em direção a Ilha de Cabo Frio, Arraial do Cabo e Búzios, afim de buscar conjugar a imagem dos nossos AF-1/1A com as verdes águas do mar, característica desta área, logo abaixo de nós, num dia que parecia agendado com São Pedro.

A título de informação técnica, segue o nosso metar (Meteorological Aerodrome Reports) do dia do voo:

SBES 231200 06010KT CAVOK 25/17 Q1021

Onde lemos o seguinte:

SBES – Identificação da Estação – SÃO PEDRO DA ALDEIA (RJ)
06010KT – Velocidade e direção do vento sendo, 060 direção de onde sopra o vento e a velocidade de 10KT=10 nós
CAVOK: A palavra CAVOK também é usada quando a visibildade é maior que 10 Km sem nuvens abaixo de 5.000 pés e não há precipitação ou tempestades.
25/17 – Temperatura do ar e temperatura do ponto de orvalho. Ambas as temperaturas estão em graus celsius
Q1021 – Pressão barométrica em hPa (hectopascal)

Terminada a “Fotex”, nos posicionamos orbitando sobre a Lagoa de Araruama, pois se aproximava o momento da apresentação.


Chamado pelo controle Aldeia, nos posicionamos em formatura e realizamos a passagem baixa sobre a pista no sentido 07-25, para em seguida realizar uma arremetida seguida de uma curva acentuada à esquerda, iniciando a perseguição aos outros dois Falcões. Depois, nos posicionamos novamente e de frente para o público, realizamos um “Brake” com uma subida vertical, terminando a manobra com os três caças em formação, entramos no circuito para pouso, sendo a ordem novamente do Falcão 11 (Líder), seguido pelo 21 e pelo o 22, último a pousar as 11:41hs.

O Batismo

Ao retornar do voo, e seguindo as melhores tradições dos pilotos de caça, não escapei do tradicional batismo promovido pelos pilotos e os Plane Captain do VF-1.

Bem fisicamente mas nitidamente cansado após 1:45h de voo, tomei um banho com a água mais gelada da minha vida e ainda atravessei o corredor polonês composto pelos “meus colegas de esquadrilha”, mecânicos de voo e do fogo amigo do Padilha, encerrando este momento maravilhoso, que lembrarei com muito carinho pelo resto da minha vida.

NOTA do EDITOR: Agradecemos ao Comandante da Marinha AE Júlio Soares de Moura Neto, ao CA Faria Alves (Diretor do CCSM), ao CA Liseo (ComForAerNav), ao CF Rogério Miranda (CEM ForAer), CF Fonseca Júnior (Comte. VF-1), ao CF Fernando Vilela (Imediato VF-1), ao CC Rômulo Sobral, grande amigo e meu 1P, CC Medeiros, CT Lamego e todos do VF-1 que não pouparam esforços em nos auxiliar e a Ten. Renata Francisco e D. Anne Figueiredo (SECON ForAer).

A todos o nosso muito obrigado, principalmente pelo privilégio único, de me proporcionar ser um Aviador Naval, justamente na data em que se comemora o seu dia.

BRAVO ZULU FALCÕES!

BATE-PAPO ONLINE: Converse com os editores e outros leitores após as 20:00h, sobre o voo do Poder Naval com os Falcões da Marinha, no ‘Xat’ do Poder Naval, clicando aqui.

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