Futuro indefinido
Sem uma decisão clara do governo sobre o futuro das usinas nucleares incluídas nos planos estratégicos do setor elétrico e carente de um programa de investimentos adequado, que lhe assegure os recursos de que necessita, a estatal responsável pela extração e enriquecimento do urânio utilizado nessas usinas não consegue aumentar sua produção e reconhece que o País não alcançará a autossuficiência nessa área até 2014, como previa o governo. Por isso, a Usina de Angra 3, que deve entrar em operação em 2016, funcionará apenas com urânio importado.
Lançado em 2007 e atualizado em 2008, o Plano Nacional de Energia (PNE) 2030 previa, além da conclusão de Angra 3, a construção de mais quatro usinas nucleares, duas delas no Nordeste e duas no Sudeste. O argumento central utilizado pela Empresa de Pesquisa Energética (EPE), responsável pela elaboração do PNE, era o de que, na década de 2030, todo o potencial hidrelétrico do País estaria praticamente utilizado, o que exigiria a complementação do sistema gerador com outras fontes.
A energia nuclear foi considerada a mais adequada para essa complementação, por ser uma fonte limpa (a usina nuclear não lança poluentes na atmosfera como fazem as usinas que utilizam gás ou óleo combustível) e porque, além de ter a sexta maior reserva conhecida de urânio do mundo – com a possibilidade de melhorar a posição, pois as reservas conhecidas foram pesquisadas em apenas 25% do território nacional -, o Brasil domina a tecnologia de enriquecimento do urânio e utiliza essa fonte para a geração de energia elétrica há bastante tempo.
Pelo menos dois fatores, no entanto, estão exigindo revisão do PNE 2030. Fontes renováveis, como a eólica e a biomassa, que em 2007 respondiam por 0,1% e 4,1% da geração de eletricidade, aumentaram sua participação para 0,5% e 6,6%, destacando-se como alternativas adequadas para complementar a geração hidráulica.
Há dois anos, o acidente na usina nuclear de Fukushima, causado pelo terremoto e pelo tsunami que atingiram o Japão, provocou uma revisão em escala mundial dos programas de geração de energia nuclear que resultou em aumento das resistências à utilização dessa fonte.
Até agora, porém, o governo não decidiu como ficará o plano energético para as próximas décadas, o que gera incertezas entre as empresas do setor, algumas das quais poderiam se associar à estatal Indústrias Nucleares do Brasil (INB) na exploração de jazidas de urânio. Além disso, por causa da política fiscal do governo, de cortar despesas de determinadas áreas para compensar as generosidades tributárias concedidas a alguns setores da economia e os aumentos de outros gastos, a INB – responsável pela produção do combustível nuclear, desde a mineração até seu enriquecimento – não tem conseguido utilizar, em média, mais de dois terços de seu orçamento, como mostrou o jornal Valor (13/3).
A capacidade máxima da única mina atualmente em operação no País, a de Cachoeira, em Caetité (BA), permite a produção de aproximadamente 400 toneladas de concentrado de urânio, conhecido como yellowcake. Essa produção é suficiente para atender as Usinas Angra 1 e Angra 2, que geram aproximadamente 2 mil megawatts de energia elétrica. A exploração da mina de Cachoeira pelo método atualmente empregado se esgotará em 2014, o que exigirá a exploração de veios subterrâneos, mas isso ainda depende de licenciamento ambiental.
O programa de enriquecimento de urânio, que eleva sua concentração até o nível necessário para sua utilização na geração de eletricidade, está quase parado. O contrato entre a INB e a Marinha, que detém a tecnologia de enriquecimento do urânio, prevê a instalação de uma fábrica ao lado das instalações da estatal em Resende (RJ), foi assinado em 2000, mas seus resultados são ainda muito modestos.
Apesar da semiparalisia do programa de geração de eletricidade a partir de combustível nuclear, o governo mantém as obras de Angra 3, que dependerá de urânio importado.
FONTE: O Estado de S. Paulo