31 anos do afundamento do cruzador argentino ‘General Belgrano’
No dia 2 de maio de 1982, por volta das 18h30, o submarino nuclear britânico HMS Conqueror disparou três torpedos Mk.8 de tiro reto à proa do cruzador General Belgrano, à distância de apenas 1.380 jardas (1.255m), praticamente à “queima-roupa”. O primeiro torpedo explodiu na proa do cruzador, e o segundo próximo à sua superestrutura. Vinte minutos depois do ataque, o comandante do cruzador ordenou à tripulação o abandono do navio, em balsas salva-vidas infláveis, que aparecem na foto do alto na cor laranja. Navios argentinos e chilenos resgataram 770 tripulantes do General Belgrano do mar, entre os dias 3 e 5 de maio. Um total de 323 homens pereceu no ataque, entre eles dois civis.
O cruzador General Belgrano era o ex-USS Phoenix da classe “Brooklin”, de 13.500t de deslocamento. Estava armado com 15 canhões de 6 polegadas e oito de 5 polegadas, todos de calibre maior que o dos canhões da frota inglesa. O navio teve sua construção iniciada em 1935 e lançamento em 1938. Ele escapou do ataque japonês a Pearl Harbor em 1941 e foi descomissionado em 1946, sendo transferido à Argentina em 1951.
Além dos canhões, o General Belgrano também tinha recebido lançadores de mísseis Exocet MM38, assim como suas escoltas (embora haja informações de que os lançadores do cruzador fossem maquetes, destinadas a enganar o inimigo sobre suas reais capacidades – ver destaque na imagem abaixo).
Com o envio da frota britânica para o Atlântico Sul em abril de 1982 e o fracasso das negociações diplomáticas após a invasão das Ilhas Malvinas/Falklands por forças argentinas, as frotas do Reino Unido e da Argentina foram colocadas no teatro de operações para a disputa. De um lado, os ingleses planejavam o desembarque anfíbio para retomada das ilhas e do outro, os argentinos pretendiam forçar a desistência dos britânicos infligindo pesadas baixas.
Embora o programa de reaparelhamento da Armada Argentina não estivesse concluído, as corvetas A69 equipadas com mísseis antinavio Exocet MM-38 já haviam sido incorporadas em 1978. Na Aviação Naval, a entrega dos jatos franceses Super Étendard estava sendo finalizada. Os Super Étendard eram armados com o AM-39, versão do Exocet lançada de aeronaves.
A Armada havia incorporado recentemente dois destróieres antiaéreos Tipo 42 de projeto inglês (da mesma classe do HMS Sheffield, que seria atingido no conflito por um AM-39 argentino), também armados com o Exocet MM-38. O míssil também tinha sido instalado em antigos destróieres recebidos usados da Marinha dos EUA (USN).
No dia 2 de maio de 1982, a Frota Britânica enviada pelo Reino Unido para recuperar as Falklands (invadidas por forças argentinas em 2 de abril), já havia entrado na Zona de Exclusão (imposta à Argentina pelo Reino Unido) de 200 milhas em torno das ilhas. A FT estava em algum ponto a nordeste das Malvinas (ver mapa abaixo).
Às 3h20 da manhã, o almirante Woodward, comandante da FT britânica, foi despertado por seu “staff” com o aviso de que um avião S-2 Tracker argentino tinha iluminado a frota inglesa com o radar de busca e que os inimigos agora sabiam sua posição.
Um jato Sea Harrier foi despachado para a marcação do contato, a fim de investigar. O piloto da aeronave mais tarde informou que, durante o voo, seu RWR (Receptor de Alerta Radar) registrou que seu caça foi iluminado por um radar de direção de tiro, Tipo 909, que equipava os destróieres Tipo 42 argentinos.
Os Grumman S-2 Tracker do Grupo Aéreo do ARA 25 de Mayo conseguiram localizar os porta-aviões ingleses nos dias 1º e 2 de maio de 1982
Desta forma, confirmou-se que a cerca de 200 milhas de distância da FT britânica estavam presentes o porta-aviões argentino ARA 25 de Mayo e suas escoltas Tipo 42, o Santísima Trinidad e o Hércules. O almirante Woodward sabia que o porta-aviões 25 de Mayo levava 10 jatos Skyhawk capazes de atacar com 3 bombas de 500kg cada, o que significava um possível ataque de 30 bombas à FT britânica, logo após o amanhecer. E ainda havia o temor de que os jatos Super Étendard também pudessem decolar do 25 de Mayo, armados com Exocets.
Capitânia da Armada Argentina, o ARA 25 de Mayo era equipado com jatos A-4Q Skyhawk e estava sendo preparado para operar jatos franceses Super Étendard. Com problemas na propulsão, o navio não conseguiu gerar vento relativo suficiente no convoo para lançar seus aviões no momento decisivo
Para piorar a situação, a 200 milhas ao sul das Malvinas estavam à espreita o cruzador ARA General Belgrano e duas escoltas, que poderiam chegar em poucas horas à distância de tiro de seus Exocet contra a FT britânica.
O Almirante Britânico concluiu que o 25 de Mayo e o General Belgrano estavam fazendo um movimento em pinça e que um dos dois precisava ser eliminado. O submarino nuclear HMS Conqueror, comandado por Christopher Wreford-Brown, estava acompanhando o cruzador argentino de perto há dois dias. Já outro submarino britânico, o HMS Spartan, ainda não tinha encontrado o 25 de Mayo. Como a posição do navio-aeródromo argentino não era conhecida, o cruzador foi o alvo escolhido.
O Conqueror descobriu um navio-tanque argentino e o acompanhou até o ponto de encontro com o General Belgrano, chegando a assistir à operação de reabastecimento. As ROE (Regras de Engajamento) não permitiam ao submarino britânico disparar contra o cruzador argentino naquele momento, pois o mesmo se encontrava fora da Zona de Exclusão imposta pelos próprios ingleses.
O almirante Woodward precisava pedir ao Comandante-em-Chefe na Inglaterra para alterar as ROE e ordenar ao Conqueror que atacasse o General Belgrano imediatamente. Mas o pedido enviado à Inglaterra por satélite iria demorar muito, o que poderia fazer com que o submarino perdesse contato com seu alvo.
Assim, Woodward ordenou o ataque enviando a seguinte mensagem ao submarino: “From CTG (Commander Task Group) 317.8 to Conqueror, text prority flash – attack Belgrano group.” Ao mesmo tempo, solicitou permissão da revisão da ROE, esperando que ela fosse atendida, pela emergência da situação.
O destróier ARA Hipólito Bourchard era um dos navios veteranos da Segunda Guerra Mundial, transferidos da US Navy, que escoltavam o cruzador ARA General Belgrano quando foi atacado. Na foto, pode-se ver à meia-nau os contêineres de mísseis antinavio MM-38 Exocet, que ofereciam perigo aos navios ingleses
O Grupo-Tarefa (GT) do General Belgrano estava navegando a 13 nós, acompanhado pelo Conqueror, que fazia perseguição padrão “sprint-and-drift”, que consiste em navegar em grande profundidade a 18 nós por 15 ou 20 minutos, subindo depois para a cota periscópica, navegando a 5 nós, a fim de atualizar a posição do alvo pelo oficial de controle de tiro. Depois, a perseguição recomeçava.
O temor de Woodward e do comandante do submarino era o cruzador rumar para o banco Burdwood, uma elevação no fundo do mar que obrigaria o submarino a navegar numa profundidade menor e perder o contato com seu alvo. Por isso a pressa em tomar logo a iniciativa de atacá-lo, enquanto havia contato.
Às 08h10 do dia 2 de maio, o GT do General Belgrano mudou de curso, agora rumando para o continente. Às 13h30, o Conqueror recebeu o sinal de mudança de ROE vindo da Inglaterra.
O Comandante do submarino, Christopher Wreford-Brown, comentou mais tarde suas impressões sobre a navegação tática do cruzador:
“O comandante do navio, capitão Hector Bonzo, parecia não estar nem um pouco preocupado em ser alvo naquele momento”. O cruzador navegava a 13 nós, com sua escolta de destróieres mais à frente, num leve ziguezague. O comandante do navio argentino não era submarinista e parecia conhecer pouco de submarinos, principalmente os nucleares. Se conhecesse, estaria navegando em velocidade bem mais alta, com os navios-escolta lado a lado protegendo seu costado e fazendo um ziguezague mais agressivo, para evitar possíveis torpedos. Para completar, os escoltas do General Belgrano estavam navegando com os sonares ativos desligados.”
Às18h30, o HMS Conqueror aproximou-se do General Belgrano em alta velocidade por bombordo, passando por baixo de seu alvo e subindo para a cota periscópica por boreste, a fim de conseguir uma boa solução de tiro.
O comandante Christopher já tinha se decidido em usar velhos torpedos de tiro reto Mk.8 da Segunda Guerra Mundial, pois levavam maior carga explosiva e eram mais confiáveis que os novos Tigerfish Mk.24, guiados a fio. Por precaução, os tubos estavam carregados com 3 torpedos Mk.8 e 3 Mk.24. Os torpedos foram disparados à proa do cruzador, para que encontrassem o navio numa posição futura.
HMS Conqueror navegando na superfície acompanhado da HMS Penelope
Segundo o comandante do Conqueror, os disparos dos torpedos foram feitos à “queima-roupa”, numa distância de 1.380 jardas (1.255m), com os operadores de sonar do submarino ouvindo bem alto o característico som dos hélices do cruzador, algo parecido com “Chuff-chuff-chuff… chuff-chuff-chuff…”.
Após 55 segundos do disparo inicial, o primeiro torpedo explodiu na proa do cruzador, no ponto após a âncora e antes da primeira torreta. A proa foi arrancada pela explosão, sendo vista pelo periscópio pelo comandante Christopher, que ficou abismado. Logo veio a explosão do segundo torpedo, que atingiu o navio próximo à sua superestrutura.
O terceiro torpedo acabou errando o cruzador e explodiu, por acionamento da espoleta de proximidade, perto da popa do destróier argentino ARA Bouchard, sem maiores danos. Vinte minutos depois do ataque, o comandante do General Belgrano ordenou à tripulação o abandono do navio, o que foi feito sem pânico, em balsas salva-vidas infláveis.
Como estava escuro, os escoltas do cruzador não sabiam ainda o que havia acontecido, pois este ficou sem rádio após o ataque. Quando perceberam o ocorrido, tentaram inutilmente o lançamento de cargas de profundidade.
O submarino nuclear HMS Conqueror ao retornar à Inglaterra hasteou a bandeira “Jolly Roger” comemorando o afundamento do cruzador Belgrano