NPa ‘Macau’ – O litoral do Nordeste sob a proteção de um Cavaleiro
Ícaro Luiz Gomes
Na sexta-feira, 31 de maio de 2013, às 10 horas, no pier da Base Naval de Natal, ocorreu a Cerimônia de Transferência ao Setor Operativo do Navio-Patrulha(NPa) Macau. O navio pertence à classe “Macaé” que é uma derivação do projeto Vigilante 400 CL54 do estaleiro francês Constructions Mécaniques de Normandie (CMN), adaptada e construída no país, para atender às necessidades da Marinha do Brasil relativas às missões de Busca e Salvamento e da Patrulha Naval nas Águas Jurisdicionais Brasileiras. A classe “Macaé” é fruto de um estudo realizado em 2005, o mesmo demonstrou a necessidade de um novo vetor para realizar as missões de Patrulha Naval, Inspeção Naval e Salvaguarda da Vida Humana no Mar em proveito da segurança da navegação e da defesa da Amazônia Azul, em particular da Zona Econômica Exclusiva.
Um estudo do mercado internacional de NPa, associado ao cenário político levaram a escolha do projeto francês supracitado. O mesmo foi adquirido e adaptado no Brasil, com o apoio da CMN, licitou-se as primeiras duas unidades que foram construídas pelo estaleiro Industria Naval do Ceara (INACE). A primeira unidade da classe foi o NPa Macaé, que já se encontra subordinado ao Com1ºDN, e a segunda unidade o NPa Macau. O NPa Macau começou a ser produzido em 2007, sendo entregue à Marinha em 2010. Outras cinco unidades encontram-se em construção pelo Estaleiro Ilha SA (EISA) no Rio de Janeiro. Os estudos para a licitação de outros 20 NPa da classe “Macaé” financiados pelo BNDES se encontram a cargo da Emgepron, todos a serem construídos em estaleiros nacionais.
O NPa Macau possui 500t de deslocamento máximo; 55,6 m de comprimento; 8 m de boca e 2,5m de calado. Sua propulsão fica a cargo de dois MCP diesel MTU 16V 4000 M 90, gerando uma velocidade máxima mantida de 21 nós e velocidade de patrulha de 15 nós. Sua autonomia nominal é de 2500 mn à 15 nós ou 10 dias, para uma tripulação de 35 homens (5 oficiais, 8 SO/SG e 22 CB/MN). Seus sensores principais são o Sistema de Navegação Sperry Marine Vision-Master, o radar Sperry Marine Vison Master FT-250, Sistema de Controle e Monitoração (SCM) e Terminal Tático Inteligente (TTI-2900), os dois últimos projetados pelo IPqM. Seu armamento fica por conta de um canhão 40mmL70 (AOS) e duas metralhadoras GAM-B01 20mm. Possui área a proa para realizar operações aéreas com cargas e pessoal, mas sem convoo ou capacidade de HIFR.
A Cerimônia de Transferência ao Setor Operativo do NPa Macau contou a presença do Diretor-Geral de Material da Marinha, Ex.Sr. Alm.Esq. Pires Ramos; do Comandante de Operações Navais, Ex. Sr. Alm.Esq. Palmer; Comandante do 3º Distrito Naval, Ex.Sr. VAlm. Gambôa; Ex. Sr. Gen.Bda. Ignacio, Comandante da 7ª Brigada de Infantaria Motorizada; Ex. Sr. Brig. Borba, Comandante da I Força Aérea; Consul Honorário do Peru em Recife; do CMG Juan Carlos Romaní Seminario, da Marinha de Guerra do Peru e comandante da Fragata Villavisencio; CMG Marco Lucio, Comandante do 1º Esquadrão de Escolta; e outras autoridades militares e civis, com destaque ao Vice-Prefeito da cidade de Macau, Sr. Einstein Barbosa. Por ocasião da realização do exercício BRAPER, a época, na fase do Porto de Natal, uma comitiva da Marinha de Guerra do Peru se fez presente a cerimônia, o que gerou inclusive um “causo”.
A cerimônia foi rápida, devido às dimensões do meio e a lotação de convidados, no entanto a mesma é cheia de significado. Durante a confraternização, um dos oficiais de uma das forças-irmãs indagou “mui cordialmente” um outro oficial da Marinha sobre o porquê da realização de uma cerimônia para marcar transferência do meio para o setor operativo, tendo em vista, que na força daquele país não há cerimônia específica que marque o evento em questão. A resposta veio no mesmo tom, o oficial da Marinha alegou a manutenção de tradições seculares, argumentou ainda o tempo de construção de um meio naval e, por fim, a complexidade de coordenar a integração homem-máquina da tripulação e dos sistemas do meio que muitas vezes trazem avanços tecnológicos muito significativos. Outro motivo que pode ter chamado a atenção daquele oficial seria a disparidade de meios operativos nas mãos de cada força-irmã, na daquele se fala em dúzias, às vezes centenas, e na marinha em unidades, às vezes dezenas.
Após a confraternização, as mais altas autoridades foram conduzidas em um tour pelo navio e assinaram o livro do navio. As dimensões do navio ante a quantidade de autoridades que realizavam o tour desencorajaram o autor a acompanhar, mas o convite para uma posterior visita foi realizado, aceito e será realizado em momento oportuno já em gestação.
O NPa Macau é comandado pelo Capitão-de-Corveta Ricardo Simonaio Morata, paulista, em seu primeiro comando. Questionado sobre o que significava para ele ser o atual comandante do meio, em especial, no momento em que o mesmo é transferido ao setor operativo o CC Morata respondeu: “É um sentimento de orgulho muito grande, e prazer em comandar um navio que vinha sendo construído por duas gerações.” Quando indagado pela imprensa local sobre a importância do meio sob o seu comando em prol das atividades da marinha na região o CC Morata respondeu: “Vamos preservar riquezas e patrulhar uma área que tem muitas pequenas embarcações de pescadores. Temos uma obrigação em proteger a vida humana, por isso, qualquer pedido de socorro no mar é com a Marinha, é nossa responsabilidade.”
Durante a confraternização, o Almirante-de-Esquadra Arthur Pires Ramos disponibilizou-se para responder algumas perguntas. A primeira pergunta foi sobre o andamento das negociações do financiamento junto ao BNDES de outros 20 NPa 500, o Almirante respondeu nos seguintes termos: “No momento, os estudos acerca da viabilidade técnica e jurídica se encontram a cargo da EMGEPRON, posteriormente, serão revisados pela Marinha e será lançada a licitação, adianto que esses estudos se encontram em fases bem avançadas.” Sobre a construção dos meios em estaleiros nacionais ou estrangeiros ou de forma combinada, a resposta foi: “A construção é planejada para ser feita toda em estaleiros nacionais, sem que haja a construção em estaleiros estrangeiros.” Sobre a participação do AMRJ na construção dos NPa 500 o almirante respondeu: “Ainda não decidimos, atualmente o AMRJ está voltado a manutenção dos meios da esquadra.” Aproveitando a oportunidade perguntou-se ainda sobre as CCI, muito cordialmente o almirante respondeu: “Os problemas mais graves foram sanados e os outros seguem dentro do cronograma da cadeia logística, dentro de poucos meses teremos meios da classe navegando.”
Conclusão
Para o autor, a transferência do meio para o setor operativo demonstra, na prática, a renovação da MB, não só em discursos e planos como alguns dos entusiastas mais céticos. Para aqueles que criticam o investimento realizado em NPa novos, enquanto o núcleo da Esquadra passa por modernizações e revitalizações – com exceção da construção da Corveta Barroso – devemos atentar para a revolução que os NPa 500 representam não só para a Patrulha, mas a MB como um todo. Primeiramente a envergadura do projeta contempla aos menos 27 unidades, podendo chegar a casa de 50 unidades. Em segundo, representou a retomada de encomendas seriadas de meios navais a estaleiros privados, dentro da perspectiva de renascer a Industria Naval. Terceiro, a tentativa de financiamento junto ao BNDES para a aquisição de meios. Quarto, atentemos ao aumento da automação, modernização e raio de ação da patrulha naval, que se traduz na quantidade de pessoal em um meio com mais que o dobro de tonelagem, quando se compara com a classe que complementa e no futuro substituirá.
Alguns pontos do projeto, inicialmente, causaram dores de cabeça, mas segundo informações foram superados. Em testes de mar grosso, esses primeiros navios da classe apresentaram o comportamento de entrar água pela proa, gerando alguns danos nos mecanismos do canhão. Outro ponto levantado em minha breve experiencia na visita e por um outro oficial, é quantidade de “obstáculos” (pitocos) no navio, não só na proa como alguns também popa.
O NPa Macau homenageia a cidade de Macau, no litoral potiguar, famosa por suas salinas e pela produção de petróleo. Em suas salinas brancas, a figura de um cata-vento(corta-vento), utilizado para bombear a água do mar para sua utilização na produção salineira, quebra a monotonia da paisagem. Como referencia a cidade de Macau e as salinas da mesma, traz em sua heráldica a figura de um cata-vento. Na literatura mundial, a obra de Miguel de Cervantes é sempre lembrada pela figura de Dom Quixote, um cavaleiro que traz consigo mais puro sentimento e ímpeto de cumprir seu dever, sendo por mais conhecida suas batalhas contra cata-ventos e a companhia de seu escudeiro Sancho Pança. Ao juntar esses dois elementos, o cata-vento e a obra de Cervantes, o NPa Macau possui em Dom Quixote e seu escudeiro Sancho Pança como mascotes e adornam a praça d’armas em imagens e estatuetas.