MPF-RJ pede suspensão de concurso para praticante de prático
Promotor pede anulação da última fase da seleção para 206 vagas. MPF alega quebra de sigilo do conteúdo das provas prático-orais.
Do G1, em São Paulo
O Ministério Público Federal (MPF) no Rio de Janeiro enviou recomendação à Diretoria de Portos e Costas (DPC) da Marinha para anulação da última fase do processo seletivo para 206 vagas de praticante de prático, que foi retomada a partir do dia 30 de setembro. O MPF quer também a suspensão do concurso até que se conclua a sindicância instaurada e que se conheça a fonte de supostos vazamentos de questões. O prático é responsável pelas manobras de navios em trechos próximos a costas, baías e portos. O G1 entrou em contato com a Diretoria de Portos e Costas (DPC) da Marinha e aguarda resposta.
Alegando quebra de sigilo do conteúdo das provas prático-orais aplicadas, o MPF recomenda a elaboração de novos ambientes de simulação e fainas (conjunto de ações e manobras) aplicadas aos candidatos, além da adoção de medidas que preservem o sigilo das provas e da punição dos responsáveis pelos vazamentos já ocorridos ou que venham a ocorrer.
A recomendação, expedida pelo procurador da República Gustavo Magno Albuquerque, também busca a divulgação dos nomes dos integrantes da banca examinadora, a verificação de eventuais impedimentos dos examinadores para avaliação de candidatos com os quais possam ter relações pessoais e profissionais e a publicidade na aplicação das provas prático-orais.
O MPF recomenda ainda a adoção de medidas para preservar o equilíbrio entre os candidatos que prestem novas provas prático-orais nos primeiros e nos últimos dias de aplicação, a divulgação em atas das notas atribuídas a cada candidato em relação a cada quesito, a instituição de “quarentena” para os integrantes de bancas examinadoras e a reavaliação do gabarito de questões da prova escrita anuladas em decisões judiciais.
O MPF informa que recebeu denúncia de que os candidatos da prova prático-oral do concurso já teriam conhecimento da manobra que seria exigida a cada dia de exame, após a publicação delas em anúncio de classificados e em um site da internet. Segundo o MPF, poucas horas após o comparecimento do procurador da República Gustavo Magno Albuquerque ao local das provas para apurar as denúncias, em 3 de setembro, o diretor de Portos e Costas da Marinha publicou edital em que anulou todas as provas prático-orais até então realizadas e suspendeu a realização das provas restantes. Alguns dias depois, no entanto, a DPC publicou outro edital, em que determinou a retomada do concurso, com reinício das provas em 30 de setembro. O mesmo edital prevê que seriam aplicadas as mesmas 17 provas já realizadas. O MPF também apurou uma intensa troca de mensagens entre os candidatos com detalhes das manobras incluídas em cada um dos 17 modelos de prova, o que compromete o sigilo do conteúdo das provas.
Cancelamento e retomada
No começo de setembro, a Diretoria de Portos e Costas (DPC) da Marinha comunicou o cancelamento das provas prático-orais e que havia aberto procedimento para apurar dados que comprometiam o objetivo da prova prático-oral, que é o de avaliar a capacidade do candidato em realizar uma faina de praticagem (conjunto de ações e manobras realizadas durante a prestação do serviço e praticagem), sem qualquer conhecimento prévio. A decisão havia sido tomada após denúncias de irregularidades e supostos favorecimentos na prova. A etapa, no entanto, foi retomada em 30 de setembro. E o calendário de provas vai até 12 de dezembro – clique aqui para ver.
O processo seletivo tem o objetivo de habilitar praticantes de prático. Depois de passar na seleção, os praticantes fazem um treinamento denominado Programa de Qualificação do Praticante de Prático, com duração mínima de 12 meses e máxima de 15 meses. Segue-se então o exame de habilitação conduzido pela Capitania dos Portos. Com a aprovação nesse exame, o praticante é certificado como prático, que exerce atividade privada, individualmente, em sociedade ou contratado por empresa de praticagem. A remuneração é variável e pode chegar a R$ 130 mil mensais, caso o porto seja bastante movimentado. O prático assessora os comandantes de navios nacionais e estrangeiros, sendo responsável pelas manobras realizadas em portos brasileiros. Além de curso de nível superior, o candidato precisa ser aquaviário da seção de convés ou de máquinas, prático ou praticante de prático; ou, alternativamente, pertencer ao grupo de amadores, no mínimo na categoria de mestre-amador.
A Marinha esclarece que o processo seletivo à Categoria de Praticante de Prático (PSCPP) não é concurso público, pois não se destina ao provimento de cargo ou emprego público. Os práticos exercem atividade privada, sendo remunerados pelos tomadores de seus serviços. O praticante de prático é uma categoria dos aquaviários, conforme previsto no Decreto nº 2.596, de 18/05/1998, o qual regulamenta a Lei nº 9537/1997 (Lei de Segurança do Tráfego Aquaviário – Lesta).
No concurso, cujo edital foi lançado em novembro do ano passado, inscreveram-se 2.141 candidatos, e à prova escrita realizada em 5 de janeiro compareceram 1.834 candidatos, segundo a Marinha. A divulgação do resultado da prova escrita foi em 22 de fevereiro, concluindo, assim, a primeira etapa do concurso. Já a segunda etapa contou com 250 candidatos melhor classificados na 1ª etapa, que englobou apresentação de documentos, seleção psicofísica e teste de suficiência física (provas de barra, natação e permanência na água). A terceira etapa englobou a prova de títulos, e a quarta e última etapa, a prova prático-oral.
Denúncias sobre a prova
Candidatos informaram ao G1 que enviaram denúncias à comissão organizadora do concurso e ao Ministério Público Federal sobre suposto privilégio nas informações sobre as datas do concurso, ausência de atas e irregularidades na designação da bancada examinadora do concurso.
Candidatos dizem que houve vazamento no conteúdo da prova prática-oral, privilegiando alguns candidatos em detrimento de outros. Segundo eles, houve um sorteio de 51 envelopes no início de junho, para definir a numeração do envelope contendo a prova que seria a primeira a ser aplicada no dia 18 de junho. O envelope sorteado foi o de número 26, sendo que as datas subsequentes obedeceram à numeração consecutiva até o último envelope, de número 25, correspondendo à prova a ser aplicada em 6 de setembro. Cada prova contém manobras de navios e situações diferentes a serem cumpridas. Alguns candidatos teriam percebido que não havia 51 provas diferentes como esperado e sim apenas 17. Além disso, as provas não foram embaralhadas para se tornarem aleatórias.
Assim, as 17 primeiras provas foram aplicadas e depois repetidas a partir da 18º na mesma ordem. Isso teria permitido a descoberta de um ciclo previsível e quem percebeu o que estava acontecendo estudou e praticou a manobra que seria aplicada na sua data. Por outro lado, o candidato que ignorou tal fato foi obrigado a estudar inúmeras manobras diferentes, não sabendo qual manobra efetivamente teria de cumprir, o que seria o correto e o esperado para todos os candidatos. Como isso não ocorreu, os candidatos alegam quebra de isonomia. Eles pedem que a nova prova não tenha “as mesmas falhas”.
Outras polêmicas
Em abril, decisão da 4ª Vara Federal da Seção Judiciária do Rio Grande do Norte havia determinado a suspensão do processo seletivo, acatando pedido do Ministério Público Federal que questionava a necessidade de comprovação da habilitação de aquaviário da seção de convés ou de máquinas e de nível igual ou superior a quatro, prático ou praticamente de prático, bem como de mestre-amardor, em datas distintas. A decisão foi derrubada depois de duas semanas.
Em março, leitores enviaram e-mails ao G1 questionando o conteúdo da prova. Os candidatos informaram que foram enviados cerca de 1.300 recursos questionando a prova e que nenhum foi atendido. A Diretoria de Portos e Costas (DPC) da Marinha informou que não pretendia alterar os gabaritos da prova escrita do processo seletivo para praticante de prático, realizada em janeiro deste ano.
FONTE: G1