Pré-sal vai da euforia à realidade
Quando campos de petróleo representando bilhões de barris foram descobertos na costa brasileira, autoridades do governo disseram que o achado transformaria o País num importante ator na área energética. Mais de seis anos depois, a perspectiva para o setor petrolífero brasileiro, como a própria economia, é mais moderada. A produção de óleo está estagnada, a Petrobrás está repleta de dívidas e as empresas de petróleo estrangeiras estão cautelosas quanto a investir no Brasil.
“Engraçado, há poucos anos todos adoravam o Brasil”, diz Roger Tissot, consultor veterano do setor energético latino-americano. “Agora parece que a paixão acabou.”
O Brasil antes se via como uma potência emergente na área petrolífera que iria suprir a demanda mundial, mas agora se depara com uma dura realidade e poderá ter de reduzir suas expectativas, afirmam antigas autoridades brasileiras, executivos e analistas do setor.
A enorme abundância encontrada no fundo do mar repentinamente ficou menos atrativa para as empresas petrolíferas. Outras fontes de energia promissoras emergiram em todo o mundo, incluindo campos na África, areias de betume no Canadá e os depósitos de gás de xisto. “Essas companhias têm vigor financeiro, capacidade de engenharia e tecnologias para se mover por todo o mundo”, diz Ramón Espinasa, especialista da área no Banco de Desenvolvimento Interamericano, em Washington. “Elas podem escolher e isso explica por que não estão no Brasil.”
Para alguns especialistas do setor, os estrategistas brasileiros da área energética que se referiram a reservas não confirmadas que concorreriam com as das maiores potências petrolíferas podem ter exagerado sobre o “pré-sal”. “Autoridades de governo afirmaram que as reservas brasileiras eram equivalentes a 50 bilhões de barris, 100 bilhões e até 240 bilhões, mais do que na Arábia Saudita”, disse Wagner Freire, geólogo que trabalhou 35 anos na Petrobrás, onde supervisionou a exploração e produção do bruto. “Muitos poços perfurados na área do pré-sal estavam secos.”
Quando das descobertas em 2007, Lula disse que o “Brasil ganhou na loteria”. A Petrobrás era uma das dez maiores companhias do mundo, admirada por investidores como George Soros e se tornou a predileta de Wall Street.
Funcionários da Petrobrás conceberam um plano que daria ao Brasil status de elite entre os produtores de energia do mundo, com a produção subindo de 2 milhões de barris por dia para 5,3 milhões em 2020, segundo o presidente da empresa na época, José Sergio Gabrielli.
As projeções hoje são mais limitadas, mas ainda ambiciosas: 4,7 milhões de barris diários dentro de uma década, de acordo com o ministro Edison Lobão. “Considerando que nessa ocasião nosso consumo será de 3,1 milhões de barris por dia, estaremos exportando em torno de 1,6 milhões de barris diários de petróleo”. Será o volume total de petróleo exportado pela Venezuela, país membro fundador da Organização dos Países Exportadores de Petróleo.
Encargos pesados. Segundo alguns especialistas, a previsão é irrealisticamente otimista. “Esqueça esses dados”, afirmou o executivo de uma instituição financeira internacional que discutiu a questão com autoridades brasileiras da área energética e assessora empresas de petróleo. De acordo com ele, o Brasil não encontra novas bacias desde 2008 e enfrenta o desafio avassalador de desenvolver a área do pré-sal que terá um custo de US$ 237 bilhões. “As pessoas dizem que a Petrobrás não tem capacidade para administrar isso”, disse, referindo-se ao que é considerado o projeto de investimento corporativo mais caro do mundo.
Para ressuscitar o setor da construção naval, a Petrobrás e empresas parceiras precisam usar as plataformas de petróleo e outros equipamentos pesados fabricados no Brasil – resultando em gastos extraordinários e escassez de equipamentos.
A exigência é que a Petrobrás seja a operadora líder e tenha uma participação mínima de 30% em qualquer dos novos campos de pré-sal, o que implica enormes responsabilidades financeiras para a empresa e ao mesmo tempo afasta potenciais parceiros estrangeiros. A companhia também é forçada a importar gasolina a preços abaixo do mercado – política que tem por fim combater a inflação e representou um custo para a empresa de US$ 20 bilhões desde 2008.
“A perda de receita que o governo impõe à Petrobrás obriga a companhia a assumir mais dívidas”, diz Adriano Pires, ex-assessor da Agência Nacional do Petróleo (ANP). “O governo usa a Petrobrás para seus objetivos eleitorais e econômicos”.
A empresa responde a isso vendendo ativos no Peru, Colômbia, África e Golfo do México. E adiou o desenvolvimento de outros campos potencialmente lucrativos, como os depósitos de Sergipe, cuja projeção é render 1 bilhão de barris de petróleo.
De acordo com a presidente da Petrobrás, Maria das Graças Silva Foster, a situação financeira a curto prazo “é tranquila”, com US$ 58 bilhões em caixa. Afirmou também que a diretoria da Petrobrás “está vigilante quanto às dívidas e vem trabalhando para tornar a geração de recursos mais previsível e reduzir o endividamento da companhia”.
Mas cada vez mais os mercados financeiros consideram a Petrobrás uma empresa muito sobrecarregada. O valor das suas ações despencou, parte de uma tendência que dura dois anos em que a Petrobrás perdeu um terço do seu valor.
(Tradução de Terezinha Martino)
FONTE: O Estado de S. Paulo