Novo comandante receberá a Marinha sob o signo da escassez

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Roberto Lopes

Exclusivo para o Poder Naval

A conta não fecha. Na Esquadra já se comenta que faltam sobressalentes para os motores diesel dos submarinos classe “Tupi”. Como administrar essa escassez e ainda assumir os gastos da modernização prevista para o porta-aviões “São Paulo”? (Isso tudo em um ano em que o novo ministro da Fazenda, Joaquim Levy, promete “estancar” e “reduzir” despesas previstas no Orçamento-Geral da União para 2015…)

Administrar a Marinha do Brasil no ano que se inicia não será fácil. E essa conclusão, um tanto óbvia, certamente compõe o raciocínio dos oficiais que aparecem como os principais candidatos a suceder o atual comandante, almirante de esquadra Moura Neto: o chefe do Estado-Maior da Armada, almirante Barbosa Guerra, o comandante da Escola Superior de Guerra, almirante Leal Ferreira, e o diretor-geral de Pessoal da Marinha, almirante Elis Treidler Öberg – que passou a fazer parte dessa lista nas últimas semanas, diante de um discreto acirramento, nos bastidores, da guerra de argumentos entre os defensores do nome de Barbosa Guerra e os adeptos de Leal Ferreira.

Os dois lados se prepararam para a refrega.

O Almirante-de-Esquadra Wilson Barbosa Guerra

Barbosa Guerra (na foto acima) é o mais antigo dos três – uma turma acima de Leal Ferreira e Öberg – e, portanto, o nome da predileção do almirante Moura Neto, que está convencido de que sua sucessão deve se dar pelo critério da antiguidade. Se o atual comandante da Marinha for chamado a contribuir com a escolha, Barbosa Guerra já pode se considerar no comando da Força Naval brasileira.

Leal Ferreira entrou, ao que parece, um tanto tardiamente na disputa.

Ele foi promovido a quatro estrelas em março de 2013, mas em abril, em vez de assumir a chefia do Pessoal da Marinha (conforme se esperava), foi mandado dirigir a Escola Superior de Guerra (ESG), no Rio de Janeiro. Isso o afastou da rotina administrativa da Força, mas, curiosamente, o aproximou do então ministro da Defesa, Celso Amorim – que, estando na Cidade Maravilhosa, despacha em um gabinete dentro da ESG.

Leal Ferreira e Celso Amorim estreitaram, portanto a amizade. Se Amorim for convidado a opinar sobre a mudança de comando na Marinha, talvez o nome de Leal Ferreira possa ser ventilado com mais força.

Öberg parece ser, nesse momento, a terceira via – o tertius –, ou a solução de conciliação – mas, por ora, tem poucas chances.

NAe São Paulo A12

“São Paulo” – Seja quem for o escolhido (a decisão deve sair nas próximas horas, ou dias), o prêmio é uma honra imensa, quase tão grande quanto o desafio.

Na palestra que fez para seus colegas da reserva, no dia 8 de dezembro passado, na Escola Naval, Moura Neto falou com determinação e entusiasmo sobre a modernização do navio-aeródromo “São Paulo”, que deve incluir a instalação de um grupo propulsor a diesel no navio, além de outras melhorias em sistemas internos, como o de geração e distribuição de energia. O comandante apresentou o projeto como assunto decidido, e para o qual não cabem mais contestações.

Mas para alguns oficiais-generais da ativa da Marinha, tudo ainda dependerá da disponibilidade financeira. Poucos acreditam que se possa fazer uma reforma dessa magnitude com os US$ 400 milhões ou US$ 450 milhões que foram previstos pela Marinha em parceria com o grupo empresarial francês DCNS – estimativa que circula apenas nos bastidores, porque o gabinete do Comandante da Força mantém silêncio rádio acerca de custos…

Oficiais de áreas afetas à Engenharia, máquinas de propulsão e outros setores técnicos, calculam, entretanto, que um serviço do porte que está sendo planejado para o navio-aeródromo não sairá por menos que US$ 500 milhões ou US$ 600 milhões. Há números, portanto, para todos os gostos. E também para todos os bolsos, o que não chega a ser um problema já que todos eles se encontram na mesma situação: quase vazios.

A preocupação é como manter a Esquadra em funcionamento em um contexto de perspectivas reais de cortes orçamentários severos, e ainda gerar outros dispêndios importantes – que podem agravar as dificuldades atuais com suprimentos.

Essa dor de cabeça do “cobertor curto” também tem reflexos na possível incorporação, pela MB, do navio de assalto anfíbio francês “Siroco” – uma operação que entusiasma a vários oficiais da Armada, da Força Aeronaval e do Corpo de Fuzileiros. Em 2011, o “Foudre”, irmão gêmeo desse barco, custou US$ 80 milhões à Marinha do Chile. Mesmo que o “Siroco” saia por esse valor, ou até um pouco menos, será necessário verificar o quanto a embarcação ainda requer de reparos (gastos!).

AMRJ na década de 1980

Arsenal – O próximo comandante da Marinha precisará enfrentar outras circunstâncias delicadas. E uma delas diz respeito à falta de estaleiros para a construção de navios militares no Brasil. Questão que constitui problema não apenas para o reforço da frota nacional, mas também para atender o interesse de marinhas estrangeiras, como a de Angola, que prevê incorporar sete navios-patrulha costeiros classe “Macaé” – os quatro primeiros fabricados no Brasil.

A Emgepron (Empresa Gerencial de Projetos Navais), empresa pública vinculada à Marinha, a quem cabe a responsabilidade de viabilizar o projeto para os angolanos está (como sempre) muda.

E o mais importante é que as novidades não param de surgir. A mais recente anuncia que também os almirantes uruguaios selecionaram a “Macaé” (foto abaixo) como uma embarcação que se encaixa nos propósitos de renovação da frota Oriental. A Marinha uruguaia calcula que precisaria de três barcos com o deslocamento de 500 toneladas para fazer a vigilância e fiscalização em suas águas territoriais. Se o governo de Montevidéu optar pela classe “Macaé”, onde os navios serão construídos (e em que prazos)?

Navio-Patrulha Macaé

É preciso lembrar que tudo isso acontece no momento em que a Base Industrial de Defesa brasileira sofre o assédio da concorrência em pleno território sul-americano. A Korea Aerospace Industries já disputa mercados tradicionalmente explorados pela Embraer no Paraguai e no Peru, e as indústrias navais da China e da Coreia do Sul oferecem modelos de lanchas e de navios-patrulha na Argentina, Uruguai, Peru e Colômbia.

No caso da construção naval no Brasil, diante da inexistência de um estaleiro destinado a projetos militares, do excesso de encomendas nos estaleiros nacionais e dos problemas operacionais de muitos deles, a imagem que primeiro vem à mente é a do venerável Arsenal de Marinha do Rio de Janeiro.

Mas essa é uma alternativa, claro, de possibilidades finitas, incapaz de satisfazer a todas as demandas – e que, ainda por cima, requer modernização (investimento).

Ao Arsenal, que possui rotina própria de reparos e apoio às unidades da Esquadra – e deverá receber o “Siroco” para revisão (caso o barco fique mesmo para o Brasil) –, já estão afetos, por exemplo, o (demorado) trabalho de recuperação das corvetas tipo “Inhaúma”, e a ambiciosa reforma do “São Paulo”. E ele ainda está cotado para dar à MB a sua nova classe de corvetas “Tamandaré”. Ao que parece, o Arsenal permanece também como alternativa para o atendimento do contrato com a Marinha de Angola.

No caso de o PROSUPER receber o sinal verde da Presidência da República, o Arsenal teria, forçosamente, que participar da tarefa de organizar a construção no país das novas fragatas, dos novos navios-patrulha oceânicos e do novo navio de apoio logístico da Marinha. A “sorte” do Arsenal é que, se depender do ministro Joaquim Levy, o PROSUPER não sai tão cedo.

Jaques Wagner

Ministro – E o novo ministro da Defesa, Jaques Wagner, em toda essa problemática?

A escolha do ex-governador da Bahia como superior imediato dos comandantes militares brasileiros não repercutiu de forma desfavorável na Marinha.

Wagner é tido como um político que ajudou a Força Naval na negociação com a população quilombola que reivindicava assentamento em uma área que abriga a Vila Naval e a barragem que abastece a Base Naval de Aratu.

Em maio deste ano, o governo federal ofereceu aos queixosos uma área de 86 hectares ao norte da barragem, bem como seis hectares ao sul da Vila Naval. Wagner ampliou a oferta, disponibilizando mais 12 hectares ao lado do terreno de propriedade da Marinha. No total os quilombolas receberam 104 hectares, e o acordo foi fechado.

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