Prosuper: propostas da Navantia e da indústria alemã reúnem as preferências
“O Prosuper não está de nenhuma forma morto, ele está bem vivo!”
Almirante Moura Neto, comandante da Marinha do Brasil, em entrevista a Felipe Salles. Holanda, julho de 2013
Apesar da falta de notícias oficiais há mais de um ano e meio, a disputa pelo direito de fornecer os 11 navios do Programa de Obtenção de Meios de Superfície (PROSUPER) da Marinha do Brasil – cinco fragatas de 6.000 toneladas, 5 navios-patrulha offshore de 1.800 toneladas e um navio de apoio logístico de 20.000 toneladas – está mesmo viva. E gerando surpresas.
O Poder Naval pode apurar que desde o momento em que as sete principais concorrentes ao contrato encaminharam ao Comando da Marinha uma segunda versão das suas propostas originais (preparadas entre 2012 e 2013), a oferta do grupo espanhol Navantia parece ter assumido certo favoritismo. E, nessa situação, desbancando o conjunto de argumentos e atrativos até ali considerado mais forte, da indústria naval alemã liderada pela Thyssen Krupp Marine System (TKMS).
A robustez do oferecimento alemão, que se destacou no primeiro conjunto de oferecimentos feito ao governo brasileiro, repousava sobre uma somatória de dois fatores: navios militares no estado da arte (produto da cooperação TKMS/Blohm + Voss) e uma vigorosa arquitetura econômica – da qual fazia parte o Deutsche Bank –, garantindo crédito em condições consideradas (aquela época) suportáveis pelo cliente Brasil. O Programa de Obtenção de Meios de Superfície tem um custo estimado entre 6 e 8 bilhões de dólares.
O problema é que a Presidência da República considerou insuficientes essas propostas iniciais – ou concluiu que elas podiam ser melhoradas –, e ainda em 2013 determinou que o Comando da Marinha solicitasse aos competidores uma melhoria das ofertas feitas originalmente.
Foi aí que os espanhóis tiraram a carta da manga. Literalmente.
Garantias – Eles apresentaram aos almirantes brasileiros uma documentação oficial em que o grupo Lockheed Martin, dos Estados Unidos, se compromete a disponibilizar até seis sistemas integrados de armas navais AEGIS, para serem instalados nas fragatas do PROSUPER.
A Navantia sempre insistiu na mensagem de que o AEGIS é, do ponto de vista técnico-operacional, incomparável – constituindo, portanto, a melhor solução para os requerimentos futuros da Marinha. Mas a apresentação das cartas que confirmam o acesso do Brasil ao equipamento da Lockheed turbinaram o oferecimento espanhol, e fizeram com que, entre os chefes navais brasileiros, ele adquirisse novo brilho.
Aparentemente, foi essa ascensão na disputa pelo PROSUPER que levou a matriz da Navantia a alocar uma parcela de seu capital para a criação, em conjunto com a Navantia da Austrália, da Navantia do Brasil – fato amplamente noticiado na última semana de janeiro.
Nesse contexto inédito, a Esquadra brasileira ganharia o status de que já desfrutam, hoje, as frotas militares do Japão, da Coreia do Sul, da Noruega e da Espanha – todas possuidoras de fragatas AEGIS. A Armada australiana selecionou o mesmo equipamento para o programa dos seus novos “destróieres de guerra antiaérea”.
Na América do Sul, apenas uma Armada tem, nesta década, a mesma perspectiva que a brasileira: a da Colômbia, que até 2020 deve definir o projeto vencedor do programa Plataforma Estrategica de Superficie (P.E.S) – ao que se sabe, oito fragatas polivalentes com deslocamento em torno de 5.000 toneladas.
Os documentos da Navantia vão, contudo, além.
Mísseis – Eles garantem que, no caso de a empresa sair vencedora no PROSUPER, à Força Naval brasileira será dada a oportunidade de obter os sistemas de mísseis ESSM (vetores antiaéreos que representam um desenvolvimento do conhecido Sea Sparrow), de médio alcance, e SM-2 (Standard Missile 2) e SM-3 (Standard Missile 3), ambos engenhos de longo alcance.
O ESSM voa a uma velocidade superior a Mach 4, o que lhe permite, em questão de segundos, alcançar alvos navais a 50km de distância – ou um pouco mais (o alcance real é segredo militar).
O SM-2 se desloca a Mach 3.5 e é indicado para alcançar alvos entre 74km e 167km.
Todas essas armas, nem é preciso dizer, estão plenamente operacionais a bordo de navios da Organização do Tratado do Atlântico Norte (Otan) e de aliados preferenciais dos Estados Unidos, como os Emirados Árabes Unidos.
Deficiências – Há problemas, contudo na proposta espanhola para a concorrência do Brasil.
Apesar de oferecerem equipamentos e sistemas de eficiência e modernidade comprovados, as fragatas F-100 da Navantia não atenderiam os requisitos de transferência de tecnologia de radares, de sistemas de combate e de armas que a Marinha brasileira almeja conquistar por meio do seu Programa de Obtenção de Meios de Superfície.
De acordo com o arrazoado da Navantia, a transferência de tecnologia ficaria restrita ao projeto das embarcações e à construção dos navios.
É, contudo, nesse ponto, que entra na disputa do PROSUPER uma outra variável pouco conhecida: o desejo da presidenta Dilma Roussef de fazer um gesto na direção do governo dos Estados Unidos.
Como a proposta da Navantia vem recheada de sistemas e armamentos americanos, dar o PROSUPER à Navantia equivale, de certa forma, a prestigiar a indústria militar dos EUA – atitude que a chefe de Governo do Brasil recusou-se a tomar na parte final de seu primeiro mandato, causando uma frustração (financeira) significativa à gigante americana Boeing.
Segunda mão – É preciso dizer, entretanto, que nem tudo está perdido para os alemães (ou para os demais competidores do PROSUPER).
Até porque, nem mesmo os chefes navais brasileiros têm a certeza absoluta de que, nas atuais circunstâncias de severa crise econômica, o Executivo irá se dispor a assumir um endividamento de mais de 6 bilhões de dólares.
Nos últimos meses, o Comando da Marinha julgou enxergar na postura da presidenta da República em relação ao PROSUPER, a disposição de, pelo menos, apontar um vencedor para o certame.
Não obstante isso, numa situação-limite, de aumento da indisponibilidade dos meios de superfície mais antiquados da Esquadra e de inflexibilidade da área econômica, a saída mais rápida para manter o atendimento às comissões de adestramento e de cooperação internacional seria a aquisição de navios usados, construídas entre o fim dos anos de 1980 e o início da década seguinte.