O futuro da Aviação de Asa Fixa na MB (Parte II/III): duro será esperar o Sea Gripen…
Roberto Lopes
Editor de Opinião da Revista Forças de Defesa
A Força Aérea Brasileira (FAB) lançou as primeiras diretrizes da renovação de sua aviação de caça na metade final dos anos de 1990, mas precisou esperar até dezembro de 2013 – quando já priorizava outros requisitos e modelos de aeronave – para assistir o desfecho do seu minucioso trabalho.
Durante todo esse tempo, analistas civis e militares – brasileiros e estrangeiros – elaboraram diferentes teses acerca dos critérios de maior peso nessa escolha. Afinal, a aeronave selecionada será transformada, entre o início dos anos de 2020 e as quatro (ou cinco) décadas seguintes, na espinha dorsal das unidades de combate da Aeronáutica.
Somente a partir de 2010 (ou um pouquinho antes) é que começou a se falar, de forma mais intensa, sobre a conveniência (e, mais do que isso, a necessidade) de o modelo de caça do programa FX-2 servir, igualmente, à modernização da Aviação de Asa Fixa da Marinha – e, no entanto, tal condicionante preocupava bastante tanto os oficiais que serviam no Ministério da Defesa quanto os planejadores da Força Naval.
História pouco contada, mas que o Poder Naval traz à luz neste artigo, é que, por pouco, não se escolheu uma aeronave que impunha limitações à Aviação Embarcada do Brasil.
Tivesse o governo Dilma Roussef confirmado a sua tendência de comprar 36 caças modelo Boeing F/A-18E/F Super Hornet – que na sua versão naval deve ter a ajuda do grupo propulsor de um porta-aviões de boa velocidade para fazer as suas quase 30 toneladas alçarem voo –, e o navio-aeródromo brasileiro São Paulo (A12) estaria com os dias, praticamente, contados.
Restrições – Em razão de suas dimensões e peso, o Super Hornet dificilmente poderia operar no A12.
Para decolar do convoo do navio, esse caça precisaria ser submetido a um tão grande repertório de restrições, que seu aproveitamento como aeronave de combate estaria irremediavelmente comprometido.
O jato francês Rafale, da Dassault, operaria no São Paulo, mas também submetido a significativas limitações.
Assim, a verdade é que, com qualquer uma dessas duas escolhas, o São Paulo precisaria ser substituído até, no máximo, 2028 – época em que a Força Aeronaval planeja dar baixa em suas aeronaves AF-1 (A-4KU).
Mas o fato é que a História – essa dama de humores incontroláveis – dá pouca (ou nenhuma) importância às teses montadas sobre hipóteses ou alternativas irrealizadas.
Em outubro de 2013, a presidenta Dilma desistiu, à última hora, de fazer uma visita oficial aos Estados Unidos – onde a compra do Super Hornet seria formalizada –, e o velho Foch ganhou uma sobrevida…
A importação do comprido e pesadíssimo Super Hornet naval, forçaria, conforme dissemos, a aposentadoria de um porta-aviões antigo, de motores, sistema de distribuição de energia e sensores eletrônicos ultrapassados, mas cujo casco – em estado inusitadamente bom – talvez justificasse um esforço para que fosse mantido em atividade.
Gripen F – A reviravolta no Projeto FX-2 – um castigo da chefe de Governo brasileiro à administração americana (acusada de espionar a Presidência da República e os negócios de importantes empresas brasileiras, como a Petrobras) – trouxe à ribalta o projeto do pequeno caça SAAB Gripen NG, sueco.
Em sua versão para a FAB esse jato não pesará mais que 16 toneladas. Mas pintado com a camuflagem naval em tons de azul caro e cinza, ele ainda precisará de reforços estruturais para aguentar o tranco de ser catapultado e recolhido pelo aparelho de parada de um navio-aeródromo.
A ideia inicial dos engenheiros da SAAB é desenvolver o chamado Sea Gripen a partir da estrutura encompridada do Gripen F – a versão biplace do Gripen NG que será entregue à FAB.
Mais leve que os seus antigos competidores, o Gripen naval exigirá dos motores do São Paulo uma velocidade muito menor para ser lançado…
Em resumo: a escolha do Gripen pode não ter dado à aviação militar brasileira um jato de combate com todos os predicados que o Super Hornet ou o Rafale reúnem, mas certamente garantiu o uso de um avião muito mais econômico e fácil de ser mantido – e, ainda por cima, o caça adequado, nesse momento, às possibilidades da Aviação Embarcada da Marinha do Brasil.
Prazo – Tendo em vista a prioridade e necessidades da defesa aérea provida pelas unidades da FAB, os Sea Gripen somente começarão a chegar ao Brasil após a entrega das 36 unidades do caça NG (28 modelos E, monoplaces, e oito F, biplaces) adquiridas pelo Comando da Aeronáutica. Aí, precisamente, reside nosso principal desafio.
Vai ser duro esperar pelo Sea Gripen…
Até porque não será fácil esticar a vida útil dos AF-1.
Preservar a capacidade operacional do Skyhawk brasileiro até 2028 é previsão (aposta?) um tanto otimista.
Ouvidos pelo Poder Naval durante a LAAD 2015, no Riocentro, oficiais especialistas lotados na área de Material da Marinha, opinaram: só com muita sorte os caças que equipam atualmente o Esquadrão Falcão permanecerão voando por mais 12 ou 13 anos. Nesse setor já se fala, abertamente, em, no máximo, mais dez anos – com modernização (digitalização do funcionamento analógico de diversos sistemas da aeronave), muita manutenção e uma generosa dose de sorte.
Até porque, a última unidade aérea de “agressores” da Marinha americana que empregava o Skyhawk já foi desativada. E o que resta agora, nos Estados Unidos, em termos de estoques de peças da aeronave, são os suprimentos mantidos por umas poucas companhias civis que alugam jatos A-4 para fazer “figuração inimiga” nos treinamentos dos pilotos de Hornet da Marinha americana.
Corrosão – Há pouco mais de um mês, alguns oficiais da Força Aérea Argentina (FAA) estiveram nos Estados Unidos fazendo um tour por organizações militares e empresas privadas que poderiam oferecer sobressalentes e/ou serviços de manutenção especializados para jatos Skyhawk. Como se sabe, a FAA mantém (ou tenta manter) em operação um reduzido agrupamento de aeronaves A-4AR Fighting Hawk (originariamente aparelhos do tipo A-4M).
Em Tucson, Arizona, os oficiais da FAA visitaram as instalações da base de Davis-Monthan, sede do conhecido 309º Grupo de Regeneração e Manutenção Aeroespacial (309th Aerospace Maintenance and Regeneration Group – AMARG) do Comando de Material da U.S. Air Force, onde hoje se encontram estocados – ao ar livre – mais de 4.000 aeronaves postas em desuso pelas Forças Armadas dos Estados Unidos.
A decepção foi total. De acordo com um relato obtido com exclusividade pelo Poder Naval, os argentinos encontraram restos de caças A-4 e até células mais ou menos completas de aeronaves A-4M e TA-4J (de treinamento) mas quase tudo carecendo de peças importantes e com marcas evidentes de corrosão…
Em uma empresa do estado da Flórida que mantém aeronaves A-4 para oferecer serviços de treinamento às unidades aéreas estadunidenses, e um bom estoque de peças para os aviões, os preços pedidos foram estratosféricos. O overhaull de um motor de A-4, por exemplo, não sai por menos de 290.000 dólares…
Modernização – Também é preciso dizer: o fato de a versão naval do Gripen proposta pela SAAB possuir dimensões e peso compatíveis com a operação no A12, praticamente sem restrições, não elimina todos os problemas. Mesmo para operar o Sea Gripen, o navio precisa passar por modernização – especialmente em seu Sistema de Aviação.
Por Sistema de Aviação do navio-aeródromo São Paulo devem ser compreendidos:
- a) catapultas (avante e lateral);
- b) sistema óptico de pouso (SOP);
- c) defletores de jato;
- d) aparelho de parada (4 unidades);
- e) elevadores de aeronaves; e
- f) as interfaces com o sistema de propulsão.
A Marinha do Brasil pretende adquirir, inicialmente, 24 aeronaves Sea Gripen. Caso venha a operar dois navios-aeródromo – na virada da década de 2030 para os anos de 2040 –, este número deverá dobrar.