Corveta Inhaúma

O projeto que resultou nas corvetas da classe ‘Inhaúma’ e ‘Barroso’ teve início em 1977, quando a Marinha do Brasil iniciou estudos para substituir suas antigas corvetas e contratorpedeiros, por uma nova classe de navios-patrulha oceânicos (NPaOc). Conheça sua história e futuro na MB, com a possível construção de mais navios com projeto e sistema de armas atualizado

Alexandre Galante e Fernando De Martini

O “Projeto Corveta” teve início em 1977, quando o ministro da Marinha, almirante Geraldo Azevedo Henning determinou o desenvolvimento de um projeto para a construção no Brasil de navios-patrulha oceânicos (NPaOc). O objetivo era substituir tanto as 10 corvetas da classe “Imperial Marinheiro” (na verdade, rebocadores de alto-mar) na função de patrulha marítima quanto 12 antigos contratorpedeiros das classe “Gearing”, “Allen M. Sumner” e “Fletcher” (de 14 recebidos pela Marinha desde o final da década de 1950), fornecidos pelos Estados Unidos pelo MAP (Programa de Assistência Militar).

A estratégia naval brasileira, no contexto da Guerra Fria, preocupava-se com a ameaça submarina soviética ao tráfego marítimo do Brasil, em caso de uma confrontação entre as grandes potências nucleares, EUA e URSS, como ocorreu na Segunda Guerra Mundial, quando submarinos alemães e italianos nos atacaram.

A Marinha estava recebendo seis modernas fragatas classe “Niterói”, de projeto britânico, quatro delas especializadas na guerra antissubmarino, das quais duas construídas no Brasil. A ideia era aproveitar a experiência e o conhecimento obtidos com as fragatas e construir no País navios de menor porte e mais baratos, em maior número.

Vale lembrar que planejamento feito na década anterior, e que levou à classe “Niterói”, preconizava uma frota de 30 navios de escolta, cujo primeiro lote deveria ter sido de 10 fragatas, mas que ficou restrito a 6 devido ao custo.

CTs
O projeto das corvetas visou substituir os antigos contratorpedeiros de procedência americana das classes Fletcher, Allen M. Sumner e Gearing em uso na MB
Corveta concepção artística
Concepção artística da Corveta, ainda com indicativo V28

Ainda em 1977, o Ofício nº 1652 do CEMA (Chefe do Estado-Maior da Armada) à DGMM (Diretoria Geral de Material da Marinha) estabeleceu características básicas do NPaOc: velocidade máxima mantida de 28 a 30 nós, cruzeiro de 17 nós, raio de ação de 6.000 milhas náuticas e tripulação de 165 homens. As missões seriam de patrulha marítima e escolta antissubmarino a comboios ou força naval, complementando a classe “Niterói” tanto ao longo do litoral quanto em travessias oceânicas.

Em 27 de dezembro de 1978, Ofício nº 1940 do CEMA à DGMM alterou algumas características: velocidade de cruzeiro de 15 a 17 nós, velocidade máxima mantida de 25 nós, raio de ação de 4 a 5 mil milhas marítimas e tripulação de 125 homens. Suas missões seriam defesa afastada ou aproximada do litoral em ações de superfície, escolta a comboios de cabotagem ou transoceânicos, integrar coberturas com as fragatas e, em tempo de paz, realizar patrulha marítima nas águas territoriais do País. Na época, foram divulgadas concepções artísticas com canhões de 57mm e 76mm, sem hangar para helicóptero. Com a evolução do projeto, incorporaram-se hangar e convoo para helicóptero orgânico e armamento similar ao da classe “Niterói”. O navio crescia.

O CEMA procedeu à revisão dos requisitos e, em meados de 1979, submeteu ao EMA (Estado-Maior da Armada) o relatório de estudo de exequibilidade, selecionando a versão “escolta-padrão”, agora denominada corveta. Iniciou-se a fase de concepção, que durou até dezembro de 1980. O projeto foi aprovado pelo ministro da Marinha, almirante Maximiano Eduardo da Silva Fonseca, pelo Ofício nº 1006 de 12 de maio de 1981, enviado ao EMA. Após discussões interministeriais, concluiu-se o projeto de contrato, em 15 de agosto de 1983.

O “Projeto Corveta” foi desenvolvido pela Diretoria de Engenharia Naval (DEN) com consultoria técnica da empresa alemã Marine Technik, em contrato firmado em 1º de outubro de 1981. Vale dizer que apenas 7,5% de mão de obra estrangeira foi utilizada nas fases de concepção e preliminar do projeto. Foi autorizada a construção de quatro navios, o primeiro par autorizado em 15 de fevereiro de 1982 e o segundo em 9 de janeiro de 1986. A Marinha planejava construir dezesseis corvetas, em quatro lotes de quatro navios, mas a falta de verbas diminuiu esse número para doze e, por fim, para apenas quatro, que ainda assim sofreram atrasos consideráveis na construção.

Corveta Inhaúma em início de construção. Foto: DPHDM
Corveta Inhaúma em início de construção. Foto: DPHDM

A construção da primeira corveta, a Inhaúma (V30), foi iniciada em setembro de 1983 no Arsenal de Marinha do Rio de Janeiro (AMRJ), com lançamento previsto para junho de 1985 e entrega para junho de 1987. Todavia, o lançamento só ocorreu em dezembro de 1986 e a incorporação em dezembro de 1989. A construção da Jaceguai (V31), iniciada em outubro de 1984 também no AMRJ, também sofreu atrasos (embora seu tempo de construção na carreira tenha sido menor que o da Inhaúma), com lançamento em junho de 1987 e incorporação em abril de 1991. O financiamento para a parte mais cara dos navios, o sistema de armas, foi obtido junto a bancos estrangeiros. Já a plataforma e seus sistemas contaram com verbas locais e financiamentos de empresas estrangeiras que se consorciaram com brasileiras, no esforço de nacionalização.

Como a Marinha pretendia transferir a tecnologia de construção de navios de guerra a estaleiros privados, o segundo par ficou a cargo do Estaleiro Verolme, com um prazo de entrega de 33 meses para a Júlio de Noronha (V32) e de 36 meses para a Frontin (V33). A primeira foi incorporada em outubro de 1992 e a segunda em março de 1994.

Corveta Jaceguai em acabamento no Arsenal de Marinha do Rio de Janeiro. Foto: US Navy
Corveta Jaceguai em acabamento no Arsenal de Marinha do Rio de Janeiro. Foto: US Navy

O projeto da plataforma
O projeto conceitual definitivo das corvetas mostrava características semelhantes às da classe “Niterói”, embora com porte menor: sistema de armas, proteção NBQ (Nuclear, Bacteriológica e Química) e propulsão CODOG (Combined Diesel or Gas Turbine – sistema combinado de motores diesel para velocidade de cruzeiro ou turbina a gás para velocidades de pico). Outras configurações de propulsão foram estudadas, comparando-se peso, volume, quantidade de combustível e raio de ação, velocidade máxima, custo no ciclo de vida e possibilidade de nacionalização. As análises da DEN foram encaminhadas ao EMA, que decidiu pelo CODOG.

Nos tanques de prova do SSPA (Statens Skeppsprovningsantalt) em Gotemburg, na Suécia, realizaram-se os principais testes com o modelo do casco: resistência à propulsão, manobrabilidade e comportamento no mar. Os testes foram positivos, contrariando experiências anteriores no IPT (Instituto de Pesquisas Tecnológicas, em São Paulo) que indicaram possíveis problemas de mergulho da proa, com embarque de água, em mar grosso. Acabou se confiando mais nos testes suecos, o que depois se mostrou como um erro: o IPT é que estava certo. Voltaremos ao assunto mais à frente.
Houve especial atenção no projeto para que o navio fosse silencioso, visando as operações antissubmarino. O projeto dos hélices foi extremamente cuidadoso, sendo realizados testes de eficiência, cavitação, vibração e ruído. Foram adicionados calços flexíveis para a maioria dos equipamentos de bordo e também se atendeu a requisitos de resistência a explosões submarinas e baixa assinatura ao infravermelho e ao radar.

A meta de nacionalização gera uma classe de “quatro protótipos”
Para se atingir o maior índice possível de nacionalização, meta considerada fundamental, decidiu-se encomendar quatro navios de uma vez, e não apenas um protótipo, pois só com quatro unidades se conseguiria uma escala mínima inicial que compensasse os custos e riscos técnicos para a produção nacional de sistemas e equipamentos. Vale lembrar que os riscos financeiros também não eram pequenos: na época, a inflação só crescia, reduzindo o valor efetivamente recebido pelas empresas. Com isso, a classe de quatro navios passou a ser, praticamente, uma classe de quatro protótipos – o que tem precedentes em outras marinhas ao longo da história, como a americana.

Um exemplo de prioridade na nacionalização foi do sistema de propulsão. Rejeitou-se um atrativo financiamento externo que permitiria obtê-lo por completo, pois a contrapartida seria não participar na engenharia do projeto desse sistema, impedindo também que se nacionalizasse os equipamentos, prejudicando a autonomia na manutenção.

Enfrentou-se então o desafio de projetar aqui o sistema de propulsão, com o máximo possível de nacionalização. Assim, a turbina a gás GE LM-2500 (27.000hp) foi nacionalizada em 15% (base, invólucro, grupo de descarga de gases e outras peças) e os motores diesel MTU 16V956 TB91 de 3.900hp (dois em cada navio) em 42%. A engrenagem redutora Renk-Zanini é 71% nacional, o sistema de estabilização ativa por aletas da Vosper foi nacionalizado em 75% do seu custo e os sistemas de eixos e hélices KaMeWa foram 92% produzidos no Brasil. Outros exemplos são a máquina do leme Sperry, os geradores Siemens e os cabos elétricos da Pirelli,100% nacionais.

V31 - 2
Corveta Jaceguai (V31)

O projeto do sistema de armas
A concepção e especificação do sistema de armas recebeu especial atenção para atender aos requisitos operacionais, considerando-se características das ameaças de superfície, submarinas e aéreas formuladas pelo EMA. Num momento em que a guerra naval trazia novas ameaças como os mísseis antinavio, o tempo de reação foi considerado fundamental, juntamente com a precisão e a automação das armas.

No início da década de 1980, as soluções embarcadas eram baseadas em mainframes ou minicomputadores, sendo adotado o computador inglês Ferranti FM1600E (o mesmo das fragatas Type 22), evolução do FM1600B do sistema CAAIS da classe “Niterói”. O tempo de reação típico contra um míssil antinavio como o Exocet, ameaça considerada crítica pela alta velocidade e difícil detecção, era de 20 segundos. Com o míssil detectado a cerca de 12km do navio, o sistema tinha tempo suficiente para rastreá-lo, computar a previsão de tiro dos canhões antiaéreos e abrir fogo.

Centro de Operações de Combate (COC) da Corveta Jaceguai
Centro de Operações de Combate (COC) da Corveta Jaceguai

COC Jaceguai 2

O Centro de Operações de Combate (COC) foi organizado em duas grandes áreas funcionais básicas: Comando e Controle (com os sensores de vigilância e os consoles dos operadores) e Direção de Tiro (com os sensores rastreadores de alvos e os consoles de controle de armas). No total, são três consoles: o de comando de guerra de superfície, o de armas abaixo d’água e o de armas acima d’água.

No subsistema de Direção de Tiro (DT) implementou-se a flexibilidade de controle: qualquer um dos sensores de DT (radar, alça eletro-ótica, alças óticas) pode controlar, via computador, qualquer um dos canhões. Controles locais de emergência permitem que as alças comandem diretamente as armas, em caso de avaria dos computadores.
Houve grande participação brasileira em engenharia de sistemas, produção local de hardware, gerência técnica, documentação, testes, integração e comissionamento.

Júlio de Noronha (V32)
Júlio de Noronha (V32)

Mais lições da Guerra das Malvinas
Pouco tempo depois da autorização para construir as duas primeiras corvetas, em 15 de fevereiro de 1982, eclodiu a Guerra das Malvinas, quando tropas argentinas ocuparam as ilhas e a reação britânica resultou em combates aeronavais, trazendo muitas lições. Já falamos da necessidade de reagir rápido a ataques de mísseis do tipo “sea skimmer” (de voo rente ao mar) como o Exocet.
Outras lições estão relacionadas às avarias causadas por mísseis do tipo. Foi o caso do destróier britânico HMS Sheffield, que recebeu o impacto de um AM39 Exocet lançado por um jato Super Ètendard da Marinha Argentina. O míssil penetrou o casco, sem explodir – ainda assim, as chamas do propelente provocaram um violento incêndio, queimando cabos elétricos que emitiram fumaça tóxica, prejudicando seu combate. O fogo aqueceu a superestrutura de alumínio, que entrou em colapso. O navio afundou dias depois, quando era rebocado.

Projetos de navios de guerra foram reformulados após as lições daquele ataque, diminuindo-se o emprego de alumínio estrutural e incorporando-se cabos elétricos de materiais que não produzissem fumaça tóxica em caso de incêndio. O projeto da classe “Inhaúma”, mesmo já bem adiantado, absorveu essas mudanças: parte da estrutura de alumínio (que derrete à temperatura de 650°C, normalmente atingida em incêndios) foi substituída por aço (que resiste a 900°C), na superestrutura de vante e de ré, gaiuta com chaminé e hangar. As escadas em rotas de escape também são de aço.

V33 -1
Frontin (V33)

Características principais das corvetas
A vida útil projetada de cada navio era de pelo menos 25 anos, a um custo de aquisição de US$150 milhões por unidade à época e índice de nacionalização de 40% desse valor. O sistema de armas, que representava 50% do custo, foi em sua maior parte importado, pois a fabricação no Brasil só seria viável com encomendas ainda maiores que as iniciais.

Escolheu-se o canhão inglês Vickers Mk.8 de 4,5 polegadas (114,3mm), mesmo modelo usado na classe “Niterói”, com capacidade antiaérea e antissuperfície; dois lançadores sêxtuplos Plessey Shield de chaff sobre o passadiço; dois lançadores duplos de mísseis superfície-superfície Exocet MM40 e dois reparos triplos Mk.32 para torpedos antissubmarino Mk.46; dois canhões de 40mm/L70 semi-automatizados em ambos os lados do hangar, que abriga um helicóptero orgânico Westland Super Lynx Mk.21A (SAH-11A), desempenhando missões de esclarecimento, ataque antissubmarino com torpedos, ataque a navios com mísseis Sea Skua e orientação além-do-horizonte (OTH) para os mísseis Exocet MM40 lançados pelo navio.

O principal sensor selecionado foi o radar Plessey AWS-4 de vigilância aérea e de superfície (com capacidade IFF – identificação amigo-inimigo), operando na banda E/F. O radar é dotado de MTI (indicador de alvo móvel), que remove “clutter” (retorno do mar e de terra) e permite o acompanhamento de alvos em voo rasante sobre o mar. O radar de navegação é o Kelvin Hughes e o sonar de casco passivo/ativo é o Atlas Elektronik DSQS-21C, de média frequência. Os canhões são direcionados por um radar de direção de tiro Orion RTN-10X, uma alça eletro-ótica Saab EOS-400 (TV, infravermelho e telêmetro laser) e duas alças óticas OFDLSE. Para a guerra eletrônica o sistema Racal Cygnus/Cutlass B1 tem capacidade de interceptação, análise e bloqueio eletrônico – este foi nacionalizado pelo Instituto de Pesquisas da Marinha (IPqM).

A propulsão CODOG permite velocidade máxima contínua de 27 nós (turbina) e máxima de cruzeiro de 18 nós (motores diesel). A autonomia é de cerca de 4.000 milhas marítimas a 15 nós.

Corveta Jaceguai e fragata Independência
Corveta Jaceguai e fragata Independência

Em operação
A primeira unidade, a Inhaúma, enfrentou diversos problemas quando começaram as provas de mar, embora isso seja razoavelmente comum de ocorrer em navios dessa complexidade: é com erros que se aprende, e a história dos projetos navais está repleta de erros e aprendizados. Porém, o fato de serem quatro protótipos, pelas razões de nacionalização já mostradas, não permitiu que defeitos percebidos na primeira unidade resultassem em mudanças de projeto nas três seguintes. O adiantamento da construção das demais limitou as modificações possíveis de fazer ainda na carreira, só sendo implementadas na fase de acabamento ou depois da incorporação. Precisou-se introduzir lastro para aumento da estabilidade, enquanto problemas como o mergulho da proa só foram corrigidos numa quinta unidade, a Barroso, lançada anos mais tarde.

Porém, depois de corrigidos os principais defeitos, a classe “Inhaúma” passou a receber elogios pela capacidade de guerra eletrônica e de pontaria, e isso numa época em que a classe “Niterói” ainda gozava de muito prestígio. Aos poucos, os “fragateiros” reconheceram as qualidades das novas corvetas.

As quatro corvetas classe Inhaúma operando juntas
As quatro corvetas classe Inhaúma operando juntas

Mudanças de planos e a longa construção de mais uma corveta
A ideia de se construir mais doze navios (para um total de dezesseis) foi formalmente abandonada em 1992, após anos de hesitação e indecisão. Simplesmente não havia recursos para um programa de construção desse porte, em época de inflação galopante.

Ainda assim, em meados de 1993 a Marinha anunciou a preparação de uma derivação do projeto, com um casco aumentado e sistema de armas mais leve. A quantidade de novas corvetas caiu de doze para duas, e o corte de metal para o primeiro navio foi iniciado em 21 de dezembro de 1994. Uma segunda encomenda foi prevista para 1995, mas concretizá-la ficava cada vez mais difícil, e foi necessário adquirir quatro fragatas britânicas Tipo 22 usadas para cobrir as últimas baixas de contratorpedeiros antigos (outras haviam sido compensadas por quatro contratorpedeiros de escolta classe “Garcia”, dos EUA, recebidos em 1989). Também se definiu uma extensa modernização da classe “Niteroi”, enquanto se gerava as exigências operacionais de uma nova classe de fragatas, para entrar em serviço 10 anos depois. Enquanto isso previa-se que a primeira corveta aprimorada fosse lançada em agosto de 1998 e incorporada em 2000.

Lançamento da corveta Barroso no AMRJ - Foto: DPHDM
Lançamento da corveta Barroso no AMRJ – Foto: DPHDM

Em janeiro de 1996 o ministro da Marinha, almirante Mauro Cesar Rodrigues Pereira, declarou que ainda esperava conseguir fundos para uma segunda unidade, sugerindo que havia em discussão um plano para dez unidades (presumivelmente as 4 da classe “Inhaúma” e 6 da nova versão). Mas a própria construção da primeira corveta aperfeiçoada, batizada Barroso, já sofria seguidos atrasos: o lançamento marcado para junho de 1999 só ocorreu em dezembro de 2002 e a incorporação, programada para junho de 2006, só foi possível em agosto de 2008, somando 14 anos desde o início da construção!

Finalmente a Barroso
O casco da quinta corveta tem 103,4m de comprimento e é 4,2m mais longo que o original, mantendo-se a boca de 11,4m. A extensão foi acompanhada do aumento da borda livre à proa, que também recebeu “bochechas” semelhantes às da classe “Niterói” para melhorar as qualidades marinheiras e diminuir o embarque de água em mar grosso. Os estudos da nova proa tiveram o auxílio do Swedish Maritime Research Centre SSPA. O convoo foi estendido para operação mais segura de helicópteros e a coberta à proa também foi estendida em um metro, aumentando o conforto da tripulação de 145 militares.

A superestrutura abaixo do passadiço foi modificada para aumentar a furtividade. O mastro principal é mais baixo e leve, o tamanho da chaminé foi reduzido e o convés 01 foi estendido, com portas de acesso reposicionadas. Com isso, o COC também ficou um metro mais longo.

Barroso sem radar - 2
Barroso no início das provas de mar, ainda sem a antena do radar RAN-20S

A praça de máquinas foi estendida em dois metros para acomodar motores MTU 20V1163 mais poderosos e maiores, com 7.850hp cada, permitindo velocidade máxima de cruzeiro (só com motores diesel), superior a 20 nós, mantendo-se o alcance de 4.000 milhas a 15 nós.

O canhão de 4,5 polegadas foi mantido (instalou-se canhão retirado do convés de popa da fragata Constituição durante a modernização do navio), assim como os mísseis Exocet MM-40 (em novos lançadores) e os reparos triplos nacionalizados (SLT Ares) para torpedos antissubmarino. Já os dois canhões Bofors 40mm/L70 semi-automatizados da classe “Inhaúma” deram lugar a um único Bofors 40 Trinity Mk.3 CIWS sobre o hangar, porém totalmente automatizado e mais efetivo.

A Barroso operando com a Esquadra
A Barroso operando com a Esquadra

Na eletrônica, os lançadores de chamarizes de proteção antimíssil foram substituídos pelo sistema similar SLDM do IPqM (Instituto de Pesquisas da Marinha) usado nas fragatas modernizadas, instalando-se o sistema de guerra eletrônica Defensor, também nacional, para alerta-radar (MAGE). Foi selecionado o radar de busca AESN RTN-20S e o radar de direção de tiro RTN-30X, ambos empregados pela classe “Niterói” modernizada. Foram instalados também dos radares de navegação Furuno e Scanter Therma. A mudança mais importante foi o sistema de controle tático e comando e controle Siconta Mk III, nacional, no lugar do Ferranti CAAIS-450/WSA 421 da classe “Inhaúma”. O sonar de casco é o EDO 997C.

Porém, foi preciso diminuir a nacionalização em outros itens, devido à perda de escala. Por exemplo, os hélices deixaram de ser de fabricação nacional.

CV03-02
Uma das primeiras concepções da CV03

Mais corvetas
Em meados de 2012 a Marinha solicitou ao Ministério da Defesa a construção de mais quatro corvetas derivadas da classe “Barroso”, possivelmente em estaleiros privados nacionais.

O programa das novas corvetas visa, segundo a Marinha, a construção inicial de quatro navios para emprego em áreas costeiras e oceânicas, com elevado índice de nacionalização de componentes e equipamentos. O reprojeto trará novas funcionalidades, aumentando a flexibilidade, o poder combatente e a capacidade de contrapor ameaças múltiplas. Espera-se também promover o crescimento da Indústria Nacional de Defesa, desenvolvendo-se equipamentos para emprego nos navios e envolvendo universidades, empresas e outras instituições nacionais de pesquisa.

Modelo da corveta Tamandaré no estande da Emgepron na LAAD 2015
Modelo da corveta Tamandaré no estande da Emgepron na LAAD 2015

O Centro de Projetos de Navios da Marinha do Brasil, localizado no AMRJ, desenvolveu sozinho as duas primeiras etapas do programa: a fase da determinação da exequibilidade dos requerimentos de alto nível do sistema (RANS) e o Projeto de Concepção. O centro lançou então uma concorrência para o “Projeto Preliminar de Contrato” da nova corveta brasileira, vencida pelas empresas Projemar Engenharia e Participações S/A e estaleiro VARD Niterói S/A. O projeto preliminar fará parte da documentação do processo de seleção de estaleiros contratados para a construção.

Conhecido como “terceiro projeto de corveta” – CV03 ou classe “Tamandaré”, o navio terá um deslocamento ligeiramente maior que o da Barroso, com um desenho mais furtivo, novos sensores e armamento antiaéreo incluindo mísseis mar-ar, atualmente em seleção.

Perfil da corveta Tamandaré
Perfil da corveta Tamandaré

Conclusão
A defasagem do cronograma das corvetas, juntamente com a desativação de navios antigos, obrigou a Marinha a adquirir navios de segunda-mão, como vimos. Essas compras de oportunidade resolveram um problema urgente, mas prejudicaram seriamente a indústria naval e de defesa do País, sendo também soluções temporárias.

É necessário que a Marinha possa continuar o processo de nacionalização de meios e sistemas com a construção de mais corvetas, para que não se perca (ou melhor, para que se recupere, pois parte da experiência se perdeu com a saída e aposentadoria de pessoal) o que foi realizado com tanto sacrifício. É preciso obter o mínimo essencial para manter a massa crítica de engenheiros e técnicos, evitando-se ficar para trás.

A construção naval militar deveria ser uma das prioridades do País. Neste século, a capacidade de se defender e demonstrar poder (mesmo sem guerra) para alcançar objetivos políticos será vital para um país rico em recursos naturais como o Brasil.

Com o “Projeto Corveta” a Marinha alcançou a capacitação tecnológica para conceber, controlar e executar todas as fases de obtenção de navios de guerra. O caminho agora é seguir adiante, sem interrupções, evoluindo sempre.

Tamandaré LAAD 2015 - 1

Artigo publicado originalmente na revista Forças de Defesa número 10

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