Nota de falecimento: Almirante Hélio Leôncio Martins
Faleceu na manhã de ontem o Almirante Hélio Leôncio Martins, eminente historiador naval e ex-combatente da 2ª Guerra Mundial.
O Almirante Leôncio conquistou o primeiro lugar em todos os cursos da carreira: na Escola Naval, no Curso de Especialização em Hidrografia e no Curso Superior da Escola de Guerra Naval. Fez parte, em 1938, da 5ª turma de hidrógrafos.
Comandou três navios: o caça-Submarino Juruena, em operações de guerra; o contratorpedeiro Mariz e Barros e o navio-aeródromo Minas Gerais, do qual foi o primeiro comandante.
Durante a 2ª Guerra Mundial, além de comandante do Juruena, foi Oficial de Operações do Grupo Patrulha do Sul em Operações de Guerra, Imediato do caça-submarino Goiana, em Operações de Guerra e participou da escolta a inúmeros comboios.
Como hidrógrafo, participou de levantamentos nas costas dos Estados de São Paulo, Paraná, Santa Catarina, Rio de Janeiro e Rio Grande do Norte. Foi Chefe da Comissão de Levantamento Batimétrico do Rio Alto Paraná, trabalho que resultou na edição de quatro cartas.
Foi, também, Chefe de Gabinete do Ministro da Marinha e Presidente da Comissão de Construção de Navios na Europa.
Foi um dos criadores e o primeiro diretor do Centro de Adestramento Almirante Marques Leão, instrutor da Escola de Guerra Naval e Instrutor de Navegação e Hidrografia na Escola Naval.
Destacou-se também na vida civil. Foi Professor de História Militar da UNIRIO, Diretor da ABBR, Presidente da Companhia Brasileira de Dragagem, Diretor Financeiro dos Serviços Aéreos Cruzeiro do Sul, Diretor do Instituto de Administração e Gerência da PUC, Diretor da Verolme Estaleiros do Brasil, dentre outras funções
Recebeu cinco medalhas pela sua atuação na 2ª Guerra Mundial. O Almirante Leôncio tinha 101 anos de idade e era membro do IGHMB e do IHGB.
Os cacinhas
“As milhas vão sendo devoradas. Tudo que aconteça é novidade bem-vinda para quebrar o ramerrão. Um holofote do capitânia que pisque é sempre uma esperança – mesmo quando avisa que há submarinos postados no caminho do comboio. Mas caça-submarinos são navios de gente moça, alegre e irreverente.
E a alegria e a irreverência deles vieram fazer caretas à antiga sisudez das comunicações navais. Conversa-se amigavelmente pelos pisca-piscas. Conta-se fatos. Caçoa-se. Cumprimenta-se. Os códigos de radiofonia devem utilizar palavras que bastante se afastem de sua real significação. E daí surgem diálogos surpreendentes.
Um comandante de escolta certa vez (normalmente há um código para cada comboio) denominou a escolta de retreta, o comboio de auditório, o comandante da escolta de maestro e os diversos navios com nomes de instrumentos. Havia o pandeiro, o cuíca, o chocalho, o reco-reco, o trombone, etc. Além disso, um mercante seria mau elemento, avaria, lilica, corveta, rapaz, cruzador, feioso, caça-ferro, beleza (é claro que ele era comandante de um caça-ferro).
Chamava-se penetra um navio suspeito, investigar um contato, pegar um abacaxi, atacar com bombas, sambar, regressar ao comboio, dar despesa, e estação de rádio, fogão. E podia-se ouvir, não só a orquestra, mas todo o Atlântico, mensagens como esta: “Maestro de Chocalho – estou com lilica no fogão”, ou “Tamborim de Reco-Reco – fui pegar um abacaxi, sambei e já dei despesa”. Difícil para os alemães, se escutavam, compreenderem…”
“Movimentos bruscos largam as bombas. Sentem-se baques surdos e um estremecimento percorre o navio, a cada uma que explode. Pela popa, gêiseres de espuma erguem-se enormes, fosforescentes, como montanhas luminosas.
O cacinha faz um giro lento e 20 pares de olhos devoram a escuridão. Súbito, alguém parece ver um vulto que se delineia na sombra. Brada. Impressão ou realidade, todos distinguem-no imediatamente. O ratatá das metralhadoras matraqueia, brilhando os traçadores como um imenso fogo de artifício vermelho.
O canhão entra no coro, com sua voz de baixo. (…) Talvez um avião encontre na superfície, incapaz de imergir, uma presa que acabará de destruir. Talvez nada tenha acontecido. Mas o comboio passou. Pelo menos por esta noite e pelo dia seguinte este não lhe meterá medo. E o caça volta a procurar o seu cantinho na escolta.”
Trechos do capítulo “Os Cacinhas”, do livro Estórias Navais Brasileiras, de Helio Leoncio Martins e Antônio A. C. de Castro. Rio de Janeiro, SDGM, 1985.
FONTE: Blog História Militar