USS Simon Bolivar (SSBN-641)

USS Simon Bolivar (SSBN-641)

Documentos que recentemente deixaram de ser secretos mostram que mesmo os submarinos mais discretos deixam um rastro

Por David Hambling

No final da década de 1980, a União Soviética reivindicou um feito que muitos especialistas militares achavam impossível. O K-147, um submarino de ataque nuclear da classe Victor, seguiu secretamente a trilha de um “boomer” americano (provavelmente o USS Simon Bolivar) em um jogo subaquático de perseguição que continuou por seis dias.

Os observadores dos EUA na época pensavam que os soviéticos não tinham tecnologia para um sonar efetivo, pelo menos em comparação com as capacidades dos EUA e seus aliados da OTAN. Agora, um relatório da CIA recentemente tornado público mostra como os submarinos caçadores, como o K-147, foram em missões secretas para rastrear submarinos americanos, sem usar o sonar.

A Diretoria de Ciência e Tecnologia da CIA produziu o relatório sobre Capacidade de Guerra Antissubmarino Soviética em 1972, mas deixou de ser secreto apenas neste verão. Mesmo quarenta e cinco anos depois, linhas, parágrafos e até páginas inteiras estão censuradas. Uma longa porção sobre a tecnologia soviética em desenvolvimento dá detalhes nunca anteriormente revelados sobre dispositivos sem equivalentes ocidentais. Enquanto a OTAN concentrava quase todos os seus esforços no sonar, os russos criaram outra coisa inteiramente diferente.

POR QUE O SONAR É REI?

A água do mar bloqueia as ondas de rádio. Portanto, o radar, enquanto eficaz na superfície, é inútil debaixo d’água. As ondas sonoras, por outro lado, viajam melhor através da água do que através do ar, e, logo na Primeira Guerra Mundial, foram colocadas à mão encontrando submarinos.

O Sonar vem em dois tipos básicos. Há um sonar ativo, que envia “pings” que são refletidos pelo alvo, tornando-se uma versão subaquática do radar. O sonar passivo, por outro lado, é baseado em dispositivos de escuta sensíveis que podem capturar o som dos mecanismos ou hélices de um submarino e, ao contrário do sonar ativo, não entrega sua posição. Dependendo das condições, o sonar pode encontrar um submarino a várias milhas de distância e em qualquer direção.

Os EUA e seus aliados desenvolveram sofisticados sistemas de sonar, que logo se tornaram tão eficazes que outros métodos de detecção foram deixados para trás ou esquecidos. Durante décadas, os métodos não acústicos foram considerados inferiores por serem limitados em alcance e confiabilidade em comparação com o sonar. “É improvável que algum desses métodos permita a detecção de submarinos em alcances longos”, conclui um relatório de inteligência de 1974.

Na URSS, era uma história diferente. Os soviéticos foram prejudicados pela eletrônica primitiva e lutaram para que o sonar funcionasse. Então, eles desenvolveram outros meios estranhamente inteligentes de detecção de submarinos.

SURGE O SOKS

Sobre esse método destacado no relatório está o misterioso SOKS soviético, que significa “System Obnarujenia Kilvaternovo Sleda” ou “sistema de detecção de rastro de objeto”. Este dispositivo, instalado em submarinos de ataque russos, rastreia a esteira que um submarino deixa para trás. O SOKS é realmente visível em fotos de submarinos russos como uma série de espigas e copos montados em barbatanas externas.

A reivindicação soviética de seguir submarinos sem sonar soava como um típico blefe russo, mas sem saber como (ou se) o SOKS funcionava, uma avaliação realista era impossível. O Pentágono tornou secreta toda essa área de pesquisa e os cientistas simplesmente não falaram mais sobre isso. Os rumores da Rússia sobre a SOKS foram inconsistentes e muitas vezes contraditórios, com alguns dizendo que o SOKS media mudanças na densidade da água, ou detectava a radiação, ou mesmo usava um sensor laser.

Localização do SOKS em um submarino de ataque russo

O que o Ocidente sabia com certeza era que o equipamento SOKS apareceu pela primeira vez no K-14, submarino classe “November”, em 1969. Desde então, as versões subseqüentes com nomes código como Colossus, Toucan e Bullfinch apareceram em todas as novas gerações de submarinos de ataque soviéticos e russos, incluindo o atual “Akula” e a próxima classe “Yasen”.

De acordo com esses documentos recentemente tornados públicos, os rumores antigos eram precisos de uma maneira — os soviéticos não desenvolveram apenas um dispositivo, mas vários. Um instrumento pegava “radionuclídeos de ativação”, uma trilha fraca deixada pela radiação do reator de energia nuclear do submarino. Outra ferramenta era um “espectrômetro de raios gama” que detecta vestígios de elementos radioativos na água do mar.

O SOKS em detalhe

“Os soviéticos teriam tido sucesso detectando seus próprios submarinos nucleares [várias palavras censuradas] com esse sistema”, diz o documento.

O relatório também descreve como os submarinos deixam para trás um coquetel de produtos químicos na sua esteira. Anodos sacrificiais que impedem a corrosão deixam uma trilha de zinco na água. Partículas diminutas de níquel em flocos dos tubos que circulam a água do mar para arrefecer o reator. O sistema que faz oxigênio para a tripulação deixa para trás o hidrogênio que ainda é detectável quando dissolvido na água do mar. Juntos, esses traços químicos podem medir apenas alguns décimos da parte por bilhão, mas equipamentos sofisticados podem encontrá-los.

E, como seria de esperar, um reator nuclear também deixa para trás toneladas de calor. De acordo com o relatório, um grande submarino nuclear requer “vários milhares de galões de líquido refrigerante por minuto”. Esta água, usada para absorver calor do reator, pode ser 10 graus Celsius mais quente do que a água do mar circundante, criando uma mudança no índice de refração da água — uma mudança que é detectável com um sistema de interferência óptica.

E os soviéticos fizeram exatamente isso.

“Um sistema de localização baseado nessa técnica, capaz de detectar rastros até várias horas após a passagem de um submarino, teoricamente pode ser construído agora”, diz o relatório, embora não se tenha certeza se os russos o fizeram.

FATOS SEPARADOS DA FICÇÃO

Embora muitas dessas técnicas tenham sido sugeridas anteriormente, não havia nenhuma indicação de quais eram teóricos e quais eram realmente utilizados.

“Este relatório empresta muita credibilidade aos sistemas de detecção de submarinos que muitos ainda acreditam serem pouco mais do que mitos”, disse o engenheiro de defesa Jacob Gunnarson à Popular Mechanics. Anteriormente, um estudo dos EUA de 1994 achava duvidoso se as esteiras de submarinos podiam ser detectadas, afirmando que “se os fenômenos hidrodinâmicos são ou não exploráveis ​​podem ser questionados”.

Os sensores não dizem simplesmente “aqui está um submarino”, mas gerariam um fluxo de dados numéricos. Separar a assinatura de um submarino do ruído de fundo nos dados leva algum poder de computação, e o relatório observa que, nos anos 70, os soviéticos estavam muito atrasados ​​nesta área. Hoje em dia, os russos podem adquirir máquinas comerciais, milhares de vezes mais poderosas que as que tinham, e isso pode ter dado ao SOKS um grande impulso.

O relatório mostra que, mesmo em 1972, as agências de inteligência estavam cientes de como os submarinos dos EUA poderiam ser rastreados. As contramedidas certamente teriam sido postas em prática desde então, como a redução das trilhas químicas e radioativas, o que é provavelmente o motivo pelo qual levaram 45 anos para que este documento seja divulgado.

Ainda assim, as novas versões dessas tecnologias são muito mais capazes do que os seus antepassados farejadores de água. Documentos científicos recentes sugerem que os chineses agora estão investigando a nova tecnologia submarina, e até mesmo a Marinha dos Estados Unidos e a DARPA começaram a se interessar pelo rastreamento de esteiras, sugerindo que a tecnologia não é tão inferior quanto se pensava anteriormente.

Se os russos ainda podem seguir sigilosamente os submarinos, ou se os EUA encontraram uma maneira de fazê-lo, é impossível saber. Provavelmente teremos que aguardar mais 45 anos para a resposta [fortemente censurada].

FONTE: Popular Mechanics / COLABOROU: Sérgio Santana

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