Falta de Guarda Costeira obriga MB ‘dual’ a apoiar polícia anti-pirataria
Por Roberto Lopes
Especial para o Poder Naval
A falta de uma Guarda Costeira no país, lacuna de responsabilidade exclusiva da Marinha do Brasil (MB) – que há várias décadas vem vetando a criação dessa corporação –, está obrigando a Força Naval a investir dinheiro, meios, recursos humanos e tempo em operações policiais nas redes hidrográficas da Amazônia.
O inimigo? Piratas de rio (“barrigas” ou “ratos d’água” como também são conhecidos) que assaltam os passageiros das embarcações incumbidas da ligação entre as dezenas de municípios da Região, roubam o combustível transportado em chatas vagarosas, realizam todo o tipo de contrabando e ainda escoltam os barcos dedicados ao narcotráfico – aparentemente com o aproveitamento de pistoleiros colombianos que serviram nas diversas frentes das FARC (Forças Armadas Revolucionárias da Colômbia).
O problema é que os almirantes não estão dispostos a compartilhar com nenhuma outra organização (mesmo com uma criada e controlada por eles) o papel de controladores e vigilantes dos espaços aquáticos do país.
Em 1983 o então ministro da Marinha, almirante de esquadra Maximiano da Silva Fonseca (falecido em abril de 1998), fez a última tentativa importante de que se tem notícia para criar uma Guarda Costeira em âmbito nacional. Mas o projeto acabou engavetado no Congresso.
De lá para cá, a MB vem insistindo em caracterizar a si própria como uma “Marinha Dual”, capaz de realizar operações de guerra e de policiamento das áreas litorâneas brasileiras.
Mas isso não é completamente verdade. Tanto que, em alguns estados, as Polícias Militares estão desenvolvendo seus braços de patrulhamento costeiro.
A 15 de outubro de 2013, o então governador paulista Geraldo Alckmin criou, no município do Guarujá, a primeira Companhia Marítima (Cia Mar) da Polícia Militar Ambiental de São Paulo.
O ato foi acompanhado da entrega de três novas embarcações, de 9,75 m de comprimento, para o policiamento das áreas de preservação ambiental espalhadas pelos 700 km de litoral paulista. Valor do investimento: 2,7 milhões de Reais (da época).
O projeto, cinco anos atrás, previa que a companhia marítima viesse a ser dotada de nove embarcações, e de um efetivo de 51 policiais militares distribuídos entre o Guarujá, um pelotão em Ubatuba e uma base operacional em Cananéia.
Base – Em 2017 foram transportados 9,8 milhões de passageiros e 3,4 milhões de toneladas de cargas na Amazônia (números do estudo “Caracterização da Oferta e da Demanda do Transporte Fluvial de Passageiros e Cargas na Região Amazônica”, divulgado em fevereiro passado pela Agência Nacional de Transportes Aquaviários, Antaq).
De acordo com o levantamento, no estado do Amazonas há pelo menos 73 linhas de transporte “longitudinal estadual”, realizado ao longo de rios e canais, além de 57 portos de embarque e 213 embarcações que transportam 1,6 milhão de passageiros e 999,1 mil toneladas de carga. Tudo precisa ser fiscalizado e monitorado.
O Sindicato das Empresas de Navegação Fluvial no Estado do Amazonas estima que, em 2017, os piratas de rio causaram um prejuízo da ordem de 100 milhões de Reais, e defende que o governo amazonense crie uma unidade de Polícia Fluvial, a exemplo do Grupamento de Polícia Fluvial instituído pela Polícia Militar paraense.
Em março a Secretaria de Segurança Pública do Amazonas solicitou a ajuda do 9º Distrito Naval para ativar uma base fluvial de policiamento na região do Encontro das Águas, em Manaus.
A base será montada em uma balsa flutuante que os policiais planejam empurrar até um ponto estratégico entre o porto da Ceasa, na zona sul da capital amazonense – saída para Porto Velho (RO) –, e o encontro entre os rios Negro e Solimões, na orla da capital amazonense.
Junto à balsa ficarão atracadas lanchas das Polícias Civil e Militar, com tripulações treinadas pela Marinha que ficarão responsáveis por fiscalizar embarcações e apurar ocorrências em comunidades ribeirinhas.
A expectativa das autoridades da Segurança Pública é de que o funcionamento eficaz dessa instalação flutuante estimule a organização de outras três, em Tefé-Coari (Região Central do território amazonense), no rio Madeira e no Baixo Amazonas (no extremo noroeste do estado do Pará) – tudo sempre com o apoio do pessoal do 9º e do 4º Distritos Navais (de Belém e Manaus, respectivamente), aí incluídos os fuzileiros do 1º Batalhão de Operações Ribeirinhas, subordinado ao 9º DN.
O rio Madeira é a principal rota de escoamento de grãos vindos de Rondônia, e Mato Grosso, bem como do combustível que abastece os estados do Acre, Rondônia e Mato Grosso, além de ser a porta de entrada de 40% do que se consome em Manaus.
Helicópteros – Em Belém, o 4º Distrito criará, possivelmente ainda este ano, um Esquadrão de helicópteros, a ser mobiliado com três aeronaves Esquilo. As aeronaves ficarão sediadas em um hangar da Ala 9, da capital paraense, cedido pelo Comando da Aeronáutica.
Na capital do Amazonas, o 9º DN resolveu adquirir a lancha multipropósito Aruanã, projetada pela empresa paulista GESPI Indústria e Comércio de Equipamentos Aeronáuticos S/A. E uma segunda unidade foi encomendada a 16 de março passado.
A compra dessas embarcações será efetivada com recursos do Projeto Calha Norte, do Ministério da Defesa.
Os barcos, de 8 m de comprimento, três pontos fixos para metralhadoras pesadas e capacidade de transportar 18 militares, integram o projeto de substituição das Embarcações de Transporte de Tropa (ETT), utilizadas pela tropa de fuzileiros local, por “Lanchas de Combate” com maior capacidade operacional – mas apesar de inseridas em um programa netamente militar, elas permanecerão, claro, disponíveis para atender a uma emergência policial.
Somente no 1º bimestre deste ano, a Secretaria de Segurança Pública amazonense apreendeu cinco fuzis de alto poder ofensivo no estado – inclusive um AK-47 –, mais que os três que haviam sido arrecadados em todo o ano passado. Esse armamento portátil teria entrado no território brasileiro pelas mãos de ex-guerrilheiros das FARC.