11 de junho: dia de entrar no futuro Riachuelo com o Poder Naval
Na Data Magna da Marinha, o Poder Naval convida seus leitores a visitar as obras do futuro submarino Riachuelo, cujo nome homenageia a célebre batalha travada em 11 de junho de 1865. Uma matéria extensa, com muitas fotos, para apreciar e debater não apenas hoje, mas também nos dias 12, 13 e por toda a semana.
Por Fernando “Nunão” De Martini
Na segunda-feira passada, 4 de junho, o Poder Naval visitou o Complexo Naval de Itaguaí, e os leitores do site já puderam ver diversas matérias tratando de obras em andamento nas diversas instalações – e mais matérias seguirão. Para hoje, Data Magna da Marinha do Brasil, Batalha Naval de Riachuelo, reservamos a matéria com a visita ao Estaleiro de Construção e ao submarino em fase de acabamento no interior do grande galpão, o futuro Riachuelo. Venha com a gente visitar, por fora e por dentro, as obras de finalização do primeiro de quatro submarinos de propulsão convencional diesel-elétrica SBR atualmente em construção, derivados do tipo Scorpene francês, e que fazem parte do Prosub (Programa de Submarinos) da Marinha do Brasil, que também inclui a futura construção do primeiro submarino brasileiro de propulsão nuclear (SNBR).
Para entender melhor onde está o submarino, vale a pena revisitar a visão geral do Complexo Naval de Itaguaí, como deverá ficar após concluído, na imagem abaixo, já publicada em matéria de janeiro. Nossa visita naquele dia havia começado pela UFEM (Unidade de Fabricação de Estruturas Metálicas), cuja localização se vê no canto superior esquerdo da imagem, vizinha à Nuclep, a alguns quilômetros do mar (já mostramos algumas das obras em matéria sobre a construção de cascos resistentes no Prosub, e voltaremos a mostrar as instalações com mais detalhes em futuro post). Após visita à UFEM percorremos um trecho de estrada, passamos pela área norte da futura Base Naval e passamos por um túnel (também marcado na imagem abaixo) para chegar à área sul. A localização do grande galpão que forma o Estaleiro de Construção, juntamente com seus anexos, está marcada por uma seta no canto inferior direito da imagem.
Logo que se deixa o túnel é possível notar a grande área disponível para a construção das próximas instalações, pois o galpão do Estaleiro de Construção se destaca ainda praticamente sozinho num dos “braços” da área sul (no outro, estão o prédio de simuladores e obras de outras edificações, já mencionadas). Parece pequeno, quando visto ao longe, pois perde-se a referência de dimensões por ainda estarem em obras outros galpões nas proximidades, em meio a estruturas pré-fabricadas de concreto espalhadas pela área.
Porém, à medida em que nos aproximamos, suas grandes dimensões ficaram evidentes, como se vê na imagem de abertura desta matéria, tirada no sentido do mar para terra e reproduzida mais abaixo, à esquerda, junto a uma foto do shiplift, à direita, tirada no mesmo ponto, mas no sentido da terra para o mar.
O shiplift (elevador de navios) será usado nos trabalhos de lançar e recolher os submarinos do mar, que saem do galpão levados por transportadores sobre trilhos. O elevador é capaz tanto de realizar esse procedimento com os SBR, que terão 71,6m de comprimento e perto de 1870 toneladas de deslocamento, quanto com o SNBR (nuclear), cujas dimensões aproximadas serão de 100m de comprimento e 6.500 toneladas de deslocamento. O transportador sobre trilhos é formado por conjuntos como o que se vê na parte à direita da imagem da esquerda, abaixo (equipamento pintado de azul), e também transportará os submarinos para um futuro galpão de manutenção a ser construído à esquerda do Estaleiro de Construção.
O Estaleiro de Construção foi projetado para possibilitar a finalização simultânea de dois submarinos de porte ainda maiores que o SBR (ou seja, pode abrigar com folga o SNBR). No interior do galpão, o Riachuelo nos esperava. Antes de chegarmos ao submarino, passamos primeiro pelo hall de entrada onde um painel, na parede, mostra a concepção artística do futuro Riachuelo (S 40). A imagem será útil como referência para comparar a outras fotos desta matéria, em especial para entender o formato final que terá a parte superior do submarino, quando estiverem instalados todos os painéis que formam o casco externo, ou hidrodinâmico, que se sobrepõem ao cilindro que forma o casco interno, de pressão, também chamado de casco resistente.
No grande galpão, que impressiona pela altura do seu teto, pouco abaixo do qual correm as pontes rolantes para manobras de peso, os mais de 70 metros de comprimento e 12m de altura do futuro Riachuelo parecem pequenos. Cercado de andaimes na imagem abaixo, à esquerda, fica difícil perceber à primeira vista os seus contornos. Por isso publicamos, à direita, foto em ângulo semelhante tirada em ocasião anterior, em 20 de fevereiro, quando o Poder Naval presenciou a cerimônia de início da integração das seções do submarino.
Comparando as duas imagens, fica evidente uma diferença importante além dos andaimes: com a retirada de painéis da proa, do casco hidrodinâmico (ou casco externo) é possível ver um equipamento cilíndrico de superfície azul instalado na parte exposta: trata-se do sonar principal do submarino. Abaixo, à esquerda e à direita, duas fotos mais aproximadas da proa do futuro Riachuelo. Clicando para ampliar, é possível perceber os contornos das seis aberturas para os tubos de lançamento de torpedos (TLP), situados logo acima do sonar.
Nas duas imagens abaixo, em ângulos semelhantes, podemos ver a mesma seção de proa em perfil. Na de cima, capturada em 4 de junho, a parte aberta pela retirada dos painéis deixa a proa com formato semelhante a uma boca de baleia. Na de baixo, vemos a mesma área fotografada em 20 de fevereiro, com os painéis de revestimento do casco externo instalados.
Cabe ressaltar aqui, para os leitores menos acostumados a detalhes técnicos de submarinos, as diferenças entre casco interno (ou casco de pressão / resistente) e casco externo ou hidrodinâmico. Nesta parte ampliada de concepção artística do interior de um SBR, abaixo (imagem DCNS / Naval Group) pode-se ver na proa tanto o sonar quanto os tubos lançadores de torpedos e de mísseis, na cor branca (e, acima destes, a escotilha também branca para o carregamento externo de torpedos e mísseis, da qual voltaremos a falar).
Os tubos se conectam à calota de vante do casco de pressão (clique para ver matéria anterior com imagens dessas estruturas) e são cercados por um tanque de lastro. Ou seja, o casco externo, hidrodinâmico, é alagável, e por isso pode resistir à pressão da água em profundidade devido à pressão se igualar dos dois lados de suas chapas, que podem ser de aço mais fino ou mesmo de materiais como fibra de vidro. O sonar também é posicionado para operar permanentemente alagado, mesmo com o submarino na superfície. Da calota de vante para trás, o que vemos é o casco resistente, que precisa ser fabricado com chapas mais grossas e cavernas (estruturas anelares) de pouco espaçamento,de forma a resistir à diferença entre a pressão da água, externa, e a pressão atmosférica (interna).
Se a visão interna do submarino, na concepção artística, lhe deixou com vontade de entrar logo no Riachuelo, segure um pouco mais a ansiedade e venha com a gente olhar rapidamente as seções seguintes, na direção da popa, que também mostram detalhes interessantes de sua construção. Na visita em 4 de junho, destacava-se uma grande lona (imagem abaixo, à esquerda) protegendo a união de duas seções que, quando visitamos o estaleiro da última vez, em 20 de fevereiro, ainda estavam separadas, como se vê na foto da direita.
Na concepção artística acima, esta região do submarino está no canto esquerdo da imagem, marcando a separação entre as áreas habitáveis (como os alojamentos da tripulação) e as praças de máquinas, entre as quais fica uma grande escotilha para a entrada e saída de mergulhadores de combate, que também é a principal saída para resgate da tripulação, em caso de emergências (vê se parte dessa escotilha na foto da direita, canto superior esquerdo).
As duas seções foram soldadas recentemente, marcando a união final do submarino, que agora só pode ser acessado pelos trabalhadores que o finalizam passando pelas escotilhas de acesso, e não mais pelas seções abertas. Esse trabalho de solda leva três dias para ser realizado em todos os seus procedimentos, conforme nos foi informado na ocasião, e é supervisionado por um engenheiro naval da Marinha do Brasil treinado especialmente para essa tarefa.
Mais abaixo, vemos mais uma comparação de duas fotos de outras seções mais à popa, agora também unidas. Na imagem da direita, de 20 de fevereiro, vemos a última seção do casco resistente, à popa, ainda separada, mostrando em seu interior o Motor Elétrico Principal (MEP) e, externamente, um “dente” formado pelo local onde se conectam o casco de pressão ao casco externo, bem sobre a calota de ré do casco resistente. Esse dente, visível também na imagem da esquerda, de 4 de junho, será coberto por placas de fibra de vidro, suavizando a união entre os cascos.
A suavidade das linhas das superfícies de controle de popa também é bem perceptível, tanto nas imagens acima quanto na foto mais aproximada abaixo, na qual se vê também uma lona cobrindo o hélice. Também é possível ver as marcações em vermelho de painéis que cobrem essa parte do casco externo. Trabalhos de solda estavam sendo feitos nessa área na ocasião.
É hora de voltar para perto da vela do submarino, vista na foto abaixo à direita cercada de andaimes e escadas. Subindo os três primeiros lances, chega-se ao nível da escotilha de entrada, logo atrás da vela, pela qual subimos para entrada nas obras finais do futuro Riachuelo. É grande a circulação de operários e engenheiros no local, e um tipo de painel eletrônico mostra todos os que estão num dado momento no interior do casco, e em que seção. Foi solicitado que não fotografássemos essas informações em close, que mostram os nomes do pessoal. Pelo mesmo motivo, nas imagens desta matéria em que eventualmente é possível ver seus rostos, editamos as fotos para descaracterizar suas faces e respeitar sua privacidade.
É hora de entrar no Riachuelo! Desça conosco os degraus, seguindo os passos do contra-almirante engenheiro naval Celso Muzutani Koga, visto na imagem abaixo, que nos acompanhou por todo o dia (numa das próximas matérias desta série abordaremos a palestra que Koga proferiu ao início da visita) e é o gerente do Empreendimento Modular de Obtenção de Submarinos. Nas fotos seguintes, já no interior do Riachuelo, podemos ver outra pessoa descendo a escada que dá no interior dos compartimentos habitáveis do submarino (no caso, outro editor do Poder Naval, Guilherme Poggio).
É possível ver, nas fotos acima e abaixo, algumas das estruturas para os beliches e para fixação de divisórias para o rancho, banheiros e outras partes dessa grande seção, que foi alongada no SBR em relação ao Scorpene original. Um dos motivos para o alongamento foi a melhoria das condições de habitabilidade em missões de mais longa duração – por exemplo, os beliches do projeto original eram posicionados no sentido transversal, enquanto os do SBR ficam na posição longitudinal, mais confortável para o repouso em meio às manobras do submarino em movimento, seja na superfície ou emerso. Outro motivo foi o requisito brasileiro de maior autonomia para as missões do submarino, que podem chegar a mais de 70 dias (na classe “Tupi”, por exemplo, a duração é de cerca de 45 dias) e chegar a 13.000 milhas náuticas de navegação (com Snorkel).
Abaixo do piso dos alojamentos, por onde andamos, estão situados tanques de combustível e outras áreas de armazenamento de água e víveres, que com o alongamento dessa seção ganharam maior capacidade. Todo esse trecho do submarino pode ser visto na parte direita da concepção artística acima. Na direção da popa, ficam os motores diesel e geradores (tendo abaixo deles o compartimento de baterias de popa) mas não foi possível visitar essa parte devido aos trabalhos que estavam sendo realizados, e que dificultavam o acesso. Então seguimos na direção da proa, entrando no compartimento de manobra e de combate do futuro Riachuelo, onde nos próximos meses serão instalados tanto os consoles para governo do submarino como os sistemas de combate e o periscópio de ataque, cujo fosso pode ser visto na imagem abaixo.
Inúmeros fios e cabos elétricos estão sendo conectados e toda a instalação está sendo preparada para receber os consoles deste que é o “cérebro” do submarino. Clicando nas imagens acima e abaixo para ampliar, pode-se perceber as estruturas de suporte dos gabinetes, além dos vários tubos e conduítes que passam pelas paredes e pelo teto.
Os 6,2m de diâmetro interno do casco resistente parecem pequenos para conter tantos equipamentos, mas é bom sempre lembrar que estamos andando em meio a uma obra em andamento, em sua fase final. A instalação dos consoles e interfaces certamente dará um aspecto mais organizado ao local, que deverá ficar com a aparência totalmente funcional que pudemos ver no simulador, visto na foto mais abaixo.
A parte ampliada da concepção artística, acima, mostra logo abaixo da vela o compartimento de manobra e, na direção da proa, a praça dos torpedos (abaixo da qual fica o conjunto de baterias de proa). Vamos na direção desse grande compartimento, e descemos ligeiramente o nível do piso, em alguns centímetros, para acessar essa área na extremidade anterior do casco resistente (embora, como já vimos, a proa se estenda por mais alguns metros para abrigar o tanque de lastro de vante, os tubos de torpedos e o sonar, no casco externo).
Bem à frente, destaca-se uma abertura isolada na parte superior: trata-se da escotilha por onde adentram torpedos e mísseis para municiar o submarino. Nesse compartimento e no interior dos seis tubos podem ser transportadas até 18 armas, na combinação desejada entre torpedos pesados F21 (o mais novo tipo de torpedo francês, mísseis SM-39 SubExocet e minas submarinas. Entre as caixas de ferramentas e pranchas de compensado que as suportam provisoriamente, está o sistema de movimentação de armas que municia os tubos.
Hora de sair do Riachuelo, pois outra leva de visitantes da imprensa especializada ainda iria adentrá-lo, entre as idas e vindas de operários, mas isso não quer dizer que nossa visita tenha acabado – ainda há muitos detalhes interessantes a mostrar.
Saindo da escotilha de acesso e olhando para a popa, no sentido da lona que protege as seções recentemente unidas (que já mostramos), é possível ver uma série de suportes presos ao casco resistente, tanto na parte superior quanto na direção das laterais, onde vemos dois trabalhadores na imagem abaixo. Nesses suportes, a maioria em formato de “T”, serão presos painéis do casco hidrodinâmico / externo que melhoram a fluidez da água dessa parte superior do casco e o desempenho quando em superfície (mas também em imersão, ao formar um contorno mais suave de ligação com a vela), assim como permitem caminhar por sobre o submarino emerso com mais facilidade. Comparando esta foto com a imagem mais abaixo, da concepção artística vista na entrada do galpão, é possível perceber o formato final que terá essa parte do futuro Riachuelo.
Seguindo em direção à proa, logo à vante da vela podemos ver diversos desses painéis do casco externo já fixados e outros em fixação. Eles cobrem diversas tubulações de água e ar-comprimido e equipamentos relacionados ao tanque de lastro de vante, mais abaixo, entre outros itens que ficam “escondidos” entre o casco hidrodinâmico e o de pressão. Olhando com mais atenção o painel mais à direita nas fotos, percebe-se que ele é de material não metálico, no caso uma fina fibra de vidro. No SBR 1 (Riachuelo) esses painéis vieram da França, mas para outros submarinos da classe o fornecimento está a cargo de uma empresa de São José dos Campos (SP), conforme nos disse o contra-almirante Koga enquanto observávamos os trabalhos nessa seção
Painéis de fibra de vidro também fazem o suave contorno hidrodinâmico da conexão entre a vela e o casco, numa curva que bem caracteriza o tipo Scorpene. Na imagem abaixo, esses painéis ainda não estão totalmente fixados. Quanto à vela, tanto sua estrutura quanto seu revestimento são metálicos. Toda essa parte do submarino, com os suportes para os painéis do casco externo em sua área superior e outros detalhes, como os suportes para a instalação do sonar de flanco, são vistos na imagem mais abaixo, de 20 de fevereiro, quando o Riachuelo ainda não estava cercado de andaimes.
E assim terminamos nossa visita ao submarino que deverá ser lançado ao mar em 12 de dezembro, praticamente daqui a seis meses. Serão 180 dias de intensa atividade no interior e exterior do casco para que o prazo seja cumprido, e o ritmo intenso de atividade que vimos no Estaleiro de Construção indica que sim.
Finalizamos esta matéria com duas imagens do autor em ocasiões diferentes em frente ao Riachuelo, prestando uma homenagem não só ao trabalho da Marinha em sua Data Magna, mas a todos os leitores do Poder Naval, a grande maioria dos quais certamente gostaria de estar posando para fotos nas mesmas ocasiões. Esperamos com esta matéria ter dado a todos o “gostinho” de visitar tanto o estaleiro quanto o submarino em construção, sentindo as mesmas sensações que nós, e observando os detalhes que pudemos perceber em nossa visita, como se estivessem em nosso lugar. Em breve, mostraremos mais matérias sobre os demais submarinos em construção no Complexo Naval de Itaguaí.