Por: Fernando “Nunão” De Martini

Quando visitamos o Complexo Naval de Itaguaí, em 4 de junho, foi distribuído como subsídio informativo um folheto com uma interessante tabela comparativa. A tabela traz dados (boa parte deles apenas aproximados, como é de se esperar para informações sensíveis) comparando os submarinos da classe “Tupi”, atualmente em serviço na Marinha do Brasil, com os futuros S-BR, de propulsão convencional diesel-elétrica, e SN-BR, de propulsão nuclear, do Prosub (Programa de Desenvolvimento de Submarinos).

Publicamos abaixo uma reprodução da tabela, na qual se pode conferir várias informações de interesse para discussão (clique na imagem para ampliar).

Autonomia – Uma dessas informações é a considerável diferença de autonomia entre o S-BR e a classe “Tupi”: um aumento de 45 dias para 70 dias. Como comparação, o  Scorpene original, como o modelo operado pelo Chile, sem a seção acrescentada ao S-BR que permitiu ampliar a capacidade de combustível e víveres (além de melhorar a habitabilidade), tem autonomia de cerca de 50 dias.

Em relação à classe “Tupi”, o S-BR poderá navegar até 13.000 milhas (com snorkel), contra 10.000 milhas náuticas. Já no caso do SN-BR, devido ao reator nuclear que pode produzir energia por vários anos antes da troca dos elementos combustíveis nucleares, o limite para sua autonomia é dado pela resistência de sua tripulação e duração dos víveres transportados a bordo, e não pelo combustível (diesel) transportado nos tanques, como é o caso dos convencionais.

Velocidades – A velocidade máxima “snorkeando” do S-BR e da classe “Tupi” é superior a 11 nós, conforme a tabela. Já sem o uso do snorkel, ou seja, abaixo da cota periscópica e empregando apenas a energia acumulada nas baterias, o alcance indicado no folheto é o mesmo: 400 milhas náuticas a 4 nós (o que, numa conta simples, significa 100 horas de navegação mergulhado a essa velocidade).  Ambos os tipos são capazes de velocidades de pico (submersos e empregando apenas a energia das baterias) de cerca de 20 nós, porém sabe-se que essa velocidade pode esgotar as baterias em poucas horas – embora esse tempo não seja, obviamente, divulgado.

Porte do SN-BR – Em relação ao submarino nuclear, primeiramente chama a atenção o seu porte: com o comprimento total superior a 100 metros e diâmetro interno do casco resistente maior que 9 metros, o deslocamento do SN-BR está projetado em aproximadamente 6000 toneladas quando na superfície, e 6.500 toneladas em imersão. Esses números são semelhantes aos da consagrada classe “Los Angeles” de submarinos nucleares da Marinha dos Estados Unidos. Abaixo, uma comparação do S-BR com o SN-BR:

S-BR e SN-BR

Velocidade do SN-BR – Outro dado que chamou a atenção foi a velocidade máxima do SN-BR quando mergulhado (abaixo da cota periscópica), divulgada no folheto como “>19 nós”. Em comparação, os dados do S-BR e da classe “Tupi”, na mesma tabela, são de >20 nós. Essa velocidade máxima do SN-BR causou estranhamento à primeira vista. É certo que esse valor, ou números próximos a ele, poderão ser mantidos por longo tempo no SN-BR, devido à propulsão nuclear que permite grandes deslocamentos submersos em alta velocidade, frente às pouquíssimas horas permitidas pelas baterias no caso dos submarinos convencionais, quando em velocidades de pico semelhantes.

Também é certo, por outro lado, que o porte do SN-BR (6.500t), é cerca de duas vezes maior que, por exemplo, a classe “Rubis” francesa, equipada com reator de potência térmica similar, de 48MWt, e que é creditada com velocidades acima de 25 nós em mergulho. Ainda assim, esperávamos um valor que, mesmo eventualmente abaixo da classe “Rubis” devido ao porte maior do SN-BR frente a uma potência semelhante, ficaria não tão distante dela – mesmo porque, em materiais mais antigos divulgados pela própria Marinha, dizia-se que “a planta de propulsão, desenvolvida pelo Centro Tecnológico da Marinha em São Paulo, garantirá a navegação à velocidade acima de 20 nós.” Clique aqui para baixar folder do Prosub com essa informação, do qual reproduzimos abaixo uma parte:

Porém, é fato que, mundialmente, esses dados não costumam ser divulgados em números exatos, por serem classificados – velocidades máximas em emergência, por exemplo, costumam ser mais altas que as máximas divulgadas para o público. Daí também o costume de não divulgar valores exatos, e sim com o uso do “maior que” (símbolo >). E isso não é diferente no caso do programa brasileiro, e nem deveria ser. Questionamos nosso anfitrião na visita a Itaguaí, Contra-Almirante (EN) Celso Muzutani Koga, Gerente do Empreendimento Modular de Obtenção de Submarinos, sobre essa informação. Ele gentilmente nos respondeu que, realmente, esse dado é classificado, e que a informação que pode ser disponibilizada é a que está no folheto.

Como o projeto do SN-BR seguiu para a fase de detalhamento, e as obras no protótipo em terra de sua propulsão nuclear (LABGENE) prosseguem com previsão de testes completos e início de comissionamento em 2021 (e a tecnologia que permite o aproveitamento da potência térmica de reatores evoluiu desde a mencionada classe “Rubis”), as variáveis que poderão influir na velocidade máxima do primeiro submarino nuclear brasileiro – seja ela divulgada ou não – ainda poderão passar por alterações até que ele esteja em construção, o que é previsto para meados da próxima década.

Sonares e comunicações – Entre outras informações disponibilizadas na tabela, de interesse para a discussão, estão a introdução no Prosub de tecnologias e capacidades não existentes na atual classe “Tupi”, não só na detecção, como o uso de sonar de flanco (Flank Array – LOFAR), como na comunicação, com sistemas Narrow Band (Longa distância e Classificação) e capacidade VLF em imersão, com uso de antena flutuante. O SN-BR deverá dispor de sonar rebocado (Towed Array – LOFAR). Em comum entre S-BR e SN-BR, estão os mastros não penetrantes para os periscópios optrônicos, radar e comunicações (nos Tupis, apenas as Medidas de Apoio à Guerra Eletrônica – MAGE – e o esnorquel não são do tipo penetrante).

Observação: a concepção artística do alto da matéria mostra o submarino Tikuna por motivos estéticos, assim como um SN-BR com lemes em X, apenas para fins ilustrativos. As configurações do SN-BR mais recentes divulgadas são semelhantes às do S-BR, como a versão em escala reduzida para testes em tanques de prova da foto abaixo:

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