Entrevista: Jornalista Roberto Lopes revela bastidores do fim da gestão Leal Ferreira

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Jornalista Roberto Lopes

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O Comando da Marinha do Brasil (MB) estuda anunciar a data de 14 de dezembro – antepenúltima sexta-feira de 2018 – para o lançamento do submarino Riachuelo, primeiro navio da classe Scorpène. A data originalmente fixada é a de 12 de dezembro.

Nesse momento, a direção da companhia francesa Naval Group (ex-DCNS) está empenhada em uma articulação que visa trazer o presidente Emmanuel Macron ao Brasil neste fim de ano, para assistir à transferência do navio para a água, como convidado da Marinha e do governo Michel Temer.

As informações foram passadas ao Poder Naval pelo jornalista e colaborador Roberto Lopes, de 65 anos.

Lopes falou com exclusividade ao PN sobre os bastidores da Força Naval na reta final da gestão do almirante de esquadra Eduardo Leal Ferreira. Eis os seus principais trechos:

Poder Naval – Essa tentativa de se trazer o presidente Macron ao Brasil está, de alguma forma, ligada à oferta de corvetas da Classe Gowind para a concorrência da Classe Tamandaré?

Roberto Lopes – Certamente sim, mas esse é só um aspecto desse ambiente de cooperação tecnológica militar estabelecido há cerca de dez anos entre a França com o Brasil na área naval, que os franceses não querem, de jeito algum, deixar que enfraqueça.

PN – Por causa da meta da MB de, no futuro obter um novo porta-aviões, do PROSUB [Programa de Desenvolvimento de Submarinos]…

Lopes – O momento é de equacionar o futuro do PROSUB. Recentemente o internauta Foca, que parece ser de Marinha, aludiu à possibilidade de a MB exportar os submarinos SB-2 e SBR-3 como forma de garantir recursos para a construção do SBR-4. Outros foristas acharam a ideia descabelada, desacreditaram dessa informação, mas ela está correta. Pelo que eu soube, uma das ideias é incorporar o SBR-1, e vender o SBR-2 ao exterior. Dessa maneira a ICN [Itaguaí Construções Navais, joint venture formada pela Naval Group e pela empreiteira brasileira Odebrecht] estaria capitalizada para bancar a construção do SBR-3 Tonelero. Cada navio da Classe Riachuelo exportado irá gerar, para a ICN, um faturamento da ordem de 550/600 milhões de dólares. O Scorpène brasileiro nº 4 seria, de novo, exportado. Mas tudo isso sem que a MB desistisse de ter os seus quatro Scorpènes. Apenas o comissionamento desses barcos seria dilatado no tempo, talvez por toda a década de 2020, o que, é preciso ressaltar, desagrada bastante alguns oficiais superiores da Marinha inteirados dessa alternativa.

Submarino Riachelo na Cerimônia de Início da Integração, em fevereiro de 2018
Submarino Riachelo na Cerimônia de Início da Integração, em fevereiro de 2018

PN – Mas, na sua opinião, isso é só uma ideia ou há chances de que ela seja mesmo posta em prática?

Lopes – Não é só uma ideia não. Pelo que eu soube, no fim do ano passado, o diretor de Desenvolvimento Nuclear e Tecnológico da Marinha, almirante de esquadra Bento Costa Lima Leite de Albuquerque Júnior, viajou à Polônia, acompanhado de representantes da Naval Group, para tentar interessar a Marinha polonesa nesse esquema. A negociação só não avançou porque a Força Naval de lá já estava comprometida com a aquisição de submarinos de tecnologia alemã TKMS que serão construídos na Noruega. O que a Marinha está, de fato, buscando, é um mecanismo de financiamento para os seus Scorpènes que não implique no estrangulamento financeiro da Força, como tem ocorrido nos últimos três anos…

PN – Nesse cenário é fácil lembrar que a Marinha da Argentina precisa muito de submarinos novos…

Lopes – E também que a ICN vai precisar de clientes que tenham capacidade de pagar pelos navios… Quem sabe o Peru, ou a Colômbia…

PN – E agora, além desse problema com o suporte para o PROSUB, ainda há a questão da Classe Tamandaré…

Lopes – Em fevereiro de 2015, quando teve início a Era Leal Ferreira, poucos acreditavam que ela pudesse se destacar, no quesito realizações, diante dos sete anos da gestão Moura Neto. Mas o fato é que isso aconteceu. Considero a Administração do atual Comandante da Marinha um marco na História da Força. Mas o fato é que, nessa reta final, ela vem, nos bastidores, sendo agitada por três eventos: a mobilização do Naval Group para renovar seus laços com a Marinha do Brasil, as perspectivas do novo governo Jair Bolsonaro para a Marinha, que pode ter efeitos diretos sobre a escolha do consórcio vencedor do Programa Tamandaré, e as movimentações dos três ou quatro oficiais de quatro estrelas que se julgam aptos a suceder o almirante Leal Ferreira…

PN – Não é pouco…

Lopes – Não é. E as informações que permitiriam que raciocinássemos com um mínimo de acerto sobre o que vem por aí estão, claro, guardadas a sete chaves. O primeiro mistério a resolver é o que trata do futuro imediato do relacionamento do Naval Group com a MB. Apesar da proposta da corveta Gowind, pomposamente chamada de Gowind 3000, enquadrar um navio de qualidades técnicas e marinheiras, no meu ponto de vista, inferiores às dos barcos do consórcio Damen e da TKMS, eu, pessoalmente, nunca desacreditei das chances da corveta francesa, em função do aspecto político, ou, em outras palavras, de todo o ambiente de cooperação França-Brasil. O almirante Leal Ferreira e o Almirantado tiveram muita coragem, ano passado, ao decidir rejeitar o gasto absurdo de 1,5 bilhão de dólares para modernizar o porta-aviões de origem francesa São Paulo. Mas, dessa vez, a cúpula da Marinha está sendo forçada a, de novo, sentar para ouvir os franceses. Leal Ferreira está seguindo para a França, acompanhado de vários dos seus oficiais-generais. Qual é a pauta desses encontros? A necessidade de, mais uma vez, renegociar os pagamentos do PROSUB? O esforço para exportar dois dos submarinos em construção no complexo de Itaguaí? O adiamento para 2030 da construção do primeiro submarino nuclear brasileiro? E o que a Marinha do Brasil precisará dar em troca? A aquisição dos quatro navios Gowind 3000? Um pré-contrato para o início da construção, dentro de dez ou 12 anos, do futuro porta-aviões brasileiro? Ou uma cessão de área, em Itaguaí, para que o Naval Group possa estabelecer uma base operacional nas Américas?

PN – O complexo de Itaguaí ficou grande demais para a Marinha do Brasil?

Lopes – Ficou um complexo naval militar de 1º Mundo para um país que, por todos os seus indicadores tecnológicos e sociais ainda é de 3º Mundo…

PN – E o que fazer então?

Lopes – Soube que a Marinha vem pensando em aproveitar sua base em Itaguaí para, por exemplo, reparar navios de operação off shore

Itaguaí – Estaleiro e Base Naval
Itaguaí – Estaleiro e Base Naval

PN – E ainda há o advento do novo governo…

Lopes – Isso; que, para os militares, caso o candidato Jair Bolsonaro confirme o favoritismo mostrado pelas pesquisas, sugere um prognóstico animador, de maior apoio. Especialmente sob o aspecto financeiro. E, obviamente, com um ministro da Defesa [General Augusto Heleno] que, além de ser do ramo, pertence ao círculo íntimo do futuro chefe do governo.

PN – Será que deputado Bolsonaro influirá na decisão da Classe Tamandaré?

Lopes – A lógica e a prudência mandam que sim. A Marinha e o Ministério da Defesa não tomariam uma decisão dessas, sobre uma aquisição bilionária e estratégica sem ouvir o chefe da Nação, que, além de tudo, é um militar…

PN – É possível saber o que se comenta sobre isso nos bastidores da Marinha?

Lopes – Há rumores sim. Por exemplo: o consórcio liderado pela TKMS tem, entre as empresas brasileiras que o apoiam, a Embraer, e me dizem que a Embraer tem boas ligações com o deputado Jair Bolsonaro…

PN – Qual é o papel previsto para a Embraer na oferta feita pela TKMS?

Lopes – Basicamente o de integradora de sistemas eletrônicos e, claro, de empresa que vai absorver toda, ou quase toda, a transferência da tecnologia que os alemães forem fazer para a MB na parte de sistemas eletrônicos dos navios…

PN – Há outros rumores sobre a ligação da concorrência das Tamandarés com Jair Bolsonaro?

Lopes – Muitos oficiais se perguntam sobre qual será a atitude de Bolsonaro em relação a uma possível opção da Marinha pelos navios da classe apresentada pelo grupo italiano Fincantieri, cujo estaleiro fica no litoral de Pernambuco. O candidato do PSL não vem sendo bem votado no Nordeste. Isso impedirá o Fincantieri de ficar com o contrato? Ou Bolsonaro, justamente para melhorar sua imagem entre os nordestinos, confirmará uma eventual opção da MB pelo Fincantieri?

Concepção em 3D da Corveta classe Tamandaré
Corveta classe Tamandaré

PN – É possível, portanto, que, a essa altura, os demais concorrentes do Programa Tamandaré, já estejam tentando acessar o deputado Bolsonaro…

Lopes – Certamente. Mas eu apostaria que, em função da forte admiração que o deputado tem pelas soluções tecnológicas de Israel para a produção agrícola em regiões desérticas, ou áridas, Jair Bolsonaro possa aproximar os militares brasileiros da indústria militar israelense, que, em certos setores, já tem bases fincadas no Brasil.

PN – Por último há a questão da sucessão do almirante Leal Ferreira…

Lopes – Um assunto bem delicado. Em uma das minhas postagens aqui no PN eu até escrevi sobre o prestígio do atual secretário-geral da Marinha, almirante Liseo Zampronio, da admiração que o almirante Leal Ferreira tem por ele…

PN – Isso mudou?

Lopes – Claro que não, mas é preciso lembrar que há outros oficiais no coração do atual Comandante da Marinha, como o almirante Bento, que ele escolheu para supervisionar toda a produção de submarinos no país, e o almirante Celso Nazareth, seu ex-chefe de Gabinete, que faz um trabalho muito elogiado à frente da Diretoria-Geral do Pessoal…

PN – Então temos três favoritos…

Lopes – Temos quatro porque, ao que me disseram recentemente, o atual chefe do Estado-Maior da Armada, almirante Ilques Barbosa, também sonha em ser escolhido para suceder Leal Ferreira…

PN – Mas o almirante Ilques não passa para reserva no fim do mês que vem?

Lopes – Passa. Mas ele só entregará o cargo de chefe do EMA em meados de janeiro de 2019. Até lá estará usando, regularmente, o seu uniforme de almirante de quatro estrelas.

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