EXCLUSIVO: Finalistas do Programa Tamandaré reforçam seus planos para o AMRJ
Por Roberto Lopes
Especial para o Poder Naval
Faltando cerca de dez semanas para que a Marinha do Brasil (MB) anuncie o nome do consórcio internacional vencedor da encomenda de quatro escoltas da nova Classe Tamandaré, parte dos finalistas selecionados a 15 de outubro último para a reta final da disputa se move no sentido de oferecer aos almirantes brasileiros duas garantias: a de que sua proposta implicará na modernização do Arsenal de Marinha do Rio de Janeiro (AMRJ) – sonho de muitos chefes navais –, e a de que a oferta de fabricação dos navios está lastreada no potencial de um estaleiro do território nacional com real capacidade de atender o serviço.
O grupo italiano Fincantieri, listado em terceiro lugar na relação de consórcios que compuseram a short list, já informou à MB: apesar de pretender construir os navios da série Tamandaré no VARD Promar – seu estaleiro do complexo portuário de Suape, no estado de Pernambuco –, realizará todas as manutenções dos navios em uma área selecionada das instalações do Arsenal do Rio, que se compromete a requalificar tecnicamente.
Na noite desta segunda-feira (07.01), um representante da empresa alemã ThyssenKrupp Marine Systems (TKMS) – classificada em segundo lugar no short list – garantiu à reportagem do PN, exatamente a mesma coisa: toda a manutenção das corvetas Tipo Meko A100, de 3.200 toneladas, a serem fornecidas à MB será feita no AMRJ. E que esse assunto será discutido diretamente entre as partes (TKMS e MB) durante uma reunião prevista para a semana que vem.
A conversa será importante por que alguns almirantes estão entendendo que a TKMS desistiu de finalizar os navios no estaleiro Oceana, da cidade de Itajaí (SC).
“Apesar de algumas partes ou seções [do navio] serem construídas em Santa Catarina”, explicou ao PN um oficial envolvido na análise das propostas, “as seções principais e a montagem [do navio] serão feitas em estaleiro localizado no Rio de Janeiro”. Mas o PN ainda não conseguiu determinar a que estaleiro a fonte se refere: se a um privado ou ao próprio AMRJ.
A firme reviravolta dos concorrentes no sentido de prestigiar o Arsenal de Marinha vai ao encontro a uma antiga convicção de alguns almirantes, que sempre entenderam que o melhor para a MB em geral – e para a revitalização do AMRJ em particular – era fixar a construção da Classe Tamandaré no velho e histórico Arsenal sediado na Ilha das Cobras, na Baía da Guanabara.
Caso, por exemplo, do oficial ouvido (sob a condição do anonimato) pelo PN: “Historicamente os estaleiros privados brasileiros não conseguem dar continuidade à construção dos navios para a MB. Desde o início deveríamos ter obrigado os concorrentes a construir os navios da Classe Tamandaré no AMRJ, por meio de uma grande reforma em suas instalações. Sempre defendi isso. Na forma como estão estruturados, nossos estaleiros privados não terão como se sustentar. Dependem exclusivamente de encomendas da Petrobras e da MB. A sacada da Fincantieri de modernizar parcialmente o AMRJ foi boa”.
Navio Polar – O debate sobre o local mais apropriado do território brasileiro para receber os contratos de construção de navios militares não é novo e, ao que tudo indica, terá novos capítulos já neste primeiro ano da gestão do almirante Ilques Barbosa Júnior como Comandante da Marinha.
Na manhã do último dia de 2018, ao conversar, pelo telefone, com a reportagem do PN, o diretor do Centro de Comunicação Social da Marinha (CCSM), contra-almirante Luiz Roberto Cavalcanti Valicente, não escondeu seu entusiasmo pelo fato de, no apagar das luzes de 2018, sua Força ter conseguido equacionar financeiramente a construção de um novo navio polar.
“O Ary Rongel [navio de pesquisas usado com maior intensidade pela MB em suas campanhas na Antártica] está chegando ao fim da sua vida útil”, lembrou Valicente. “Felizmente, com a ajuda do Ministério do Planejamento e do Tesouro Nacional conseguimos autorização para reunir os recursos necessários à construção de um novo navio polar, por meio da capitalização da EMGEPRON”.
O sistema será, portanto, o mesmo que vem garantindo a verba necessária ao Programa da Classe Tamandaré. Custo do navio polar? “Uns 300 milhões”, informa o chefe do CCSM.
E esse navio também será encomendado a um estaleiro no exterior, como foi o caso do navio de pesquisas hidroceanográfico Vital de Oliveira? “Não necessariamente”, rebate Valicente. “Poderia até ser feito aqui mesmo no Brasil, sob planos comprados a um estaleiro com experiência comprovada na construção de quebra-gelos”.
A encomenda do navio polar pode até parecer um aspecto menor do programa de recuperação dos meios flutuantes da MB, mas isso não passa de impressão.
Ela reforça o investimento que a Força Naval faz na recuperação de sua Estação Antártica Comandante Ferraz – destruída em um incêndio em fevereiro de 2012 – e recoloca a MB no time das Marinhas sul-americanas que vêm investindo em modernos navios de pesquisas polares – casos de Argentina, Peru e Chile (a Colômbia, sem dinheiro, optou por dotar um de seus navios-patrulha oceânicos classe Fässmer com reforços estruturais no casco que o tornam apto a travessias polares).
Helicóptero usado – Palco, em abril de 2007, de um incêndio que destruiu 70% das suas instalações, o quebra-gelos argentino ARA Almirante Irízar (indicativo de casco Q5), de 121,3 m de comprimento e 15.000 toneladas de deslocamento, precisou de dez anos para voltar à ativa.
As cifras exatas de sua reconstrução nunca foram suficientemente esclarecidas pela Administração Peronista de Cristina Fernández de Kirchner, mas estima-se que o custo para a Marinha platina não ficou abaixo dos 180 milhões de dólares.
De qualquer forma, o trabalho envolveu uma verdadeira ampliação das capacidades do navio: aumento da área de laboratórios de 74 m² para 415 m², e da capacidade de transportar pessoal, de 245 para 313 tripulantes e cientistas.
Agora, a Armada Argentina tenta obter, nos Estados Unidos, um helicóptero usado tipo Sikorsky SH-60 Sea Hawk, na versão aeronave utilitária, para substituir os antiquados UH-3H Sea Kings pertencentes à 2ª Esquadrilha Aeronaval de Helicópteros da Base Aeronaval Comandante Espora, que embarcam rotineiramente no navio.
A Marinha Peruana pagou 216 milhões de dólares para receber da indústria naval espanhola o navio de pesquisa oceanográfica BAP Carrasco (indicativo de casco BOP-171), de 95,3 m de comprimento e 5.000 toneladas de deslocamento.
O navio tem autonomia para viajar por 51 dias, transportando 50 tripulantes e 60 cientistas.
Maior que o Carrasco será o quebra-gelos que o Chile começou a construir em um de seus estaleiros, no primeiro semestre do ano passado: uma unidade com um importante conjunto de gruas na proa, três conveses de laboratórios e deck de voo à ré. Custo estimado: acima dos 200 milhões de dólares.
O navio brasileiro que substituirá o Ary Rongel deverá ter um comprimento de casco superior a 100 m, tonelagem na faixa das 4.500 toneladas, e capacidade de transportar pouco mais de uma centena de cientistas e operadores da Base Almirante Ferraz. Os almirantes esperam recebe-lo em 2022, último ano da gestão Ilques Barbosa, ou, no máximo, em 2023.
Dois mil e dezoito foi mesmo um ano para a Marinha do Brasil jamais esquecer.