Classe Tamandaré: Fincantieri pode ser favorecida por circunstâncias políticas
Por Roberto Lopes
Especial para o Poder Naval
O cenário é o da disputa internacional pela encomenda dos quatro navios-escolta classe Tamandaré.
Com ao menos três propostas (dos estaleiros Damen, ThyssenKrupp e Fincantieri) muito parecidas em termos de benefícios técnicos e financeiros para a Marinha do Brasil (MB), (1) a simpatia da Administração Jair Bolsonaro pelo governo italiano, e (2) a chance de criar um programa que irá gerar centenas de empregos de expressiva qualificação num estaleiro do Nordeste (Região onde Bolsonaro foi menos votado nas últimas eleições), são fatores que, nesse momento, parecem conferir importante vantagem ao Consórcio “FLV”, liderado pela Fincantieri S.p.A.
Nesta associação, a companhia da Itália caminha ao lado da também italiana Leonardo S.p.A – gigante do Material de Defesa a nível mundial –, do estaleiro Vard Promar, da cidade pernambucana de Ipojuca – experiente na produção de navios off shore e pertencente ao grupo Fincantieri –, da Fundação Ezute e da Ares Aeroespacial e Defesa S.A, dois nomes de destaque da Base Industrial de Defesa (BID).
Há muita coisa acontecendo que contribui para tornar a concorrência da nova série Tamandaré ainda mais importante.
Em primeiro lugar há que se ter em conta a previsão completamente engessada – modorrenta (preguiçosa) mesmo – do futuro imediato da Marinha do Brasil: fabricação dos submersíveis Classe Scorpène no âmbito do PROSUB (Programa de Desenvolvimento de Submarinos; construção da classe Tamandaré e investimento em navios-patrulha (não especificados).
Um panorama sem surpresas que pode vir a ser ampliado pela compra de dois varredores usados da Marinha sueca (ao custo de 230 milhões de dólares) e de um navio de Apoio Logístico britânico classe “Wave” no valor de 100/150 milhões de dólares – ainda que o Comandante da Marinha tenha dito que isso “não é prioridade” para a sua Força.
Em segundo lugar é preciso considerar que a Marinha Real não está planejando se desfazer da sua flotilha de fragatas Tipo 23 com o açodamento que antes se supunha, fosse existir.
Ao contrário. A “linhagem” Type 23 está, nesse momento, recebendo a chamada Manutenção de Extensão de Vida (LIFEX), um conjunto de melhorias que inclui a substituição dos mísseis Sea Wolf pelos novos vetores antiaéreos Sea Ceptor – testados pela primeira vez a 4 de setembro de 2017, a bordo do escolta HMS Argyll.
Precisamente a Argyll seria a primeira unidade a ser disponibilizada para “nações amigas” do Reino Unido – Brasil ou Chile. Ela foi comissionada em maio de 1991 e sua baixa está, por ora, prevista para 2023. Contudo, diante do possível novo status da Defesa britânica pós-Brexit – dissociado das operações militares conjuntas com a União Europeia –, até mesmo a respeitada revista eletrônica UK Defence Journal já admite que a Royal Navy (ou uma parte dela) terá que “se virar” para atender os compromissos que compõem a presença militar de Sua Majestade em cenários distantes, do Golfo Pérsico e do Extremo Oriente.
A HMS Westminster foi a primeira fragata Tipo 23 submetida ao LIFEX – serviço realizado na Base Naval de Portsmouth, sul da Inglaterra.
Além do Sea Ceptor, o navio recebeu um canhão Mk.8 de 4,5 polegadas, capaz de disparar até duas dúzias de projetis altamente explosivos por minuto – para fustigar alvos de superfície, aéreos e em terra –, além de um radar Artisan 3D da BAE Systems, apto a monitorar mais de 800 contatos simultaneamente, a distâncias de até 200 km.
Além disso, o casco da HMS Westminster recebeu uma camada de tinta anti-incrustante (anti-cracas). Melhorias estruturais incluíram a substituição da ponte de comando, a modernização da cozinha e a reforma de sanitários e áreas comuns da tripulação.
Bloqueio – O terceiro e último elemento que reforça a importância dos navios classe Tamandaré, é a incerteza em relação ao tratamento diferenciado (dos antigos governos) prometido pelo presidente Jair Bolsonaro às Forças Armadas.
No fim da semana passada, uma fonte do Poder Naval que serve no Ministério da Defesa contou que, neste momento, o poderosíssimo Ministério da Economia parece totalmente fechado a outros assuntos que não as maquinações em prol da aprovação, no Congresso Nacional, da Reforma da Previdência Social.
Admitindo-se que a Reforma da Previdência seja aprovada nas duas Casas do Parlamento até o fim deste ano, a pergunta que fica é: depois da Previdência virão outros temas econômicos de mobilização (leia-se bloqueio) semelhante na Pasta da Economia?
Isso é importante porque, levando-se em consideração a baixa disponibilidade das fragatas Tipo 23, e as poucas opções de escoltas de 2ª mão, a Classe Tamandaré talvez pudesse produzir um benefício adicional para a Marinha, gerando um Batch 2 de, no mínimo, duas unidades – mais compridas, pesadas e bem artilhadas que os quatro navios iniciais.
Ou seja, uma Tamandaré Mod.2, melhor preparada para as travessias oceânicas (até o Mar Mediterrâneo), e os rigores do Atlântico Sul e do Oceano Índico.
Mas para isso, claro, é preciso dinheiro.
Dentro da Marinha existem poucas dúvidas sobre o engajamento de Bolsonaro nas primeiras unidades da classe Tamandaré, mas será que o mesmo presidente terá tempo (e vontade) de apoiar um segundo lote de navios?
De qualquer forma, uma fonte do PN no setor de Material da Marinha observa: uma Tamandaré encompridada para o Batch 2 sugere que talvez se possa pensar na conveniência de abraçar a proposta do navio de construção modular Sigma 10514, de 107,5 m de comprimento e 2.600 toneladas de deslocamento, apresentada pela indústria naval holandesa Damen, em parceria com o grupo sueco SAAB.
Aliás, nunca é demais lembrar: na short list apresentada pela Marinha em outubro do ano passado, a oferta da Damen apareceu em primeiro lugar.