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Fragata Tamandaré

A pandemia do coronavirus, que já matou mais de 300.000 brasileiros, está impactando fortemente o Programa das Fragatas Classe Tamandaré (PFCT), um dos principais empreendimentos de modernização da frota militar brasileira. E foi isso que fez a Marinha descer um véu de silêncio sobre o projeto.

De acordo com um oficial da reserva que acompanhou de perto a escolha do Consórcio “Águas Azuis” para a renovação de parte da Força de Superfície da Esquadra, tanto o prazo original estabelecido em 2018 para a construção dos quatro navios requeridos pela Armada – 2024 a 2028 –, quanto a suposição de que a unidade “cabeça-de-série” – a ser batizada “Tamandaré” – possa estar à disposição do setor operativo em 2025, não passam, hoje – pior momento da transmissão do vírus no Brasil –, de dados plenamente superados.

E, o que é pior: de dados, ou previsões, cuja revisão é virtualmente impossível, devido a dois fatores: a incapacidade de governantes e especialistas fixarem prazos para a melhoria dos indicadores de saúde, e, sobretudo, a impossibilidade de se garantir que os recursos necessários ao projeto, atualmente estimados na casa dos 9,56 bilhões de Reais, serão mantidos.

No início de março, um ex-Comandante da Marinha confidenciou a este articulista, pelo telefone: “tenho ouvido falar que vem um contingenciamento [de recursos] por aí”.

Maquete da fragata classe Tamandaré
Cronograma original das fragatas classe Tamandaré
Cronograma original das fragatas classe Tamandaré

O Almirante de Esquadra José Augusto Vieira da Cunha de Menezes (Diretor-Geral do Material da Marinha), em uma palestra no canal do Clube Naval no YouTube em outubro de 2020, previu que o primeiro corte de chapa da fragata Tamandaré aconteceria em março de 2022.

A incerteza acerca da disponibilidade de escoltas modernos (e operacionais) em meados da presente década, aptos a garantir desde as operações rotineiras de patrulhamento do Atlântico Sul até as missões mais específicas e de cooperação internacional, devolveu, a integrantes do Estado-Maior da Armada, e a setores das diretorias do Material e da Gestão de Programas da Marinha, a preocupação em identificar meios de 2ª mão prestes a serem desativados, mas úteis ainda.

“A MB trabalha com a hipótese de obtenção de escoltas por compra de oportunidade”, confirmou para o Poder Naval uma fonte da área de Gestão de Programas. “Os navios devem estar em boas condições, e com preços de aquisição, operação e manutenção que não afetem os demais programas da MB em andamento”, completou.

“Além disso os navios deverão operar na MB, por, pelo menos, 15 anos.

“A MB trabalha com a hipótese de obtenção de escoltas por compra de oportunidade”

Quanto a origem destes escoltas, a Força não faz distinção.  Podem vir do Canadá, Reino Unido, Países Baixos, Itália, Coreia do Sul, Japão… Tudo depende das condições que mencionei antes” finaliza o oficial.

Por enquanto, todo o reforço com o qual a Esquadra pode contar resume-se à fragata “Defensora”, da classe Niterói – em reparos desde 2010 (!) –, e o patrulheiro “Maracanã”, da classe Macaé, que está sendo finalizado no Arsenal de Marinha do Rio de Janeiro.

Durante a gestão do almirante Eduardo Leal Ferreira à frente do Comando da Marinha (fevereiro de 2015 a janeiro de 2019), a Marinha da Coreia do Sul disponibilizou para o Brasil (sem custos de transferência), duas corvetas de defesa costeira da classe Pohang, de 1.200 toneladas (carregadas).

A oferta foi dispensada por vários motivos: os navios (a) terem sido construídos entre 1984 e 1989; (b) necessitarem de reparos e manutenção onerosa nas máquinas; (c) precisarem ser submetidos a uma degradação em seu armamento antes da transferência; e (d), de forma geral, nada agregarem, em termos de novidade tecnológica, à Marinha do Brasil.

As Marinhas da Colômbia e do Peru aceitaram, cada uma, duas embarcações da classe Pohang.

NPa500BR

A questão é que o problema gerado pelo coronavirus para a operacionalidade da Marinha pode não redundar, apenas, em uma possível falta de escoltas a curto prazo.

A pandemia também:

(1) irá atrasar a construção, no país, do navio de Apoio Antártico (NApAnt), que se encontra no estágio de definição do projeto, no âmbito do Programa de Obtenção de Meios Hidroceanográficos (PROHIDRO) – e tem a alternativa proposta pelo grupo francês Kership (em parceria com a Itaguaí Construções Navais) como favorita;

(2) deve retardar a prontificação do submarino “Tonelero” (S42),  terceira unidade da Classe Riachuelo – um modelo francês Scorpène alongado –, cujo lançamento ao mar está previsto, pelo cronograma do PROSUB, para dezembro deste ano; e,

(3) o que ainda não é muito levado em conta por alguns observadores, atrasará por anos (no mínimo dois), o Programa de Obtenção de Navios Patrulha (PRONAPA), que prioriza o patrulheiro de 500t (NPa500BR) – cujo detalhamento preliminar (tamanho do casco, calado, motorização, armamento e sugestão de tripulação) foi, praticamente, encerrado, pelo Centro de Projetos de Navios (CPN), do Rio de Janeiro, em dezembro passado.

Nove meses atrás, durante uma visita ao CPN, o então Diretor de Gestão de Programas da Marinha, vice-almirante Alexandre Rabello de Faria, ouviu um briefing sobre o NPa500BR.

Submarino Tonelero no Complexo de Itaguaí, em dezembro de 2020

Vítima

A Sociedade de Propósito Específico “Águas Azuis” é formado pela Thyssenkrupp Marine Systems do Brasil (líder do consórcio), pela Embraer Defesa & Segurança e pela Atech (empresa de alta tecnologia controlada pela Embraer), mas, neste momento, o programa que será executado no Thyssenkrupp Estaleiro Brasil Sul (antigo Oceana), no município de Itajaí, se encontra restrito às atividades passíveis de serem realizadas sem a indispensável integração das equipes de engenheiros, técnicos e militares da Alemanha e do Brasil.

O diretor da Thyssenkrupp para o PFCT e ao menos dois de seus principais assistentes deveriam ter desembarcado no Brasil entre os meses de dezembro e janeiro últimos, mas não foram autorizados a viajar, por causa da elevada taxa brasileira de contaminação pelo covid 19.

Neste mês de março surgiu a expectativa de que a equipe germânica possa alcançar Itajaí em abril, mas, nesses dias de recordes diários de mortes pelo vírus, isso parece bem pouco provável de acontecer.

A própria Marinha já precisou lamentar, ano passado, o falecimento, em um hospital catarinense, de um oficial da reserva fortemente envolvido no PFCT – Comandante Engenheiro Naval Ádson –, que trabalhava na EMGEPRON e sucumbiu ao coronavirus.

A Prefeitura de Itajaí tem mais de 90 vacinadores habilitados, e 34 pontos de vacinação rotineira. O complexo portuário do município continua registrando bom trânsito de cargas. No ano passado foram mais de 15 milhões de toneladas, e, em janeiro, só no Porto de Itajaí, foi registrado um aumento de 6% nessa movimentação, mas ninguém sabe se esse ritmo positivo irá se manter.

O Estaleiro Brasil Sul passou várias semanas fechado, e vem sendo submetido a manutenções e pequenas obras, enquanto não é utilizado para a construção da primeira fragata Tamandaré.

De seu lado, o escritório da EMGEPRON em Itajaí lançou um edital para a contratação de cinco colaboradores (de níveis médio, técnico e superior), que, aprovados nos exames de admissão aos cargos, serão chamados para começar a trabalhar somente a partir de julho deste ano.

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