Há 40 anos, na manhã de 4 de maio de 1982, o sofisticado destróier Type 42 HMS Sheffield (D80) da Royal Navy, foi atingido mortalmente pouco acima da linha d’água por um míssil AM39 Exocet, lançado por um jato Super Étendard da Armada Argentina.

O navio de escolta britânico atuava como “piquete-radar” e era responsável pela defesa antiaérea de área de unidades maiores da Força-Tarefa britânica, cujo principal objetivo era a retomada das Falklands com um desembarque anfíbio.

Mesmo sendo equipado com um radar de busca aérea de longo alcance e mísseis antiaéreos Sea Dart capazes de atingir um alvo a pelo menos 40 milhas de distância (74 km), o Sheffield não conseguiu detectar a aproximação de dois jatos Super Étendard, nem se proteger do míssil Exocet.

O fantasma da vulnerabilidade de navios de escolta ainda está presente hoje, quase 40 anos depois daquele ataque, apesar dos avanços tecnológicos. A causa disso é uma limitação natural: a curvatura da Terra.

Devido a essa curvatura, a partir da linha do horizonte forma-se uma zona cega à baixa altura, não atingida pelo radar. Assim, o alcance do radar de um navio é limitado pela linha do horizonte, contra alvos voando rente ao mar.

Essa vulnerabilidade também está presente nos radares terrestres e é usada por pilotos de aviões do tráfico de drogas, por exemplo, para escapar à detecção.

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HMS Sheffield (D80)
HMS Sheffield (D80)
Na ilustração, jato Super Étendard argentino lança míssil Exocet
Míssil Exocet AM39

Um ataque que contou com a ajuda da aviação de patrulha

A tática argentina para atingir vasos importantes da RN empregava aeronaves de patrulha marítima, como o P-2 Neptune, que repassavam por rádio os contatos às aeronaves de ataque.

No ataque ao Sheffield, um Neptune realizou a função de esclarecimento marítimo, mudando de altitude constantemente e aproveitando a zona cega dos radares britânicos para efetuar apenas algumas varreduras com seu radar, a fim de minimizar o alerta aos sistemas de MAGE/ECM dos navios britânicos.

P-2 Neptune

Dois Super Étendard decolaram da Base Aérea de Rio Grande armados com um Exocet cada, realizando reabastecimento em voo com um KC-130 Hercules.

Após o reabastecimento, os Super Étendard continuaram nas coordenadas dadas pelo Neptune, voando a 4.500 metros. Depois, desceram para entrar na zona morta dos radares britânicos, evitando a detecção.

Quando os jatos estavam voando rente ao mar, perto das coordenadas especificadas pelo Neptune, receberam uma mensagem da aeronave de patrulha, confirmando um grande alvo no meio e dois menores nas coordenadas 52º33′ sul e 57º40′ oeste. Além desses, o patrulheiro informou sobre outro alvo mediano, a 52º48′ sul e 57 º31′ oeste. Ou seja, o último navio estava distante dos outros a cerca de 30 milhas.

Os jatos prosseguiram para as coordenadas, sempre “colados” na água, elevando-se a poucos metros a mais para realizar apenas algumas varreduras com seu próprio radar de busca a fim de localizar os alvos, evitando ao máximo não alertar os equipamentos MAGE/ESM britânicos. Ambos os pilotos detectaram um alvo grande e três medianos, travaram seus Exocet no alvo maior e, quando estavam a cerca de 50km de distância, lançaram os mísseis.

Do lado britânico

Segundo os relatos dos livros “Wings of Malvinas” do jornalista argentino Santiago Rivas e “One Hundred Days” do Almirante Woodward, o destróier Type 42 HMS Glasgow chegou a detectar a emissão do radar Agave (apelidado de “Handbrake” pelos ingleses) dos Super Étendards argentinos, deu o alarme e lançou foguetes de “chaff”; o HMS Coventry também pegou um contato, mas o capitânia HMS Hermes não deu atenção porque considerou que os contatos eram espúrios — pois muitos contatos falsos tinham sido detectados nos dias anteriores.

O HMS Coventry detectou no seu MAGE/ESM as emissões dos radares Agave dos Super Étendard e também dos radares dos mísseis AM39, mas o HMS Hermes considerou que os contatos eram dos dois Sea Harrier que estavam retornando para o porta-aviões.

O HMS Sheffield, por sua vez, estava transmitindo pelo sistema de comunicações por satélite que interferia com os sistemas de guerra eletrônica.

Os britânicos declararam mais tarde que os argentinos tinham acertado o Sheffield com o Exocet e um outro míssil tinha passado pela proa da fragata Yarmouth. O Exocet, entre suas muitas habilidades, pode mudar seu curso, caso não encontre o alvo e também possui uma espoleta de proximidade para fazê-lo detonar, se passar muito perto de um navio.

Exocet ganhou fama entre o grande público, que assistiu pela primeira vez pela TV a uma guerra aeronaval baseada no uso de mísseis. As lições aprendidas pelas Marinhas foram muitas, dentre as quais destacam-se a vulnerabilidade de navios construídos com partes em alumínio, a necessidade de aeronaves de alerta aéreo antecipado e o desenvolvimento de sistemas de defesa aproximada antimíssil (CIWS).

O HMS Sheffield sofreu um incêndio após o impacto do míssil que matou 20 tripulantes e feriu outros 26. O navio acabou afundando no dia 10 de maio de 1982 quando era rebocado.

Tripulante ferido do Sheffield chegando com queimaduras a bordo do HMS Hermes. Vinte pessoas morreram e 26 ficaram feridas no ataque ao HMS Sheffield

O tamanho do rombo provocado pelo impacto do míssil Exocet AM39 no HMS Sheffield. Até hoje há dúvidas se o a cabeça explosiva do míssil explodiu ou não, mesmo entre os tripulantes. O fato é o combustível residual acabou provocando um incêndio que se alastrou rapidamente em todo o navio. 20 tripulantes perderam a vida.
O tamanho do rombo provocado pelo impacto do míssil Exocet AM39 no HMS Sheffield. Até hoje há dúvidas se a ogiva do míssil explodiu ou não, mesmo entre os tripulantes. O fato é o combustível residual do míssil acabou provocando um incêndio que se alastrou rapidamente em todo o navio. 20 tripulantes perderam a vida
Os danos ao HMS Sheffield depois de ter sido atingido por um míssil Exocet em maio de 1982. Foto: PA/PA Archive/Press Association Ima

Mesmo armado com mísseis antiaéreos Sea Dart de longo alcance, o HMS Sheffield não conseguiu se defender do ataque dos mísseis Exocet AM39

LIVRO: Handbrake! Caças-bombardeiros Super Étendard na Guerra das Falklands/Malvinas, 1982

 

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