Líder russo promete novos mísseis hipersônicos para a Marinha em meio à Guerra da Ucrânia

Moscou (Reuters) – O presidente Vladimir Putin assinou neste domingo (31) uma nova doutrina naval para a Rússia, que define os Estados Unidos como o principal rival do país e amplia as ambições marítimas do Kremlin para além de áreas consideradas cruciais, como o Ártico e o mar Negro.

Putin fez um breve discurso para marcar o lançamento, em um evento do Dia da Marinha em São Petersburgo. Na cidade fundada sob o regime de Pedro, o Grande, o atual presidente fez elogios ao czar por tornar a Rússia uma grande potência marítima e aumentar a posição global do país.

Em um desfile de mais de 40 navios e submarinos, com cerca de 3.500 militares, Putin não mencionou a Guerra da Ucrânia, mas evidentemente tinha o conflito no foco. Até porque na Crimeia anexada Moscou acusou o país vizinho de um ataque com drone à sede da Frota do Mar Negro, levando à suspensão dos eventos por lá. Kiev negou envolvimento, chamando a ação, que terminou com seis feridos, de “bandeira falsa”, uma simulação deliberada.

O russo prometeu novos mísseis de cruzeiro hipersônicos e afirmou que o Kremlin tem poder militar suficiente para derrotar quaisquer potenciais agressores. Ele citou os mísseis Tsirkon (zircão), uma das estrelas do arsenal de Moscou —lançados de navios, eles têm tem capacidade de levar ogivas nucleares, mas sua função primária é o ataque a outras embarcações.

Admiral Gorshkov lança Zirkon

A nova doutrina naval tem 55 páginas e estabelece os objetivos estratégicos da Marinha do país, incluindo as ambições de ser uma “grande potência marítima” que se estende por todo o mundo. A principal ameaça à Rússia, segundo o texto, é “a política estratégica dos EUA de buscar a dominação dos oceanos e sua influência em processos internacionais”.

A Guerra da Ucrânia cristalizou a separação cada vez mais marcada entre Washington e Moscou, com a Casa Branca liderando os esforços de ajuda militar a Kiev e de sanções ao Kremlin.

O documento também faz menções diretas à expansão da Otan, coalizão militar ocidental liderada pelos americanos. “Os planos de expansão da infraestrutura militar para perto das fronteiras russas e as tentativas da aliança de assumir funções globais continuam a ser inaceitáveis para a Federação Russa.”

Um dos motivos que levaram Putin a iniciar a invasão da Ucrânia, pouco mais de cinco meses atrás, foi justamente a ampliação dos horizontes da Otan e a alegada intenção de Kiev de se unir ao grupo. “A atividade da Otan visa a direta confrontação com a Federação Russa e seus aliados”, lista a diretriz. Essa visão, notou a agência Tass, guiará a política do país na região do Atlântico.

Até aqui, o presidente americano, Joe Biden, tem evitado um envolvimento militar direto de Washington e da Otan no conflito, o que decerto configuraria uma Terceira Guerra Mundial.

O vasto litoral russo, de 37.650 quilômetros, se estende do mar do Japão ao mar Branco e também inclui o mar Negro e o Cáspio. Uma área definida como de particular importância no documento assinado por Putin é o oceano Ártico, que os EUA dizem repetidamente que a Rússia tenta militarizar. Arquipélagos da região são citados nominalmente para exemplificar os focos de intensificação da atividade marítima.

O Ártico ainda é mencionado em um trecho que estabelece a diretriz de desenvolvimento da indústria naval, em especial no extremo oriente do país. Segundo a doutrina, a Rússia poderá usar a força militar nos oceanos de acordo com cada situação, caso se esgotem recursos como ferramentas diplomáticas e econômicas.

O documento ainda prevê um “fortalecimento abrangente da posição geopolítica da Rússia” nos mares Negro e de Azov, que estão no centro da Guerra da Ucrânia: seja por ataques russos a regiões portuárias do país vizinho, pelas contraofensivas de Kiev que atingiram joias da Marinha russa ou pelo recente acordo firmado com ONU e Turquia para escoamento e exportação de grãos.

A nova doutrina naval da Rússia também reconhece que falta ao país um número amplo de bases navais pelo mundo. Daí o estímulo a parcerias estratégicas com a Índia —país que auxilia indiretamente Moscou, ao não condenar explicitamente a invasão da Ucrânia e amplificar o comércio de hidrocarbonetos— e com nações como Iraque, Arábia Saudita e Irã. Este último, também rival dos EUA.

Sobre o reforço militar propriamente dito, Putin disse em seu discurso que a entrega de novos mísseis hipersônicos começaria nos próximos meses e que a localização para seu eventual uso dependerá dos interesses russos.

“O principal aqui é a capacidade da Marinha russa. Ela é capaz de responder com a velocidade da luz a todos os que decidem infringir nossa soberania e nossa liberdade.” ​Armas hipersônicas podem viajar a nove vezes a velocidade do som, e a Rússia realizou testes, a partir de navios de guerra e submarinos, ao longo do ano passado e em fevereiro de 2022.

FONTE: Folha de São Paulo

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