LOGSUB na LAAD 2023: Os novos navios caça-minas e multimissão da Abeking & Rasmussen
A empresa brasileira LOGSUB, que desenvolve projetos e soluções de defesa e infraestrutura portuária para a Marinha do Brasil e de outros países da América do Sul, participará da feira de Defesa e Segurança LAAD 2023 de 11 a 14 de abril no Riocentro, Rio de Janeiro.
O diretor da LOGSUB, Armando Repinaldo, conversou com a sucursal do Poder Naval em Portugal, onde sua empresa tem uma filial, sobre os seus novos projetos e desafios após esse longo período da Pandemia de COVID. Dentre eles destacamos pela sua importância o Projeto de um novo Navio Caça-minas (NCM) para a MB e Marinhas da região, do estaleiro alemão Abeking & Rasmussen, e que pela sua modularidade também se torna um navio multimissão.
Além desse Projeto inovador, a LOGSUB em parceria com a Empresa JFD apresentou uma proposta de um Sistema de Resgate para Submarinos de última geração para a MB e também junto com a empresa Syncrolift vem fornecendo e apoiando Sistemas de Elevação e Transferência de navios em estaleiros do continente.
Armando Repinaldo, capitão de mar e guerra da reserva da Marinha do Brasil, ingressou na Marinha em 1978. Seu primeiro embarque em 1985, após a viagem de Instrução de Guardas-Marinha no Navio-Escola Custódio de Mello, foi no Navio-Varredor NV Atalaia, um dos seis navios construídos pelo Abeking & Rasmussen e recebidos pela MB entre 1971 e 1975. Na época os navios estavam entre os melhores do mundo, mas apenas três continuam na ativa na MB e precisam de substituição urgente.
Nesta entrevista vamos focar no Projeto do Navio Multimissão e Caça-Minas, que é uma necessidade premente da MB.
PODER NAVAL: Comandante Repinaldo, muito bom tê-lo conosco mais uma vez. Além da sua especialização em submarinos, o senhor também é especialista em guerra de minas. Poderia resumir sua carreira na MB, incluindo os cursos que fez, em especial na Guerra de Minas?
REPINALDO: Como mencionado, o meu primeiro navio na MB foi o NV Atalaia, onde servi de 1985 até o final de 1987, quando voltei ao Rio de Janeiro para fazer o Curso de Aperfeiçoamento de Submarinos CASO em 1988. No período em que servi em Aratu tive a oportunidade de fazer todos os Cursos da área de Minagem e Varredura na época, que eram os Cursos de Varredura para Oficiais (VAROF) e o de Guerra de Minas (GUEMOF). Para mim foi um período muito profícuo profissionalmente pois os navios eram novos e estavam com todos os seus sistemas operativos e atualizados.
PODER NAVAL: Como foi sua experiência no NV Atalaia e na Força de Minagem e Varredura?
O Atalaia (O Águia) tinha cerca de 10 anos em operação na MB, era um navio atualizado e plenamente operativo, tive a boa sorte de ter excelentes Comandantes na época que foram fundamentais na minha formação naval e a oportunidade de operar em quase todos os principais portos do nosso litoral, quando fiz comissões de Fortaleza (CE) até Rio Grande (RS).
PODER NAVAL: Quais eram os pontos fortes dos navios-varredores classe “Aratu”?
Apesar de serem navios de madeira eles são bem resistentes (o fato de ainda estarem em operação comprova isto) e apesar de compactos possuíam a capacidade de fazer todas as varreduras possíveis no espectro da Guerra de Minas. Além disto, eram navios rápidos, versáteis e que eram muitas vezes usados em outras missões, como simulando uma Lancha Lança Misseis, por diversas vezes operamos com a Esquadra simulando ataques de lanchas lançadoras de míssil superfície-superfície com grande sucesso, pois são navios de perfil baixo e construção de madeira, ou seja, quase invisíveis a um radar de uma fragata a longa distância.
PODER NAVAL: Quais os tipos de varredura que os navios da classe “Aratu” podiam realizar?
Na época fazíamos:
- A varredura mecânica, quando rebocávamos longos dispositivos com tesouras mecânicas e explosivas para cortar cabos de minas de impacto;
- A varredura acústica com 3 diferentes tipos de martelos (MT, BT e o GBT-3), nela podíamos simular quase todo espectro de frequência acústica de um navio de superfície; e
- A varredura magnética, com uma longa cauda ou cabo magnético, ou usando um dispositivo rebocado com bobinas chamado HFG.
Tinha também uma varredura de emergência com explosivos, que tive a oportunidade de realizar duas vezes.
As operações eram realizadas com minas de exercício e quase sempre tínhamos sucesso em “varrer” a mina colocada na área de operação.
PODER NAVAL: Os navios-varredores ainda são efetivos na Guerra de Minas moderna ou os caça-minas conseguem cumprir a missão?
Hoje na Guerra Moderna as Marinhas usam somente Navios Caça-Minas nessa tarefa, eu desconheço algum estaleiro na atualidade que construa navios ou sistemas exclusivos para a varredura. Os Caça-Minas atuais conseguem cumprir a missão com rapidez e uma maior eficiência sem colocar em risco a tripulação de Navio-Varredor como antigamente.
PODER NAVAL: Devido ao avanço tecnológico da Guerra de Minas como as minas de fundo e as autopropelidas lançadas de submarinos, quais as características que um moderno navio caça-minas precisa ter?
Elevada eficiência no cumprimento da missão, rapidez na sua realização e poder operar em águas mais profundas. Para isto os modernos NCM tem dentre outros requisitos os seguintes:
- Casco não magnético, seja ele de composite ou aço especial não magnético;
- Assinatura acústica mínima, através de um desenho do casco de baixo arrasto e mínimo ruído acústico irradiado (maquinário e propulsão);
- Um sonar de casco de alta-definição e direcional;
- Um sistema de detecção, seleção e gerenciamento de alvos (as minas); e
- Veículos submarinos autopropulsados (UUV), remotos (ROV) ou autônomos (AUV), para classificação e destruição das minas.
PODER NAVAL: No caso dos novos navios caça-minas (MHV 60) da Abeking & Rasmussen, quais são as principais inovações em relação aos navios das classes “Frankenthal” da Marinha Alemã e MHV-54 da Marinha Turca?
Os dois métodos básicos para limpar um campo minado são a caça de minas e a varredura delas. Os projetos anteriores (por exemplo, os navios da Marinha Alemã, classe Frankenthal/Hameln ou MHV 54 turcos) usam embarcações diferentes para cumprir essas diferentes tarefas com equipamentos especiais específicos para cada método e alto custo. A A&R desenvolveu o MHV 60 combinando o design moderno de uma embarcação NCM com sistemas avançados modulares a bordo, que operam o navio com alto grau de segurança para tripulação e seus sistemas, combinando caça e varredura de minas em uma única embarcação de forma modular.
Além disso, o desenvolvimento da tecnologia para operações de MCM avançou muito nos últimos anos e sistemas comerciais de alta tecnologia foram desenvolvidos pela indústria em geral. Esses sistemas, como por exemplo, ROV, AUV, sistemas de sonar, etc., são organizados como sistemas modulares para flexibilizar o cumprimento de várias missões. Os sistemas modulares (contêineres) permitem o transporte rápido e fácil por avião, caminhão, trem ou navio. A manutenção e atualização dos sistemas modulares são mais econômicas e a sua substituição individual não afeta a prontidão do meio ou o seu tempo de imobilização.
PODER NAVAL: Os dois navios Caça-Minas (Mine Hunting Vessel) MHV 60 adquiridos pela Marinha da Indonésia em 2019 serão construídos em aço austenítico? Quais as vantagens deste tipo de aço?
O MHV 60 é construído em aço de baixo magnetismo. Este conceito do MHV 60 tem a possibilidade de operar dentro e fora do campo minado quando totalmente equipado com os sistemas remotos, tais como ROV, AUV e/ou USV.
As principais vantagens do uso de aço de baixo magnetismo são:
- Alta resistência ao choque e impacto de uma explosão submarina;
- Baixa assinatura magnética;
- Alta resistência ao fogo;
- Alta flexibilidade para reparo e manutenção em comparação com o uso de composites; e
- Principalmente o seu baixo custo de manutenção no ciclo operativo do meio.
PODER NAVAL: Ainda sobre os navios MHV 60 adquiridos pela Marinha da Indonésia, eles serão construídos pelos indonésios com transferência de tecnologia. Qual o tipo de capacitação necessária para a construção desses navios no Brasil caso a MB optasse pela aquisição?
Dois navios MHV 60 estão atualmente em construção na Alemanha e logo serão entregues. A ToT (Transferência de Tecnologia) foi organizada durante todas as fases do processo de obtenção, planejamento e construção, para permitir que a Marinha da Indonésia construa os demais navios em seu país. A ToT inclui, mas não se limita a:
- Treinamento básico de MCMV com a capacidade de entender os princípios de guerra de minas e construção de MCMV (serão os primeiros navios deste tipo naquela Marinha);
- Capacidade de criação e organização de um Cluster Marítimo no país comprador de forma a indústria nacional se capacitar a manter o meio de forma autóctone;
- Intenso treinamento local para a manutenção e garantir a aquisição de conhecimentos e habilidades para tal;
- ToT para o Projeto da Plataforma com o propósito de transferência de conhecimento de como projetar, construir e modernizar o Projeto no futuro;
- Treinamento intensivo nos sistemas embarcados, incluindo o sistema Syntacs, que executa o planejamento e controle da missão MCM;
Os diferentes cursos preparam a Marinha compradora a ter um entendimento total do projeto e permitem que os formandos forneçam palestras semelhantes a outros militares e civis criando uma cadeia de conhecimento fundamental para o sucesso do ToT do Programa.
PODER NAVAL: Além do caça-minas MHV 60, a Abeking & Rasmussen também oferece o navio-patrulha multimissão MMPV (Multi Mission Patrol Vessel), que é um pouco maior em comprimento (63 m) que o MHV 60 (61 m). Qual o deslocamento aproximado dos dois navios?
Como um conceito avançado, a A&R desenvolveu a solução MMPV para a MB, a ideia é proporcionar uma maior flexibilidade ao navio ou classe para realizar outras operações tão necessárias às missões distritais da MB, incluindo, além disso, a Missão MCMV. O conceito MMPV é baseado na plataforma MHV 60 e foi ampliado para integrar mais módulos para diferentes missões (como OPV Patrulha Oceânico, Navio lançador de Míssil Superfície-Superfície e até Patrulha Antissubmarino), contando com um convoo para operar helicópteros e drones. O deslocamento é de cerca de 1.050 toneladas.
Diferentes configurações do MMPV (Multi-Mission Patrol Vessel)
PODER NAVAL: O MMPV poderia cumprir a missão de navio-patrulha e ser reconfigurado rapidamente para guerra de minas?
Sim, uma das possíveis configurações do MMPV é cumprir a missão de um navio-patrulha (OPV), com capacidade de operar um Helicóptero médio e operar e embarcar aeronaves não tripuladas. O navio está equipado com módulos para missões de patrulha e as áreas de convés foram configuradas para acomodar módulos com tamanho padronizado (tamanho de um contêiner de 10 ou 20 pés), berços para embarcações de infláveis ou não (6 a 9m) e um guindaste que podem pode ser facilmente instalados.
O MMPV também pode ser rapidamente reconfigurado para guerra de minas, alterando os seus módulos, tais como o contêiner para CIC (Comando e Controle), módulo eletrônico, módulo hidrográfico, módulo ROV Sonar, contêiner de mergulho com câmara de descompressão e USV para caça e varredura de minas.
A aquisição desta classe de navio pela MB permitiria uma ampliação do Poder Naval nos Distritos Navais como nunca antes existiu, e a flexibilidade de transporte dos módulos por via aérea permitiria também uma redução do custo de aquisição dos meios e sua racionalização na operação em todo o Brasil.
Uma sugestão para a MB, por exemplo, seria construir os navios desta classe de casco magnético comum para os Distritos Navais e de casco não magnético para o atual 2º DN e Força de Minagem e Varredura. Com esta decisão, a MB reduziria ainda mais o custo de construção dos navios que poderiam regularmente ir à Base Naval de Aratu para serem desmagnetizados pela Estação de Deperming.
PODER NAVAL: Tanto o MHV 60 quanto o MMPV podem incluir sonar de casco, além dos vários dispositivos externos – veículos autônomos e não tripulados operados remotamente?
O MHV 60 é equipado com um sonar montado no casco, assim o navio pode operar como um MCMV dedicado, podendo entrar com segurança na zona minada. O MMPV também pode ser equipado com um sonar rebocado e operar de fora do campo minado enquanto usa os seus vários sistemas não tripulados (autônomos ou controlados remotamente) a bordo.
PODER NAVAL: Tanto o MHV 60 e o MMPV podem utilizar propulsão diesel para navegação de cruzeiro e a propulsão elétrica durante a missão de contraminagem?
O atual conceito do MHV 60 usa propulsão a diesel para navegação de cruzeiro e propulsão elétrica para operação de MCM. A configuração do futuro navio MMPV também pode ser projetada de forma semelhante à do MHV 60, essa é a sua ideia conceitual.
Enfim, agradeço a oportunidade de o Poder Naval apresentar o nosso Projeto da classe MMPV para a MB, nós acreditamos que a inclusão desta classe de navio na Marinha seria um grande salto de tecnologia, operação de sistemas modulares e, principalmente, uma redução de custo de aquisição e manutenção de diferentes plataformas ou projetos (OPV, NaPa 500, NCM) em apenas uma classe de Navios Multimissão.
Alguns equipamentos que podem ser instalados na forma de contêineres no MMPV
IMAGENS DE DIVULGAÇÃO DO MHV-60 E MMPV: Abeking & Rasmussen
NOTA DO EDITOR: O conceito do MMPV seria uma excelente opção para a Marinha do Brasil equipar a Força de Minagem e Varredura e seus Distritos Navais com navios da mesma classe no estado da arte, obtendo todos os benefícios que a modularidade e a padronização de equipamentos podem trazer.