HMS Surprise ao fundo em batalha com o Acheron

Sérgio Vieira Reale
Capitão-de-Fragata (RM1)

Introdução

As armas empregadas na guerra naval durante a Antiguidade e na Idade Média [1] não eram capazes de infligir significativos danos a estrutura do navio inimigo. Nesse sentido, a busca por armas mais potentes, velozes e precisas era incessante.

O aparecimento do canhão

A descoberta da pólvora pelos chineses e o aparecimento do canhão, no final da Idade Média, produziu significativas alterações na História Militar. A nova arma possuía um crescente poder de destruição.
Os primeiros, eram estáticos, possuíam baixa cadência de tiro e eram empregados com projetis de pedras leves para atingirem distâncias maiores. Inicialmente, eram de ferro e com o desenvolvimento da metalurgia passaram a ser de bronze, material mais resistente. O carregamento da munição era feito pela boca do canhão.

Após o sucesso observado nos combates terrestres, foram trazidos para os navios. Inicialmente, eram instalados na proa e na popa devido a propulsão a remos.
Os primeiros canhões ainda não tinham poder de fogo suficiente para avariar a estrutura de um navio.

Canhão no Museu Naval da Praça XV, no Rio de Janeiro – Foto: Alexandre Galante

O progressivo aumento na sua instalação a bordo provocou mudanças na arquitetura das embarcações, bem como forçou lentamente o abandono da propulsão a remos. O peso dos canhões também afetava o desempenho dos remadores.

À medida que o peso dos canhões aumentou surgiu a necessidade de instalá-los no convés abaixo do convés principal pelos bordos; o que também favorecia a estabilidade dos navios. Levado para bordo, o canhão sobre rodas possibilitava o recuo durante o tiro, seu carregamento e seu reposicionamento com a boca para fora do costado.

Outro aspecto a ser ressaltado, é que os navios precisavam se posicionar em relação ao vento para assegurar a iniciativa do ataque.

Desta forma, o navio passaria a ser o novo objetivo da guerra naval, devido a progressiva capacidade do canhão em causar danos estruturais (inclusive na mastreação). Na tática, provocou a decadência da abordagem e do abalroamento.

Mestre dos Mares – o lado mais distante do mundo (2023)

Mestre dos Mares (Master and Commander: The Far Side of the World) é uma adaptação dos livros do autor britânico Patrick O’Brian. O filme, que trouxe realismo nas ações, foi ambientado durante as guerras napoleônicas no início do século XIX.

Ele foi indicado a 10 Oscars, incluindo Melhor Filme e venceu nas categorias de Edição de Som e Fotografia. A superprodução retrata o combate naval entre um navio inglês e um navio francês, ambos com propulsão à vela e casco de madeira.

Napoleão Bonaparte, coroado imperador em 1804, inicia uma política expansionista na Europa, encontrando como principal inimigo a Grã-Bretanha. Seu Grande Projeto era invadi-la, mas seu planejamento falhou.

Naquele período, o principal e decisivo confronto que representou o antagonismo franco-inglês foi a Batalha Naval de Trafalgar [2] em 1805. A esquadra britânica, comandada pelo Almirante Horácio Nelson, lutou e venceu a esquadra franco-espanhola comandada pelo Almirante Pierre Villeneuve. Foi a última batalha naval de navios à vela.

HMS VICTORY [3]
Retornando ao filme, Jack Aubrey (Russel Crowe) é o Comandante do HMS [4] Surprise, cuja liderança é marcante. O navio tem uma tripulação de 197 homens e 28 canhões.

Ele se encontra navegando no litoral norte do Brasil em 1805. Sua missão é de interceptar, afundar, queimar ou capturar o navio francês Acheron. No primeiro confronto, o HMS Surprise é atacado pelo navio francês, que tem 44 canhões e teve a iniciativa das ações. Neste combate, no Surprise, 9 mortos, 27 feridos e diversas avarias, incluindo o leme.

Após reparar as avarias sofridas no primeiro confronto o HMS Surprise volta a reencontrar o Acheron no mar.

Vale mencionar a cena em que a tripulação do HMS Surprise utilizou um artifício para iludir o Acheron em relação a sua real posição no período noturno. O Comandante teve uma ideia criativa para obter o resultado desejado.

Durante as principais ações navais exibidas no filme foram observadas as seguintes táticas e armas: manobras de aproximação entre os navios aproveitando as melhores condições do vento, o emprego dos canhões, abordagem e luta corpo a corpo nos conveses com armas brancas e armas de fogo

REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS

  • ALBUQUERQUE, Antônio Luiz Porto; SILVA, Léo Fonseca e. Fatos da História Naval. 2.ed. Rio de Janeiro: Serviço de Documentação da Marinha. 2006.
  • VIDIGAL, Armando e de Almeida, Francisco Eduardo Alves. Guerra no Mar: batalhas e campanhas navais que mudaram a história. Record. 2009.
  • JUNIOR, Haroldo Basto Cordeiro. DE ARS BELLUM. O estado da arte bélica no inicio do século XX.  Revista Marítima Brasileira, Rio de Janeiro, v. 121, n. 01/03, jan/mar. 2001.
  • https://www.papodecinema.com.br/filmes/mestre-dos-mares-o-lado-mais-distante-do-mundo/

[1] Período entre a queda do Império Romano do Ocidente, em 476, e a tomada de Constantinopla pelo Império Otomano em 1453.

[2] Em 21 de outubro de 1805, ocorreu ao largo do cabo Trafalgar, localizado ao sul da cidade de Cádiz.

[3]  Navio construído entre 1759-1765, com 104 canhões, foi o Navio Capitânia da esquadra britânica durante a Batalha Naval de Trafalgar.

[4] Her Majesty’s Ship, Navio de Sua Majestade

Subscribe
Notify of
guest

53 Comentários
oldest
newest most voted
Inline Feedbacks
View all comments