Depois do acidente da TAM em Congonhas, o ministro Nelson Jobim anunciou o novo Plano de Defesa do Brasil para setembro de 2008. Por que setembro? Por que não julho ou outubro? Suspeito, seriamente, que seria para coincidir com o 7 de Setembro, que já passou e, até agora, nada de plano.
O anúncio foi feito na cerimônia de apresentação dos novos generais ao presidente, ainda em 2007. Comparados comigo, eles são todos muito jovens. Em relação à velocidade de mudança do mundo, receio que estejam muito velhos.
Afinal, por que a idade é tão importante? É simples: Forças Armadas são burocracias que operam fora do mercado. Nelas existe apenas uma maneira de subir: fazer só o que os chefes mandam. E, como todas as burocracias não sujeitas às punições do mercado, elas não são capazes de aprender com seus próprios erros.
Só progridem nas burocracias os muito obedientes e os pouco criativos. Qualquer burocracia pública é assim. Inovação e atrevimento são punidos. O conformismo é premiado.
Oficiais jovens norte-americanos combatentes no Iraque estão começando a se insurgir contra essas características burocráticas das Forças Armadas dos EUA, que nisso são iguais a todas as outras. Os generais não vão ao campo de batalha nem costumam ter agilidade mental para acompanhar as mudanças do mundo, da tecnologia e, conseqüentemente, da estratégia. O resultado é que uma das coisas mais caras aos militares, a doutrina (que, trocando em miúdos, quer dizer: como se empregam as Forças Armadas em batalhas), acaba ficando desatualizada. Isso é muito grave num mundo que se move cada vez mais rapidamente.
No caso brasileiro é mais sério ainda, porque nossas Forças Armadas não se envolvem em guerras há muito tempo. Disse-me um oficial: “As Forças Armadas brasileiras medem a capacidade dos oficiais pelas notas que tiram nas escolas militares. Seus méritos são testados em batalhas simuladas entre azuis e vermelhos, e não em combates reais, com munição de verdade.”
Em exércitos guerreiros, mesmo com a inércia burocrática, ainda há espaço para a inovação nas guerras. Heróis são os indisciplinados que dão certo. Militarmente, isso é simples: o indisciplinado que fez alguma coisa diferente das ordens que recebeu, e morreu, deu errado. O que sobreviveu e ajudou a ganhar a batalha virou herói e contribuiu para a mudança da doutrina.
Sem guerra e com promoções dos mais conformistas, nossa rota para a inovação militar está cheia de obstáculos.
Militares não são pagos para olhar o que militares de outros países fazem. Eles são pagos para adivinhar o que potenciais inimigos externos ou elementos desestabilizadores podem ou vão fazer. Daí a importância dos serviços de espionagem.
Os orçamentos militares, no Brasil, sempre foram definidos pelos militares, sem ouvirem ninguém. Eles definem quem acham que são os inimigos (ou acreditam em histórias que lhes contam), determinam do que precisam para combater quem eles acham que são os inimigos e o Congresso vota sem ter idéia do que está aprovando.
Numa democracia com controle civil, como se presume que seja a nossa, espera-se que os militares digam à sociedade ou aos representantes por ela eleitos, primeiro, contra o que e contra quem eles pretendem nos defender; segundo, como pretendem fazer isso; terceiro, com que meios e recursos eles precisam contar; quarto, quanto isso vai custar. E, finalmente: será que não dá para fazer isso por um preço mais barato?
Nenhuma dessas condições tem sido atendida pelos militares brasileiros.
Agora vamos ao que comprar. Como não temos tecnologia militar de ponta – se deveríamos ter ou não é outra questão -, estamos limitados a comprar o que está disponível no mercado.
Essas coisas se dividem em três categorias: material não-letal, letal de baixa tecnologia e letal de alta tecnologia.
No primeiro quesito estamos bem: fardas, botinas, marmitas, cozinhas de campanha, caminhões e coisas que tais. Destas a indústria local dá conta. Quanto ao material letal de baixa tecnologia, ainda damos conta de boa parte. Afinal, a indústria nacional de armas, bem como as de metalurgia, podem, em curto espaço de tempo, adaptar-se para suprir boa parte das necessidades.
A porca torce o rabo é nos materiais letais de alta tecnologia. Estes os países fornecedores cedem ou vendem sem transferir tecnologia (e as Forças Armadas brasileiras só gostam de adquirir material com transferência de tecnologia, o que limita significativamente o número de supridores). Temos de aceitar o que nos for oferecido, na quantidade e nos prazos que os vendedores fixarem. Negociações nessa área são longas e complicadas.
Desde o ano passado as coisas se complicam na Bolívia. O país está dividido e o grau de violência aumenta.
A Rússia manda bombardeiros para manobras conjuntas com as forças militares da Venezuela.
Os anúncios da Petrobrás informam que as reservas presumidas de petróleo brasileiro no Atlântico são bem maiores do que se pensava.
Os EUA reativaram a IV Frota, responsável pelo patrulhamento e segurança no Atlântico Sul.
E o Plano de Defesa, anunciado pelo ministro Jobim para setembro, que fim levou?
Numa de suas primeiras declarações o ministro Jobim disse muito energicamente, sobre a crise aérea, que não importava a cor do gato, desde que ele matasse o rato.
A ausência de um Plano de Defesa claro, para uma politéia que tem crises pipocando em volta, parece levar a crer que o ministro se atrapalhou na sua declaração e disse o contrário do que talvez quisesse dizer: que ele achava que, na realidade, a cor do gato é muito mais importante do que a morte do rato.

Alexandre Barros, Ph.D. em Ciência Política (University of Chicago), é pró-reitor do Centro Universitário Unieuro (Brasília)

Fonte: Estadao.com.br – 22/9/2008

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LUIZ BRAZIL (DT)

Depois dessa explanação, o certo mesmo eh ficar “SEM COMENTÁRIOS”.

Hornet

Não entendi muito bem o que o autor do texto quiz dizer…achei certas partes do texto meio que o óbvio ululante (pra citar o finado Nelson Rodrigues) – pois todo mundo está cobrando o anúncio do PND -, e em outras partes meio equivocado… Por exemplo: nós realmente produzimos todo o material não letal que usamos nas nossas FAs? (já li em algum lugar que não me lembro agora, que estávamos importanto até fardas e coturnos há algum tempo, e não faz muito tempo…não sei se estou enganado sobre isso, mas me lembro de ter lido. Talvez já tenha mudado,… Read more »

Patriota

Sr. Hornet! Vc tem toda razão… este tesxto foi publicado no site DEFESANET. Quem acompanha aquele site com sendo crítico, percebe bem a linha editorial que eles seguem. No blog deles tente escrever algum comentário que vá contra os pensamento do editor, é perda de tempo… eles nunca publicarão o post.

Hornet

Caro Patriota,

Não sabia que havia sido publicado no Defesanet…agora faz mais sentido. Vc mandou bem!

um abraço

jean

Hornet,

Gostei muito de sua contra resposta!
Pois de maneira sabia e com total conhecimento de causa, demonstrou o esforço dos militares para adquirir tecnologias que possam dar segurança e soberania ao solo nacional.
Melhor ainda demonstrou o real problema que causou, vamos dizer o atraso tecnológico das forças armadas, todos sabemos que hoje no mundo, não só no Brasil gira em torno da economia; penso eu na mina ignorância que esta crise financeira americana, vai acabar respingando no plano de segurança; desejo estar errado?

Iuri Korolev

Caro Hornet Achei muito pertinentes os comentários que você fez na matéria sobre o sub nuclear.Devo dizer que sempre foi o meu modo de pensar este de desenvolver junto. Tenho um amigo que foi diretor da Agencia Espacial e hoje está desenvolvendo um importante projeto do Governo nesta área. No final de 2005 estive rapidamente com ele e externei este modo de pensar. Parece que ele gostou (ou ele já pensava assim, não sei), pois pelo menos nos comentários que vejo ele fazer na imprensa ele encampou : estão pensando em desenvolver projetos juntos, não apenas comprar a tecnologia, apesar… Read more »

Hornet

Caro Iuri, vc tem razão mais uma vez…a questão que vc coloca é um ponto importante. Como transformar a ciência e a pesquisa em tecnologia? (E elas são coisas diferentes, a ciência inventou, meio sem querer inclusive, o LASER, mas quem transformou o laser em tecnologia foi alguma empresa, certo?) Cada país resolveu de um jeito a questão. Alguns com mais empreendedorismo privado, outros com mais interferência do Estado. Não existe uma regra pra isso. No tempo do pioneirismo tecnológico (século XIX e começo do século XX), em que a tecnologia e a ciência estavam mais ou menos juntas, bastava… Read more »

Hornet

Caro Iuri, eu sempre esqueço de alguma coisa, então, pra completar a idéia: por isso que vejo com otimismo o novo plano de defesa, pois parece (ao que tudo indica) que enfim estaremos deixando de ser meros usuários de tecnologia importada para sermos também produtores desta tecnologia. Parcerias com a França (um país desenvolvidíssimo em termos tecnológicos), e quem sabe com a Rússia (no caso do PAK-FA), seriam não só muito bem vindas, como apontariam para começar a desatar alguns dos “nós que comentei acima. Se isso se concretizar como é o esperado, temos que comemorar e muito. Já até… Read more »

Iuri Korolev

Caro Hornet Você citou a Embraer e a Petrobras. A 1ª delas floresceu quando foi privatizada (eu a conheço bem). Antes, era mal administrada e tinha corrupção deslavada. Colocaram grandes executivos à sua frente e fizeram parcerias de risco com os fornecedores internacionais (entre elas a Thales francesa). Mas é interessante como todas elas foram fundadas pelo Estado. Realmente os EUA sempre foram um terreno mais fértil para se abrir empresas. Lá ele usam muito o “venture capital”. Aqui é você é punido por abrir uma empresa : pelo Fisco, pelos invejosos. Se algum dia te interessar, leia a biografia… Read more »

Hornet

Iuri, vc disse tudo, no caso da Embraer a coisa só decolou quando ela deixou de ser mal administrada e virou um mix de capital privado e estatal…Acho que este é um bom caminho para o Brasil. E sua idéia, sobre os Navios da Petrobrás, é perfeita. O governo poderia (acho até que tem em mente fazer isso) reativar a construção naval brasileira, e no meio disso, produzir equipamentos (navios) tanto para uso civil como militar. Acho um bom caminho também. Eu também me interesso muito por tecnologia, tal como vc. E aqui no blog, talvez mesmo sem se darem… Read more »

Farragut

Além da discussão sobre plataformas e sistemas, não caberia o debate também sobre o aspecto dos recursos humanos? Os meios operativos têm efetivos condizentes com as lotações? Em caso negativo, qual o porquê? Tarefas administrativas? Há planejamento para a mobilização de quem está na burocracia? Há muitos questionamentos como estes e os que o autor do artigo propõe cujo estudo é vital para o aprestamento do Poder Naval. “Nós já tivemos navios de madeira e homens de aço. Agora nós temos navios de aço e homens de madeira, e temos que voltar aonde estávamos naquilo que diz respeito aos homens.”… Read more »

Iuri Korolev

Caros Farragut Realmente isso é muito relevante. Mas para recrutar os melhores talentos tem que pagar bem. Sou a favor de “tropas de elite”, ou seja : não precisa ter tanta gente, mas pouca gente altamente qualificada como efetivo fixo. E com grande mobilidade. Não precisamos ter pessoal em tudo que é canto. Basta uma vigilância eficiente O que não funciona é esse plano de querer recrutar aquele monte de gente, e gerar um efetivo de alto custo e baixa qualidade. Mas esta não é a maior barreira no Brasil, em minha opinião. Nosso maior problema é tecnológico, que só… Read more »

Farragut

“Faca na caveira e nada na carteira”.

Marcos Nóbrega

Prezado Alexandre Barros Estou repetindo abaixo parte do seu artigo. Numa democracia com controle civil, como se presume que seja a nossa, espera-se que os militares digam à sociedade ou aos representantes por ela eleitos, primeiro, contra o que e contra quem eles pretendem nos defender; segundo, como pretendem fazer isso; terceiro, com que meios e recursos eles precisam contar; quarto, quanto isso vai custar. E, finalmente: será que não dá para fazer isso por um preço mais barato? Sua miopia não lhe pemite ver o óbvio. Não são os militares que definem os inimigos! A guerra é o fracasso… Read more »

Iuri Korolev

Esta combinação “Faca na caveira e nada na carteira” não funciona na prática.
O capitão Nascimento vai obrigar o cara a “pedir para sair”…

ROMUALDO

Eu queria saber porque o Brasil não compra o porta aviões desativado CV-67 ( USS- Johon F. Kennedy ) dos Estados Unidos.
E um porta aviões de grande porte.