EUA: Uma marinha de guerra movida a energia verde
O custo de transportar petróleo através do Afeganistão já foi calculado em vidas humanas. Ao alimentar navios, aviões e bases a energia verde, a Marinha protege o planeta e evita guerras.
Como já tenho dito, aquilo de que mais gosto na América é que há sempre alguém que não vai atrás da manada e se lembra de tomar uma atitude correcta ou de inventar qualquer coisa sem ter em conta o que está na moda política ou economicamente. Ora o que pode salvar o futuro energético da América – numa altura em que é desenvolvida uma campanha fraudulenta anticiência, em grande parte financiada pela indústria do petróleo e do carvão, que impediu que o Congresso aprovasse uma lei da energia verde – é a Marinha não ter ido com a maré.
Espicaçados por Ray Mabus, secretário para a Marinha do presidente Obama e ex-embaixador dos Estados Unidos na Arábia Saudita, a Marinha e os Marines estão a desenvolver uma estratégia para dominar a Al-Qaeda, os talibãs e os petroditadores do mundo inteiro com uma estratégia verde. Os seus esforços assentam em parte num estudo recente, de 2007, em que se concluiu que as forças armadas norte-americanas perdem um efectivo, por morte ou ferimentos, por cada 24 colunas de transporte de combustível no Afeganistão. Actualmente há centenas e centenas destas colunas a atravessar o país até aos lugares mais remotos – para fazer funcionar aparelhos de ar condicionado ou geradores a diesel.
O argumento de Mabus é que, se a Marinha conseguisse substituir esses geradores por fontes de energia renováveis e tornasse os edifícios mais eficientes do ponto de vista energético, mover os seus navios a energia nuclear ou biocombustíveis com motores híbridos, poderia contribuir para vencer os talibãs pelo poder da energia verde – a melhor maneira de evitar uma bomba improvisada à beira de uma estrada é não passar por essa estrada, aproveitando com isso para impedir os petroditadores de continuarem a dar ordens ao mundo inteiro.
Ao contrário do Congresso, que pode ser comprado pelo Grande Petróleo e pelo Grande Carvão, não é assim tão fácil dizer aos Marines que não podem usar energia solar para salvar as próprias vidas. Não faço ideia no que vai dar tudo isto no Iraque e no Afeganistão, mas se sairmos destas duas guerras com uma revolução verde dirigida pelo Pentágono nem tudo terá sido perdido. E se estas guerras iniciadas por força da nossa dependência do petróleo acabassem por pôr fim a essa dependência? Não seria interessante?
Jackalyne Pfannenstiel, secretária assistente da Marinha para a Energia, já dirigiu a Comissão para a Energia da Califórnia. Foi ela que me apresentou os seguintes desenvolvimentos recentes: a 22 de Abril, Dia da Terra, um caça a jacto F/A-18 Super Hornet da Marinha, com um motor alimentado por uma mistura em iguais proporções de combustível convencional para jactos e biocombustível produzido a partir de sementes de mostarda, começou por ser testado a Mach 1,2, mas actualmente os testes já vão em Mach 1,7 – sem um único sobressalto. Adorei uma afirmação de Scott Johnson, director da Sustainable Oils, que produzia a mistura feita de mostarda: “Foi fabuloso ver este combustível ultrapassar a barreira do som.”
A Marinha vai usar apenas biocombustíveis de terceira geração. Isto deixa de lado o etanol feito de milho, por não ter a indispensável densidade energética. Apenas estão a ser testados combustíveis que não competem com alimentos, que têm ao longo de todo o processo de produção uma pegada ecológica menor que os combustíveis fósseis e são mais económicos. Em Outubro, a Marinha lançou o USS Makin Island, um navio de assalto anfíbio com um motor híbrido eléctrico e a gasolina. Na viagem inaugural, entre o Mississippi e San Diego, diz Mabus, foram poupados 1,5 milhões de dólares em combustível.
Além disso, a Marinha testou o navio de combate RCB-X e o helicóptero SH-60 com um combustível feito de uma mistura de algas e diesel. Entretanto, os Marines têm uma base operacional verde na província de Helmand, no Afeganistão, onde estão a ser testadas todo o tipo de engenhocas, de iluminação a LED para tendas a toldos solares e frigoríficos economizadores de energia, com a finalidade de de-senvolver a eficiência energética de edifícios em locais isolados sem recurso a combustíveis fósseis. Quando calculamos de forma realista os custos de transportar combustível em camiões para bases isoladas no Afeganistão – o que implica armazená- -lo e levá-lo a lugares remotos nas montanhas -, vemos que o preço de um galão (cerca de 3,5 litros) de gasolina pode chegar aos 400 dólares (cerca de 300 euros), diz Mabus.
Para 2012, a Marinha planeia lançar a “Grande Frota Verde”, de 13 navios movidos ou com energia nuclear ou com misturas de combustível em que o biodiesel alcance pelo menos os 50% e aviões movidos com misturas do mesmo tipo.
Mabus estabeleceu ainda o objectivo de substituir 50% das fontes de energia de todos os navios e outros veículos, além do consumo energético de todas as suas bases costeiras, até 2020. Se a Marinha de facto fizer uso do seu poder de compra ao comprar energia, e se estabelecer novos padrões de eficiência energética para os seus edifícios, conseguirá por si só expandir o mercado da energia verde de maneira determinante.
Se, além disso, o Congresso simplesmente se limitar a não forçar a Marinha a usar etanol ou carvão – nenhum destes combustíveis é limpo nem eficiente do ponto de vista energético -, é possível que acabemos por assistir a uma revolução militar verde, algo que poderia poupar dinheiro, salvar o planeta e, com sorte, evitar a próxima guerra. Siga a Marinha!
FONTE: Força Aérea Brasileira / The New York Times