O site Porto Gente entrevistou o chefe de gabinete da Codesp (Companhia Docas do Estado de São Paulo) e capitão-de-mar-e-guerra da reserva da Marinha do Brasil, Jorge Antonio Fernandes da Rocha Pitta.

Abaixo alguns trechos da entrevista

PortoGente – Seu pai, Ubirajara da Rocha Pitta, foi sargento da Aeronáutica. Por que o senhor escolheu a Marinha?

Jorge Antonio Fernandes da Rocha Pitta – A escolha causou surpresa em meu pai. Em 1978, não havia exigência de concurso para o preenchimento de cargos públicos. E os alunos com boas notas tinham vagas quase que certas nas escolas militares. Por isso, meu pai tinha certeza de que eu seguiria seus passos e ingressaria na Aeronáutica. Mas, eu resolvi ir para a Marinha porque gostaria de ser diplomata. Sempre gostei de viajar e de conversar com as pessoas. E a maioria dos oficiais é diplomata também. Isso sempre me causou admiração. Aprendi que a Marinha não é só um trabalho, mas uma paixão de vida, tanto que, quando saímos, não nos aposentamos, mas vamos para a reserva.

PortoGente – Então, a paixão pela Marinha existia antes de ingressar nela?

Rocha Pitta – Sim, mas ela aumentou com o passar do tempo e até hoje, embora da reserva, esse sentimento cresce. Do lado de fora, vejo com mais clareza o que a Marinha faz pelo País, pelas nossas instituições e pelo seu pessoal. A minha vida mudou graças à Marinha. O que tenho e o que eu sou, devo isso tudo à Marinha do Brasil. Aprendi a me dedicar com amor ao País, às vezes me doando em detrimento da própria família. Dispus-me a doar a própria vida, se a Pátria assim precisasse.

PortoGente – Por causa da Marinha, onde o senhor já morou?

Rocha Pitta – Eu já morei no Rio de Janeiro, em Brasília, em Salvador, em Natal, em Fortaleza – terra natal para onde tive o prazer de retornar sendo o capitão dos portos de lá – e também na Califórnia, Estados Unidos, por dois anos e meio, em uma oportunidade dada pela Marinha para que eu fizesse o mestrado.

PortoGente – Viver no exterior foi importante para o senhor?

Rocha Pitta – Sem dúvida, acrescentou muita coisa em termos profissionais, mesmo porque fiz o mestrado de Engenharia Eletrônica. E em termos familiares a experiência foi excelente, pois os meus dois filhos eram pequenos e aproveitaram bastante o contato com o idioma inglês. Só que, curiosamente, nenhum deles quis seguir carreira militar, o que respeito. O mais velho, Matheus, estuda Ciências da Computação na Universidade de Brasília (UnB) e o mais novo, o Lucas, está prestando vestibular para Engenharia Civil na USP e na UnB.

PortoGente – Por conta do trabalho, sua família ficou em segundo plano?

Rocha Pitta – Algumas vezes sim. Eu vi o Matheus nascer e viajei logo depois. Quando eu voltei, ele já tinha dois meses de vida. Depois, viajei de novo e o garoto não andava, nem falava. Seis meses depois, ele já estava andando, falando e, na minha volta para casa, ele abriu a porta, deu as costas e saiu correndo chorando. Ele não se lembrava do pai. Já o Lucas eu nem vi nascer, só o peguei no colo com 40 dias de vida. Minha esposa, a Ana Lúcia, teve um início difícil como mãe, pois eu não estava ao lado dela nas horas complicadas. Mas estamos casados há 24 anos, ela sempre entendeu a minha paixão pela Marinha e nunca quis competir com isso. Acho que, por isso, a Ana nunca ficou em segundo plano.

PortoGente – O senhor levou para a família a disciplina da carreira militar?

Rocha Pitta – Por mais que se tente, a gente não separa o trabalho, até porque eu não via a Marinha como um serviço, mas sim como um sacerdócio. Então, é natural que você incorpore elementos familiares à Marinha, formando a chamada família naval, e faça o mesmo no sentido inverso, passando o amor à Pátria e à disciplina. Claro que isso cria um atrito, mas hoje meus filhos me entendem perfeitamente. Nessas horas, porém, eu seguia o que dizia o Che Guevara: “endurecer, porém sem perder a ternura”.

PortoGente – Em suas falas, o senhor derrama elogios à Marinha. Não falta divulgação por parte da instituição do que ela faz pelo País?

Rocha Pitta – Isso é até um problema dentro da própria Marinha, posso lhe dizer. Nós somos ensinados, desde cedo, a fugir dos holofotes. Todos nós somos quase que doutrinados a fazer isso. Trabalhar sem esperar nenhum elogio e nenhuma recompensa. Nós juramos isso no dia em que ingressamos na instituição. E dentro das Forças Armadas ainda não há uma opinião unânime sobre o assunto. Porém, posso te dizer, a partir da reserva, que hoje uma campanha de marketing traria benefícios para a Marinha. Só que eu não falo por ela, é só uma opinião minha.

PortoGente – Qual episódio da carreira o senhor guarda recordações?

Rocha Pitta – Não vou ser arrogante a ponto de dizer que minha vida na Marinha foi um mar de rosas e todas as minhas lembranças são boas. Óbvio que não são. Só que minha carreira foi marcada por eventos especiais. Sentimentalmente falando, o dia em que saímos da Escola Naval e recebemos a nossa espada é inesquecível, assim como os cânticos e todo o ritual para que isso aconteça. É mais ou menos como você colocar a batina. Você se declara preparado para servir a Pátria.

PortoGente: Com tanto amor pela Marinha, por que o senhor tomou a decisão de ir para a reserva?

Rocha Pitta: A decisão de ir para a reserva deveu-se a dois fatores. Um deles era de ordem familiar, pois minha família tinha decidido ficar em Brasília e se eu tivesse que voltar ao Rio de Janeiro e participar de novos cursos de especialização na Marinha, seria obrigado a me separar deles de novo e não estava disposto a isso. O outro motivo é que recebi um convite de um amigo, o José Roberto Serra, para trabalhar com ele na SEP. E um convite desses é irrecusável, pelas características do homem e do profissional José Roberto. Ele passa a mais absoluta confiança para as pessoas, tanto que o convite foi feito só uma vez e eu o aceitei.

PortoGente: Como foram os primeiros meses de trabalho na SEP?

Rocha Pitta: Muito difíceis, pois os problemas nos portos brasileiros se avolumaram desde a extinção da Portobras. Os terminais ficaram num plano que não mereciam dentro da estrutura governamental. E o Governo Lula, junto com sua assessoria, decidiu dar aos portos o devido destaque, pois somos um País que tem 95% de seu comércio exterior passando por mar. A SEP foi montada como uma secretaria, com estrutura pequena. Nosso maior desafio foi montar a SEP e, ao mesmo tempo, já ir sanando as dificuldades de alguns portos do Brasil. Hoje, certamente ela está bem melhor e foi muito bom participar deste início.

PortoGente: Antes de ir para a SEP, o senhor tinha esperanças de, um dia, sanar os problemas dos portos do País?

Rocha Pitta: Eu sempre quis participar de um processo no qual os portos nacionais pudessem voltar a ser o que eram antes. E ter passado pela SEP e estar hoje na Codesp são dois fatos importantes. Eu não diria que há muita coisa a ser sanada, pois significaria que tudo estava errado nos portos. Prefiro dizer que estamos organizando um processo de resgate dos portos, de valorização da mão-de-obra, da tecnologia da informação. Nossa função é resgatar a competência do passado e colocar os portos na modernização global vigente.

PortoGente: O Porto de Santos ainda impressiona quem vem de fora?

Rocha Pitta: Por dever de ofício e dos anos na Marinha, conheço quase todos os portos desta nação. E o Porto de Santos é especial, pois a cidade nasceu depois do Porto. Santos é uma das pouquíssimas cidades portuárias onde seus moradores vivem o porto 24 horas por dia. Aqui, a intensidade nesse relacionamento é impressionante. Os navios da Marinha vêm sempre para o porto, são recebidos de braços abertos em visitações públicas. O clima é diferente.

PortoGente: Como tem sido o dia-a-dia na Codesp?

Rocha Pitta: Não vou negar que, em determinados momentos, dá vontade de pegar as malas e ir embora, assim como em outros o desejo é ficar eternamente. Isso é normal em qualquer tipo de convivência, principalmente em Santos, onde os desafios são enormes. E fazendo uma comparação com a hierarquia da Marinha, o ministro Pedro Brito decidiu mandar o seu melhor almirante para a frente de batalha, ao invés de deixá-lo no planejamento. Com a vinda do José Roberto, ficou bem claro que é preciso mudar conceitos no porto. Comprar equipamentos é fácil, difícil é fazer o que estamos fazendo, mudando conceitos.

PortoGente: O senhor cogitou recusar o convite para a Codesp?

Rocha Pitta: Não, em nenhum momento, apesar de sentir muita saudade de minha família, que ficou toda em Brasília. Eu só os vejo aos finais de semana ou de 15 em 15 dias. E isso me dói bastante. Porém, profissionalmente, eles entendem que é importante uma semente ser deixada em um desafio. E espero que isso dê resultados lá na frente.

PortoGente: E o que já foi feito para resgatar o Porto de Santos?

Rocha Pitta: Assim que assumiu a presidência da Codesp, o José Roberto assumiu 19 metas e logo que ele fez isso, eu peguei a lista e pincei o que era da minha área de competência, como chefe de gabinete. Não dá para dizer que já conseguimos fazer muitas coisas, mas encaminhamos muita coisa. 2009 será um ano profícuo de resultados de curto prazo. O principal trabalho, entretanto, é o resgate da imagem de Autoridade Portuária e incentivar o funcionário público do porto. Queremos dar um rosto à Autoridade Portuária. Estamos de braços abertos para o novo.

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