Você já foi ao Bahia? – parte 2
Conheça o hospital do NDM Bahia
Por Guilherme Poggio e
Fernando “Nunão” De Martini
Esta é a segunda parte de uma série dedicada ao navio doca multipropósito Bahia (G40). Para acessar a primeira parte, dedicada à parte externa do navio, passadiço e doca, clique aqui. Nesta, você conhecerá com o Poder Naval o grande hospital do navio, cujo tamanho só perde para a mais importante instalação hospitalar da Marinha, o Hospital Naval Marcílio Dias (HNMD), que fica em terra. A título de comparação, o porta-helicópteros multipropósito Atlântico (A140), recém-incorporado, também possui hospital, mas de porte bem menor (cerca de 1/3 da capacidade do Bahia).
Até a chegada à Marinha do Brasil do NDM Bahia (adquirido usado da França em 2016, tendo servido à marinha daquele país desde 1998) a Esquadra não possuía um navio com instalações médicas tão amplas e modernas. O hospital a bordo, que pode acomodar nada menos que 49 leitos, não tem paralelo entre os navios da MB. Até 12 militares (integrantes fixos da tripulação padrão de 288) são normalmente dedicados ao funcionamento do hospital nas situações de rotina, mas em caso de necessidade, como operações de guerra com desembarque anfíbio em que se preveja a ocorrência de baixas, assim como em missões de assistência humanitária, esse número pode ser elevado para até 60 pessoas.
Os números impressionam e conferem ao navio uma grande capacidade de apoio médico às operações navais, incluindo:
- prestação de apoio médico à força naval;
- prestação de apoio médico às operações anfíbias;
- atuação em missões de assistência humanitária;
- atuação em missões de evacuação de não combatentes.
Situada logo abaixo do convoo “Alpha” (convoo principal), as instalações hospitalares do navio ocupam uma área de 500 metros quadrados que se estende de um bordo ao outro. E vale dizer que o total de 49 leitos não só se destaca entre os demais navios da Marinha, mas também supera o de muitos hospitais de cidades pequenas do Brasil.
A localização logo abaixo do convoo principal do navio permite um rápido traslado de feridos transportados por helicóptero, como veremos a seguir. O hospital é capaz de triar 100 feridos por dia e realizar até 30 cirurgias em 5 dias, e só encontra limitação no fornecimento de oxigênio. Dispondo de uma central de oxigênio com 21 ampolas de 50 litros cada, os oito leitos de terapia intensiva consumiriam esta quantidade em uma semana. Mas a intenção do navio não é manter os pacientes a bordo e sim dar o tratamento inicial e emergencial até sua transferência para uma instalação em terra. Evidentemente, ampolas podem ser transportadas para o Bahia para reposição, em caso de necessidade.
A tripulação de rotina (dia a dia) do centro médico do Bahia normalmente é composta pelos seguintes profissionais:
- um médico;
- um dentista;
- um farmacêutico;
- sete enfermeiros;
- um técnico PC (patologia clínica).
Mas a flexibilidade é alta e, dependendo da missão, o Centro de Medicina Operativa (CMOpM) da Diretoria de Saúde da Marinha (DSM) fará o selecionamento do pessoal e definirá o tamanho da tripulação do centro médico, até um total de 60 profissionais.
Sendo assim, para uma missão de combate que envolva fuzileiros navais, profissionais especializados em ortopedia, cirurgia vascular, anestesistas e outras especialidades serão acrescentadas à equipe médica de rotina. Já numa missão humanitária que envolva crianças, gestantes e idosos serão escalados pediatras, geriatras, especialistas em ginecologia, etc.
Essa capacidade de atendimento também pode ser ampliada em caso de necessidade, com a instalação de módulos de saúde no hangar de veículos.
Dinâmica do atendimento
O projeto do navio é bastante inteligente no que diz respeito ao recebimento de pacientes externos. O hospital está instalado próximo ao convoo, sendo rapidamente acessado por amplas escadas nos dois bordos do navio, das quais seguem direto para o interior das instalações. O acesso pelo doca (lembrar que este possui um elevador que leva até o convoo) também é muito fácil e rápido.
Os pacientes que adentram nas instalações hospitalares são encaminhados inicialmente para a sala de triagem (ver arranjo esquemático do hospital abaixo), que conta com quatro leitos. Nesta sala as equipes de emergência e CTI definirão os destinos dos pacientes. Os que tiverem diagnósticos mais simples seguirão direto para a enfermaria ou poderão receber alta da equipe médica.
Se exames forem necessários para auxiliar no diagnóstico, o paciente poderá ser encaminhado ao laboratório e/ou à sala de raio-X. Esta última encontra-se exatamente em frente à sala de triagem.
O hospital do Bahia está equipado com um moderno aparelho de raio-X digital, que elimina a necessidade das tradicionais “chapas”. Os resultados são apresentados na forma de arquivos digitais que eventualmente podem ser impressos.
Na eventualidade do hospital receber pacientes com queimaduras, curativos de emergência serão feitos na própria sala de triagem, sendo estes enviados na sequência para a UTQ (Unidade de Tratamento de Queimados) que conta com três leitos, circulação atmosférica segregada (para evitar que o paciente tenha infecções) e leito específico para banho de queimados.
Se forem recebidos pacientes com suspeita ou certeza de terem contraído doenças infecto-contagiosas/parasitárias (catapora, meningite, etc.), eles serão enviados para a Sala de Isolamento. Ali os pacientes não terão contato com o restante da tripulação e o ar que passa por esta sala possui diversos filtros e não se mistura com o restante do ar das acomodações. A equipe médica já atendeu uma situação real como esta e tudo seguiu como planejado. O paciente ficou isolado e não houve contágio do restante da tripulação.
Pacientes com parada cardíaca seguirão para a sala de “reanimação/pré-operatório”. Quando o quadro for grave e o paciente necessitar intervenção cirúrgica, ele seguirá para uma das duas salas cirúrgicas do hospital do navio. As duas salas são semelhantes, mas uma conta com equipamento específico para ortopedia que faz o imageamento do paciente em tempo real, mostrando o resultado em duas telas.
O centro cirúrgico ortopédico conta com toda a infraestrutura necessária para fazer cirurgias que envolvam amputação de membros, fraturas de ossos e outros traumas. Cirurgias gerais como perfuração de tórax, perfuração de abdome e outras que envolvam a parte extra-corpórea (hemorragias de grandes dimensões) podem ser realizadas em qualquer uma das duas salas.
E para estas cirurgias de grande porte o navio conta com o apoio do Hospital Naval Marcílio Dias (HNMD) que fornece, dentre outros elementos, bolsas de sangue já devidamente processadas para transfusões. Assim como os melhores hospitais do país, o navio possui um banco de sangue a bordo. Neste banco de sangue são estocadas bolsas processadas de sangue do tipo O- (doador universal). Isso evita a necessidade de estocar diversas bolsas de diferentes tipos sanguíneos.
Antes do uso do sangue o hospital do navio está capacitado a realizar exames de prova cruzada (que identifica reações às plaquetas e outras eventuais incompatibilidades). Caso as bolsas não sejam usadas a bordo elas são devolvidas para o hospital Marcílio Dias antes do seu vencimento para que possam ter utilidade em terra.
Após a cirurgia o paciente poderá seguir para a sala RPA (Recuperação Pós-Anestésica), que conta com quatro leitos, ou seguir diretamente para a UTI (Unidade de Terapia Intensiva). Cada um dos oito leitos da UTI conta com respiradores e aparelhos de monitoramento cardíaco.
O navio também conta com um consultório odontológico (foto abaixo) e um laboratório.
Todo o lixo hospitalar coletado durante uma comissão é estocado para posterior descarte apropriado em terra. No caso de longas comissões o navio está equipado com um compactador de material hospitalar capaz de transformar 100 litros de resíduo num volume de aproximadamente 300 ml.
Números da estrutura hospitalar do NDM Bahia
- Área da instalação hospitalar: 500 m2
- Tripulação médica de rotina: um médico, um dentista, um farmacêutico, sete enfermeiros e um técnico PC
- Capacidade cirúrgica: 30 cirurgias em cinco dias
- Capacidade de triagem: 100 feridos por dia
- Total de leitos: 49 distribuídos da seguinte maneira – Unidade de Tratamento de Queimados (3); Unidade de Terapia Intensiva (8); Unidade de reanimação/pré-operatório (4); sala de recuperação pós-anestésica (4); sala de triagem (4); sala de isolamento (2); extensão da enfermaria (24)
- Consultórios médicos: dois
- Consultório odontológico: um
- Salas de cirurgia: duas
- Salas de procedimentos: duas
- Sala de raio-X: uma (equipamento digital)
- Sala de esterilização: uma
- Sala de descontaminação: uma
- Laboratório: um
Demais características principais do NDM Bahia
- Comprimento: 168m
- Boca: 23,5m
- Calado: 5,2m
- Deslocamento a plena carga: 12.000 toneladas
- Dois spots para helicópteros no convoo “alfa” e um spot no convoo “zulu”, para aeronaves do porte do UH-15 Super Cougar
- Doca alagável com aproximadamente 122m de comprimento, 14m de largura e 7,7m de altura, provendo área total de cerca de 1.732m², com rampa à popa, podendo transportar embarcações de desembarque do tipo EDVM, EDVP e EDCG, com veículos diversos (blindados, carros de combate), pessoal e equipamentos militares.
- Propulsão: 2 motores diesel SEMT Pielstick de 15.290 kW
- Velocidade máxima: 20 nós
- Autonomia: 11.000 milhas náuticas a 15 nós
- Capacidade de tropa: 415 para deslocamentos de longa distância e duração, ou até 2.000 pessoas para deslocamentos curtos, com duração entre 48 e 72 horas.
- Armamento defensivo de dois lançadores duplos Simbad de mísseis antiaéreos de curto alcance Mistral, 3 metralhadoras de 20mm para alvos de superfície e 4 metralhadoras de 12,7mm (.50).
- Tripulação: 288 (32 oficiais e 256 praças)
Veja também:
Impressionante a capacidade medica do navio e os numeros apresentados. Em um primeiro momento estava questionando por que o hospital ficava tao proximo dos decks de pouso (ruido e vibracao) mas a proximidade faz sentido para socorro aero transportado.
Excelente reportagem, sempre rica em detalhes.
AC,
Lembre-se que o Bahia é versátil e possui dois convoos. Em casos emergenciais pode-se dar prioridade para pousar neste ou naquele convoo para não interferir em determinadas operações/situações.
Tem a possibilidade de haver isolamento acústico nessa área do navio ?
Externamente não notei nada que lembrasse um isolamento acústico diferenciado. O que eu percebi é que o hospital, embora ocupe uma área grande do navio de bordo a bordo, não é passagem para popa-proa e seus corredores são exclusivos para o pessoal que trabalha lá (o que torna o ambiente muito mais higiênico).
A MB precisa comprar mais helicopteros SH-60 sea hawk so tem seis,
mas não tem dinheiro para isso e esse helicoptero e carissimo.
Caríssimo é sustentarmos uma cambada de político vagabundo, aproveitador e ladrão.
Tem dinheiro para comprar o que as FAs quiserem, só que, hoje, grande parte do dinheiro é gasto na ladroagem dos políticos saqueadores, nas mordomias desses mesmos ladrões, nos salários melhores que de 1º mundo dos funcionários dos 3 Poderes, nas mordomias dos mesmos e, também, na grande quantidade desses funcionários que produzem pouco e são muito caros e CCs Brasil afora que também produzem pouco ou nada e sempre estão prontos para mamar no governo.
Esquecestes o pior de todos o Judiciário ! Depois o Brasil não tem Elites , tem Castas Corporativistas !!!!!
Sou enfermeiro do EB notei que a UTI é completa! Não deixa a desejar em nenhum item para manutenção da vida.
CM
Claudio MOreno
Se vc tiver a chance de visitar o hospital do Bahia algum dia, não perca essa oportunidade. Está muito além de qualquer coisa que tínhamos no Brasil em termos de hospital embarcado.
Impressionante, quem vê acredita que ele foi construído diretamente para a MB, pois é um navio que pode ser usado para defesa e também como auxiliar nas catástrofes que ocorrem em nosso país. O hospital de bordo a maioria das cidades do Brasil não possuem, centro cirúrgico, centro de queimaduras, além de também ter um raio x.digital, poucos grandes hospitais possuem. Parabéns MB, o principal papel das FFAA, é a defesa do país, e, auxiliar nas catástrofes, e estão sendo cumpridas com altivez.
As metralhadoras do Bahia não são 3 de 20mm, sendo a da frente uma F2 e as de trás duas oerlikon?
Lucas Schmitt
O primeiro post desta série trata do armamento do navio. Confira lá
https://www.naval.com.br/blog/2018/08/28/voce-ja-foi-ao-bahia-parte-1/
Sim, é que os dados nessa matéria de hoje estão errados. Por isso eu estranhei.
Lucas, obrigado por avisar. Na matéria anterior eu corrigi no texto mas esqueci de corrigir também na ficha técnica ao final.
Agora está corrigido em ambas as matérias para metralhadoras de 20mm.
EXCELENTE A POSTAGEM… não poderia ser diferente pela excelência do navio e do seu hospital.
Parabéns à Trilogia ao Guilherme Poggio e ao Fernando “Nunão” De Martini.
Como bem salientou a reportagem, esse navio tem uma ala hospitalar melhor do que 90% dos hospitais do país. Parabéns a marinha por ter um navio com essa capacidade.
Olha…só dando os parabéns. 70% dos hospitais desse país são HPP. Até 50 leitos.
Vendo com atenção, acho que o Bahia é hoje o navio mais importante da MB, pois pode realizar um leque muito grande de missões, incrível mesmo, lembrei até da situação que ocorre no filme Guerra Mundial Z, onde uma epidemia assola a humanidade e um dos únicos lugares seguros são navios, e os navios militares, principalmente os semelhantes ao Bahia, oferecem toda infraestrutura para apoiar o restante dos membros do governo e das forças armadas que tentam restabelecer a ordem. Acho muito legal saber que o Bahia pode servir como capitânia (função que agora passa a ser do Atlântico), como… Read more »
Foi uma sabia aquisição, a MB está de parabéns mais uma vez, sempre sonhei com o BPC-Mistral na MB, mas agora que temos o Mix do Atlantico + Bahia, sinto que temos o melhor os dois mundos, o melhor PortaHelicopteros e o melhor Navio Anfibio e Hospitalar do Hemisfério Sul, no final deste ano estamos aguardando com ansiedade o SBR 1 Riachuelo, que será mais um marco historico na MB.
Desde que à Austrália também encontra-se no hemisfério sul, acredito que o par de LHDs de 27.000 toneladas totalmente carregados, baseados no “Juan Carlos I” batem o par brasileiro,”Atlântico” e “Bahia” por longa margem e de quebra à marinha australiana ainda tem um “LSD” de 16.000 toneladas totalmente carregado, adquirido de segunda mão de 12 anos de idade. . Não estou comparando marinhas pois cada uma tem suas peculiaridades e provavelmente à marinha brasileira está melhor servida com a dupla “LPH/LPD” do que à marinha australiana com sua dupla de LHDs por conta do que se espera deles e onde… Read more »
O Minas Gerais possuía uma central de produção de oxigênio engarrafado para uso dos aviadores a bordo das aeronaves. Não sei de a MB retirou este equipamento para uso ou foi junto como sucata. Era muito interessante, eis que operava em uma suspensão que mantinha a torre de retificação na vertical mesmo com o balanço do navio. Uma instalação destas apoiaria o hospital do Bahia.
Visitei o “Bahia” em 2017, quando esteve em Santos. Apesar de terem liberado muito poucas areas para circulação e visitação, foi uma bela experiência. Fiquei fã do Navio, belíssimo e imponente
Estrutura pensada para rápido apoio em conflitos, mas em tempos de paz, esta estrutura hospitalar toda fica ociosa? Não ficou claro para mim como é o dia a dia desta estrutura na MB.
Sim…ela fica “ociosa” até ser necessária. Quando na marinha francesa o então “Siroco”
era enviado para mares distantes e desempenhou ajuda humanitária graças à suas
excelentes instalações médicas.
.
Quando enviados em missões ao exterior por exemplo, navios anfíbios e suas boas ou
ótimas instalações médicas tem uma grande vantagem sobre navios hospitais pois
estes permanecem atracados em suas bases e quando solicitados acabam levando semanas para atingir o destino, enquanto um navio anfíbio, desde que em missão no
exterior poderá estar próximo de algum local que necessite ajuda.
Extra : Egito lança primeira Gowind construída no país http://www.gbnnews.com.br/2018/09/egito-lanca-primeira-gowind-construida.html#.W5xO585KjIV
Parabéns pela excelente matéria Poggio e Nunão.
Lendo sobre as características das instalações hospitalares, podemos imaginar os horrores de um combate. Traumas, queimaduras, amputações, etc… Tomara que elas jamais sejam utilizadas para atender combatentes feridos e sim para ajuda humanitária.
XO voçe pode nos informar algo sobre a compra do navio logístico Wave Ruler?
Vc esta de parabéns Nunão.
Ótima matéria, nos presenteando com essa obra, até então desconhecida por nós leitores!
Pergunta: Em caso de guerra ou a embarcação atuar em uma área de conflito, face as sua características de navio hospital (49 leitos), terá a pintura da cruz vermelha no seu costado e na área de pouso dos helicópteros?